Receita acima do esperado à boleia da inflação permitiu surpresas orçamentais

Nos últimos três anos, marcados por uma inflação elevada, as receitas acabaram por ser maiores do que o previsto no Orçamento do Estado, dando um impulso às contas públicas.

Os últimos anos têm sido marcados por algumas surpresas orçamentais, com as contas públicas a terminarem numa posição melhor que o esperado. Existem vários fatores a influenciar a evolução das finanças do Estado, mas quando se olha para os orçamentos e a sua execução, é possível perceber que se conta com receita a menos e despesa a mais, o que no ajuste de contas acaba por ajudar a equilibrar o saldo orçamental.

No ano passado, segundo os dados divulgados pela Direção Geral do Orçamento esta semana, a receita fiscal ficou 5.500 milhões de euros acima do previsto no Orçamento do Estado. Já do lado da despesa, foram executados menos 2.500 milhões de euros que o projetado na rubrica do investimento. Tal permitiu alcançar um excedente orçamental das Administrações Públicas de 4,3 mil milhões de euros, em contabilidade pública.

Ainda não são conhecidos os valores em contabilidade nacional, que é a que conta para as regras da União Europeia, mas deverão ultrapassar os 2.191 milhões de euros previstos no Orçamento do Estado, e que corresponde a 0,8% do PIB.

Na elaboração dos orçamentos do Estado, algumas tendências são mais difíceis de prever, nomeadamente na altura da pandemia e, depois, com a invasão russa da Ucrânia. Começou a disparar a inflação e esta fez, por sua vez, elevar as receitas fiscais. Mas ao longo do tempo, há certas rubricas que têm vindo a não corresponder ao orçamentado.

Uma análise do Conselho das Finanças Públicas às previsões das Finanças no período dos Governos de António Costa mostra que as projeções tenderam a ser “prudentes”. Quando o CFP avalia o erro médio, verifica que as Finanças subestimam as variáveis macroeconómicas. “Este desvio é mais relevante no caso do emprego, da inflação e do crescimento do PIB nominal, e mais reduzido no caso das previsões para o crescimento do PIB em volume”, lê-se no relatório. Nas componentes do PIB, só para o investimento é que “as previsões do Ministério das Finanças apontam para uma sobrestimação da sua dinâmica”.

Quando se olha para os dados a partir de 2016, em contabilidade pública, é possível perceber que se executou sempre menos despesa do que o orçamentado. A dimensão da sobreorçamentação varia, sendo que há anos em que é menos expressiva, como é o caso de 2021 e 2022. Mas entre 2016 e 2018 rondou os dois mil milhões de euros, atingido os 3,4 mil milhões em 2019.

Já as receitas também eram sobreorçamentadas até 2020, executando-se sempre menos do que o esperado. Mas houve uma viragem em 2021, coincidente também com o disparar da inflação na saída da pandemia. A subida dos preços fez disparar a arrecadação de impostos, por um lado, sobre o consumo, mas impactando também os salários e, por conseguinte, os descontos.

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Nos últimos três anos, esta suborçamentação da receita e sobreorçamentação da despesa ajudou então a que o resultado final fosse mais positivo do que o esperado. Apesar da incerteza à volta da evolução da economia e do contexto internacional, algumas entidades foram alertando para esta possível divergência nas contas.

Como sinalizou Nazaré da Costa Cabral, numa audição no Parlamento no ano passado, “nos últimos anos fomos habituados, por razões que têm a ver com a conjuntura económica recente, a ter surpresas positivas em termos orçamentais, sendo que o que vinha como resultado orçamental acabava por superar as expectativas”. “Porque a maneira como o OE vinha a ser desenhado tinha um conjunto de margem que permitia contenção na execução e depois o comportamento da receita foi sempre surpreendente e ajudou”, recordou.

Mas a presidente do CFP alertou que o Orçamento do Estado para 2024 “pode ser princípio do fim das boas surpresas orçamentais”, já que terá uma execução mais difícil devido ao “espartilho” criado por novas restrições como a redução do IRS e a despesa com pessoal.

Se será ou não, é ainda incerto. Ainda no final do ano passado, a UTAO sinalizou que a receita fiscal que o Estado iria arrecadar em 2023 e 2024 seria maior do que o previsto na proposta do Orçamento do Estado para 2024. “A diferença entre as previsões do Ministério das Finanças e a estimativa da UTAO aponta para uma subvalorização da receita de impostos diretos de 782 milhões de euros em 2023 e 681 milhões de euros em 2024″, indicava o relatório.

Para 2023 estas previsões verificaram-se, mas para 2024 ainda será preciso esperar para ver. Mas há alguns elementos que já se podem antecipar, sendo que por exemplo Fernando Medina já sinalizou que a dívida pública pode descer até 96% do PIB este ano com “relativa facilidade”.

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