Banca privada duplica lucros com BCE, rentabilidade dispara
Já foram renegociados 80 mil empréstimos da casa. Subida dos juros catapulta banca privada para lucros de 2,3 mil milhões nos primeiros nove meses do ano.
Um antigo banqueiro apelidou os atuais resultados dos bancos como “lucros de porta aberta”, pois um banco pouco mais precisa do que ter o balcão aberto para ganhar dinheiro por conta das elevadas taxas de juro. Até setembro, as quatro principais instituições privadas em Portugal registaram lucros de 2,3 mil milhões de euros, ao ritmo de 8,5 milhões por dia, com uma rentabilidade superior 16% dos capitais investidos. Mas já estão a avisar que o pico dos resultados pode estar aí ao virar da esquina.
Não é muito difícil de explicar a razão pela qual BCP, Santander Totta, BPI e Novobanco, no seu conjunto, praticamente duplicaram os lucros nos primeiros nove meses do ano em comparação com o mesmo período do ano passado: com a subida das taxas de juro do Banco Central Europeu (BCE), os bancos estão a cobrar mais pelos empréstimos às famílias e empresas, enquanto pouco pagam pelos depósitos.
Essa é a chamada margem financeira dos bancos, que corresponde em grande medida à diferença entre os juros cobrados nos créditos e os juros pagos aos depositantes. Os quatro grandes bancos privados em Portugal – a Caixa só apresenta as contas na próxima semana, mas também se esperam resultados históricos do banco público – viram a margem de juros disparar 62,5% para 4,7 mil milhões de euros entre janeiro e setembro, ainda que a carteira de crédito tenha permanecido na casa dos 140 mil milhões de euros.
De resto, como apontou recentemente a DBRS, Portugal é dos países onde os bancos mais ganham com a margem financeira.
Rally da margem com fim à vista
Mas este rally pode estar prestes a terminar como já avisaram os presidentes dos principais bancos, à medida que a guerra de spreads no crédito e a luta pelos depósitos vão pressionando cada vez mais a margem. “É difícil estimar o momento de pico da margem financeira, mas não deveremos estar muito longe do seu pico”, adiantou o Santander Totta ao ECO. “Contamos que a estabilização [da margem] aconteça neste trimestre ou no próximo. Em 2024 irá reduzir”, referiu o presidente do BPI apontando para o aumento do clima concorrencial na banca portuguesa.
Em todo o caso, o desempenho da margem compensou largamente a ligeira descida nas comissões, cujas receitas ascenderam a 1,36 mil milhões de euros (-0,6% em termos homólogos), e ainda o aumento dos custos operacionais para quase dois mil milhões de euros (+8,7%).
Por outro lado, também permitiu que os bancos se libertassem definitivamente de um dos seus calcanhares de Aquiles nos últimos anos: a rentabilidade dos capitais próprios (ROE). Para o Santander Totta e Novobanco, o ROE superou mesmo os 20%, o dobro do que a indústria tem como referência para cobrir o custo do capital. Já o BCP deu um salto de rentabilidade, passando de uns reduzidos 2,3% de ROE em setembro de 2022 para 16,7% em setembro de 2023.
Fuga para os certificados e amortizações tiram 5% aos depósitos
Nem tudo correu bem aos bancos. Em parte, foram eles os próprios responsáveis por isso, como na perda de depósitos: o stock de depósitos dos quatro maiores bancos privados caiu quase 5% para 142,4 mil milhões de euros face a setembro de 2022.
Uma das razões teve a ver com a fuga para os Certificados de Aforro na primeira metade do ano: muitas famílias tiraram as suas poupanças pouco rentáveis do banco para apostar neste produto do Estado. Entretanto, a situação inverteu-se a partir de junho: os bancos passaram a pagar mais pelos depósitos e os certificados menos depois da polémica decisão do Governo de cortar a taxa de juro de 3,5% para 2,5%.
A outra razão teve a ver com os reembolsos antecipados: para contrariar o impacto da subida das taxas de juro, as famílias usaram as poupanças para abaterem o crédito mais rapidamente e assim atenuarem a subida da prestação mensal.
O Santander foi o banco que teve a queda mais pronunciada, perdendo quase 10% dos depósitos para 35,5 mil milhões de euros. BCP e Novobanco conseguiram gerir a fuga de poupanças e viram os depósitos caírem apenas 1,7% para 50,4 mil milhões e 28,1 mil milhões, respetivamente.
Quase 80 mil empréstimos da casa renegociados
Enquanto o crédito malparado continuou a cair no último trimestre, os bancos realizaram quase 80 mil reestruturações de empréstimos à habitação de famílias em situações de maior vulnerabilidade financeira.
No Santander, houve lugar a 36 mil renegociações, segundo indicou a instituição ao ECO. No BCP, realizaram-se cerca de 20 mil reestruturações desde o início da subida dos juros, e o Novobanco adiantou ao ECO que “já foram renegociados cerca de 17.700 contratos, principalmente com reduções de spread/taxa de juro com reflexo na respetiva prestação”. O BPI só deu números relativos às renegociações ao abrigo do decreto-lei do governo: 3.400 contratos renegociados.
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