O discurso de Joe Biden sobre o Estado da União em cinco pontos

  • Joana Abrantes Gomes
  • 8 Março 2024

Imigração, aborto, conflito em Gaza e ataques a Trump foram os temas que marcaram o último discurso do Estado da União do Presidente Joe Biden antes das eleições de novembro.

Na quinta-feira, Joe Biden proferiu o último discurso sobre o Estado da União do seu primeiro mandato à frente da Casa Branca. À procura da reeleição, o Presidente norte-americano abordou temas que devem marcar a campanha eleitoral, como a imigração, o aborto, a economia e o conflito em Gaza, mas aproveitou também para atacar Donald Trump, o seu provável adversário em novembro.

Diante de aplausos da bancada democrata e protestos de alguns republicanos, Biden discursou durante mais de uma hora, sem ter cometido gafes significativas, numa altura em que se tem questionado se está apto para mais um mandato, ao fim do qual terá 86 anos.

O estado da nossa união é forte e está a ficar mais forte“, afirmou. O ECO reuniu cinco pontos-chave do discurso do chefe de Estado norte-americano.

No tiro ao alvo, a mira é Trump

A oito meses das eleições presidenciais, com as primárias já realizadas em vários estados do país, Joe Biden aproveitou o discurso anual para fazer campanha contra Donald Trump, o qual preferiu tratar usando o termo “o meu antecessor”.

A forma como lidou com a pandemia de Covid-19 foi uma das primeiras críticas dirigidas ao ex-presidente. “O meu antecessor falhou o dever mais básico que qualquer presidente tem para com o povo americano: o dever de cuidar. Isso é imperdoável”, disse.

Focando-se num dos temas centrais da sua agenda, a proteção da democracia, o Presidente acusou Trump – e alguns membros do Partido Republicano ali presentes – de tentar “enterrar a verdade” sobre o ataque ao Capitólio dos Estados Unidos em 6 de janeiro de 2021, dia em que o Congresso ia confirmar a vitória de Joe Biden.

Biden responsabilizou igualmente o seu antecessor pela decisão do Supremo Tribunal de Justiça de anular o acórdão Roe v. Wade, que garantia o direito ao aborto no país, e por bloquear as reformas bipartidárias em matéria de imigração.

Em matéria de política externa, o chefe da Casa Branca também não poupou nas críticas ao candidato republicano, condenando as recentes declarações de Trump de deixar a Rússia “fazer o que quiser” aos países europeus membros da NATO que não cumprissem a meta de 2% de despesa em Defesa.

Mesmo numa referência à sua idade, Biden, de 81 anos, atacou Trump, que é apenas quatro anos mais novo. “Algumas pessoas da minha idade veem uma história diferente: uma história americana de ressentimento, vingança e retribuição“, afirmou, após enumerar uma lista de atributos positivos que, segundo ele, definem os EUA.

Apelo à aprovação da lei de imigração

Se houve um momento em que Joe Biden não esteve tão bem no seu terceiro discurso sobre o Estado da União foi na abordagem à imigração. Acusado pela congressista republicana Marjorie Taylor Greene de ignorar o assassínio de uma estudante de enfermagem no estado da Georgia, alegadamente cometido por um imigrante venezuelano sem documentos, o Presidente segurou um pin com o nome da vítima, que Greene lhe tinha oferecido à chegada.

Depois de, aparentemente, ter pronunciado mal o nome da jovem de 22 anos — chamou-lhe “Lincoln” Riley em vez de Laken Riley –, Biden disse que ela tinha sido assassinada por um “ilegal”, um termo criticado por grupos de defesa dos direitos dos imigrantes.

A imigração é um dos principais temas no centro da discussão entre os candidatos à votação presidencial de novembro. Ainda em fevereiro, os senadores do Partido Republicano chumbaram uma iniciativa bipartidária para reformar as leis de asilo e reforçar a segurança na fronteira com o México, que incluía, como contrapartida, desbloquear um novo pacote de assistência à Ucrânia, mas também a Israel.

O desfecho já era esperado, visto que Donald Trump havia anunciado a sua oposição ao acordo. Nesse sentido, Biden apelou aos republicanos para que apoiem a legislação bipartidária sobre imigração, acusando o seu adversário de “fazer política” ao opor-se ao projeto de lei para obter ganhos eleitorais.

Restaurar o direito ao aborto

“Na sua decisão de revogar [a lei] Roe v. Wade, a maioria [dos juízes] do Supremo Tribunal escreveu: ‘As mulheres não estão desprovidas de poder eleitoral ou político’. Claramente, aqueles que se gabam de ter anulado a Roe v. Wade não fazem ideia do poder das mulheres na América”, declarou Biden, debaixo do olhar de alguns dos juízes responsáveis pela decisão.

Dirigindo-se diretamente aos congressistas republicanos e ao seu adversário na corrida à Casa Branca, criticou a intenção destes de “aprovar uma proibição nacional do aborto” que poderia equivaler a “forçar sobreviventes de violação e incesto” a levar a gravidez até ao fim.

Nesse sentido, o Presidente reiterou a sua promessa de restaurar a histórica lei se for reeleito com maiorias democratas em ambas as câmaras do Congresso, assegurando que o aborto e os direitos reprodutivos continuam a ser uma peça central da sua agenda legislativa.

Esta questão ajudou a mobilizar os eleitores democratas em estados tipicamente republicanos nas midterms de 2022 e nas eleições off-year realizadas no ano passado, que incluiu votações para governador e legislativas estaduais em alguns estados.

Os sucessos do primeiro mandato

Nos momentos em que não estava a atacar o favorito à nomeação republicana, o chefe da Casa Branca procurou, por um lado, destacar o que caracterizou como um registo de realizações do seu primeiro mandato e, por outro, delinear medidas para alcançar a reeleição.

Herdei uma economia que estava à beira do abismo“, começou por dizer, declarando depois que atualmente a economia norte-americana é a “inveja do mundo”, cujos indicadores têm vindo a subir há meses. As primeiras estimativas apontam para um crescimento económico de 2,5% no ano passado, enquanto a inflação abrandou, em janeiro, para 3,1%, com a Reserva Federal a sinalizar uma descida das taxas de juro em junho. A recuperação económica dos Estados Unidos é “a maior história nunca contada”, frisou Biden.

No entanto, a perceção da economia junto do eleitorado não é favorável ao atual Presidente, que, de acordo com uma sondagem do canal televisivo norte-americano NBC News, tinha um índice de aprovação excecionalmente baixo no momento do discurso, de 37%. Este valor é inferior ao índice de aprovação dos seus antecessores Trump em 2020 (46%), Barack Obama em 2012 (48%), George W. Bush em 2004 (54%) e Bill Clinton em 1996 (46%), em janeiro dos seus anos de reeleição.

Já as propostas para o segundo mandato incluem um crédito fiscal para quem comprar casa, a expansão de um limite máximo para as despesas com medicamentos sujeitos a receita médica a todos os norte-americanos que têm seguro de saúde e o aumento dos impostos sobre as empresas.

Além disso, Biden deu a entender que irá propor uma taxa de imposto mais alta para os mais ricos. “Nenhum bilionário deveria pagar uma taxa de imposto mais baixa do que um professor ou um trabalhador do saneamento“, disse, perante os aplausos dos congressistas do seu partido, lançando acusações à bancada republicana de querer cortar a Segurança Social e o Medicare.

As medidas dirigem-se, sobretudo, à classe média do país, mas a maioria exigiria a aprovação do Congresso, o que é improvável, a não ser que os democratas retomem a maioria na Câmara dos Representantes.

Porto marítimo para ajuda humanitária em Gaza

Embora tenha iniciado o discurso com um apelo à aprovação do pacote que inclui um novo apoio militar à Ucrânia, Biden concentrou a maior parte da sua intervenção sobre política externa no final, quando abordou o conflito no Médio Oriente.

Segundo o Presidente norte-americano, está a ser negociado um novo cessar-fogo na Faixa de Gaza, que duraria “pelo menos seis semanas”. Mas a principal novidade, que tinha sido anunciada no início do dia, é a construção de um porto marítimo temporário em Gaza para permitir a entrada de ajuda humanitária por navio, trabalhando com outros países alinhados neste projeto e também com organizações humanitárias.

A “missão de emergência” surge depois de, nos últimos dias, aviões norte-americanos sobrevoarem Gaza para largar alimentos para a população palestiniana. Estima-se que mais de um milhão de deslocados sejam neste momento incapazes de se abrigar e de se alimentar, com Telavive a prometer endurecer ainda mais o cerco à Faixa de Gaza.

Ainda que os Estados Unidos sejam o principal aliado de Israel, Biden dirigiu palavras duras ao país, ao classificar como “desoladoras” as mortes de civis em Gaza, ao mesmo tempo que apontou a “responsabilidade fundamental” de Telavive na proteção das vidas inocentes.

“Trinta mil palestinianos foram mortos, a maior parte dos quais não pertencem ao Hamas”, disse, acrescentando que se trata de “mulheres e crianças, raparigas e rapazes”, enquanto muitos outros estão sem alimentos ou medicamentos. “É de partir o coração”.

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