Estado pagou a mais 200 milhões por testes Covid, diz Tribunal de Contas
TdC alega que preços fixados pelo Governo para testes Covid "nem sempre tiveram subjacente a fundamentação técnica" e que atraso no cumprimento de despacho resultou em gastos públicos adicionais.
O Tribunal de Contas (TdC) considera que os preços fixados pelo Ministério da Saúde para os testes Covid comparticipados pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS) “nem sempre” tiveram “subjacente uma adequada fundamentação”, o que resultou numa despesa adicional de 153,4 milhões de euros para o Estado entre 2020 e 2021. Além disso, atraso no cumprimento de um despacho culminou num “adicional de despesa estimada de cerca de 48,3 milhões de euros”. Contas feitas, foram gastos 201,7 milhões de euros a mais.
Em causa está uma auditoria realizada pela entidade liderada por José Tavares à “testagem e rastreio de contactos no âmbito da resposta à pandemia de Covid-19”, divulgada esta quinta-feira e que que analisa a atuação do Ministério da Saúde entre março de 2020 e abril de 2022.
O tribunal nota que as autoridades “acompanharam o conhecimento técnico-científico disponível sobre a doença e incorporaram as recomendações e orientações internacionais”, nomeadamente da Organização Mundial de Saúde (OMS) ou do Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC). No entanto, o organismo critica o atraso na estratégia nacional de testagem, que só foi formalizada pela Direção-Geral da Saúde (DGS) “sete meses após a primeira declaração do estado de emergência” e aponta que o reforço da capacidade laboratorial foi suportado maioritariamente pelo setor privado.
Entre 1 de março de 2020 e 30 de abril de 2022, foram realizados em Portugal 37,9 milhões de testes de diagnóstico à Covid, dos quais 28,1 milhões (74,1% do total) foram realizados por prestadores do setor privado. Neste período, o número de laboratórios do setor público privado que passaram a integrar a Rede Portuguesa de Laboratórios para Diagnóstico do SARS-CoV-2 “mais do que triplicou”, sendo que este aumento foi “fortemente alavancado pelo aumento do número de laboratórios do setor privado” que passaram de dez para 96 (representando 55% da capacidade à época).
Por outro lado, o TdC defende que “os preços fixados pelo Ministério da Saúde para os testes de diagnóstico da Covid-19 comparticipados pelo SNS nem sempre tiveram subjacente a fundamentação técnica apresentada pelo Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge” (INSA), o que “prejudicou a transparência dos respetivos processos de formação de preços e se traduziu em acrescida despesa pública”, lê-se.
“O efeito global dos preços fixados pelo Ministério da Saúde, entre 2020 e 2021, resultou num acréscimo da despesa pública associada à testagem estimado em 153,4 milhões de euros”, dos quais 97 milhões dizem respeito a testes de amplificação de ácidos nucleicos (TAAN ou vulgarmente conhecidos como PCR) e 56,4 milhões a testes rápidos de antigénio (TRAg).
No que toca aos testes TAAN, o tribunal relembra que os preços a pagar pelas entidades públicas às entidades convencionadas sofreram “sucessivas atualizações”, tendo começado nos 87,95 euros e em março de 2022 já estava nos 30 euros por teste. “Em junho de 2020, o exercício de comparação do preço fixado em Portugal com os praticados em outros países demonstrava que era o preço mais elevado da amostra de países considerada, em que o preço adotado em Portugal era superior em 36,1% ao preço médio dos países considerados na amostra”.
Neste contexto, a auditoria do TdC conclui ainda que “as sucessivas atualizações do preço” destes testes, “por parte do Ministério da Saúde, não acompanharam, em montante e ou em tempo, as propostas técnicas de revisão em baixa que lhe foram sendo apresentadas pela ACSS, tendo por base o custeio das práticas laboratoriais levado a cabo pelo INSA, a informação acerca dos custos da realização dos testes em laboratórios hospitalares do SNS e também a comparação com preços aplicados em outros países”.
Por outro lado, o TdC nota ainda que o atraso de quatro meses no cumprimento do despacho do secretário de Estado da Saúde que definiu que os preços dos testes TAAN passariam para 30 euros/ por teste ao invés dos 45 euros que eram praticados originou “um adicional de despesa estimada de cerca de 48,3 milhões de euros, em face dos 3,3 milhões de testes realizados naquele período”.
A instituição liderada por José Tavares indica ainda que a informação relativa à despesa orçamentada e executada no que toca à testagem e rastreios “não se encontrou suficientemente evidenciada e especificada, não permitindo apurar a totalidade da despesa realizada com aquelas atividades” e que os níveis de testagem da população e notificação de casos positivos “nem sempre se revelaram oportunos, adequados e proporcionais ao risco evidenciado”.
Perante estas conclusões, o TdC emitiu algumas recomendações ao ministro da Saúde, à diretora-geral da Saúde e ao presidente do Sistema de Informação Nacional de Vigilância Epidemiológica (SINAVE).
Entre as recomendações para o Governo sugerem que seja garantido que a fixação de preços administrativos tenha “subjacente uma adequada fundamentação do respetivo valor, obedecendo a critérios de eficiência económica” e que estes sejam atualizados “de forma tempestiva e alinhada com a evolução dos respetivos custos”, Por outro lado, recomendam “garantir a adequada evidenciação e especificação da despesa pública realizada, bem como o apuramento do custeio das atividades relacionadas” por parte das entidades responsáveis.
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