Exclusivo Centeno renova mandato do chefe de gabinete antes de sair do Banco de Portugal
Na semana em que terminou o mandato, Mário Centeno renovou o contrato a Álvaro Novo como diretor do gabinete de apoio ao governador, um órgão de consulta direto de quem lidera o Banco de Portugal.
Mário Centeno e Álvaro Novo são amigos há anos, um foi ministro, o outro foi chefe de gabinete nas Finanças e depois secretário de Estado do Tesouro. Quando Centeno foi escolhido por António Costa para governador do Banco de Portugal, levou o amigo economista para chefe de gabinete, e agora, na semana em que termina o seu mandato de cinco anos, comunicou internamente a renovação das funções de Álvaro Novo como diretor num gabinete que é de apoio direto ao governador em funções.
A substituição de Mário Centeno como governador do Banco de Portugal é mais do que previsível, mesmo tendo em conta a sua disponibilidade para continuar, como disse publicamente, e as palavras de Luís Montenegro na Herdade do Chão da Lagoa, segundo as quais Centeno “reúne todas as condições” para continuar. Em conflito aberto com Joaquim Miranda Sarmento — foram várias as intervenções públicas críticas da gestão orçamental do atual ministro, e até passou a assinar uma análise económica anual, paralela à do próprio banco central –, Centeno tem guia de marcha certo. As eleições antecipadas criaram um certo suspense sobre o que poderia suceder, mas a AD reforçou a votação e mudança tornou-se inevitável.
O mandato de cinco anos terminou este sábado, e o primeiro-ministro já confirmou que na próxima quinta-feira vai anunciar o nome do governador para os próximos cinco anos. Mas este sucessor — Álvaro Santos Pereira será um dos nomes mais fortes, depois das recusas de Ricardo Reis, Sérgio Rebelo e Vítor Gaspar — tem pelo menos uma herança que lhe será deixada por Centeno. O ainda governador comunicou internamente, por uma rede de intranet, as diversas deliberações do conselho de administração da semana passada, que reúne à quinta-feira: No subtítulo “Consultores e cargos de direção“, Centeno comunica de forma singela, e sem mais informação: “Renovação do mandato de Álvaro Novo como diretor do GAB“. Não é especificado naquela comunicação, mas o mandato foi renovado por cinco anos.
Questionada oficialmente, fonte oficial do Banco de Portugal limitou-se a uma resposta única: “Foram seguidas as regras existentes no Banco de Portugal relativamente à gestão interna dos seus recursos“, o que parece indiciar que o mesmo poderá ter sido seguido por anteriores governadores, mas sem esclarecer quaisquer das perguntas detalhadas do ECO. Quais foram?
- O conselho de administração do Banco de Portugal renovou o mandato de Álvaro Novo como diretor do GAB, um departamento de apoio direto do governador, na última semana de mandato de Mário Centeno. Qual é a razão desta decisão?
- Álvaro Novo é quadro do Banco de Portugal? Se sim, porque é que não regressou a função de origem, tendo em conta a natureza do GAB?
- Qual é o período para o novo mandato?
- Qual é o valor de salário de Álvaro Novo?
- Se o novo governador decidir cessar funções do diretor do GAB, há lugar a alguma indemnização a pagar a Álvaro Novo? Se sim, qual é o montante dessa indemnização?
- Na mesma reunião, o conselho aprovou a promoção de Rita Poiares como diretora adjunta do DDE (Departamento de Estatísticas) com efeitos a partir de 1 de outubro. Tendo em conta este calendário, e a saída anunciada de Mário Centeno, qual a razão para não ser o novo governador a tomar essa decisão?
A comunicação interna foi feita logo depois da reunião de conselho. O que é o GAB? É o “Gabinete do Governador (GAB)”, lê-se na página oficial do Banco de Portugal”. “O GAB presta apoio de natureza técnica ao Governador. É o interlocutor do Banco de Portugal para as relações institucionais com o Governo e outras instituições“. Na prática, é o gabinete de consultoria pessoal do governador, é aliás assim que aparece no organograma, é na prática o chefe de gabinete, representa o governador nas relações com entidades externas, é, portanto, uma figura necessariamente de confiança. Nesta função, Novo ganhará cerca de 12 mil euros por mês, brutos, aos quais se somam o fundo de pensões e viatura.
Quem é Álvaro Novo? Técnico-consultor do Banco de Portugal desde 2001, licenciou-se em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, em 1995. Desenvolveu posteriormente estudos nos Estados Unidos: é mestre em Economia (Southern Illinois University) e em Estatística Aplicada (University of Illinois, Urbana-Champaign) e conta ainda com um doutoramento em Economia (University of Illinois, Urbana-Champaign). Em 2013, escreveu em conjunto com Centeno o ensaio “O Trabalho, uma visão de mercado”, da Fundação Francisco Manuel dos Santos.
A renovação das funções de Álvaro Novo não foi a única decisão de recursos humanos tomada pelo conselho de administração do Banco de Portugal na última semana de mandato de Centeno. “Despediu” o diretor-adjunto do Departamento de Estatística (DDE), Luís Teles Dias, e promoveu Rita Poiares para as mesmas funções, mas com efeito apenas a partir do próximo dia 1 de outubro, portanto com mais de dois meses de antecedência.
O DDE “tem por missão essencial a elaboração e divulgação das Estatísticas Monetárias e Financeiras, das Estatísticas da Balança de Pagamentos, das Contas Nacionais Financeiras e a gestão das Centrais de Balanços e de Responsabilidades de Crédito“, lê-se na página oficial do banco central.
Rita Poiares é mulher de Ricardo Mourinho Félix, ele próprio antigo secretário de Estado de Centeno no Ministério das Finanças e que, depois de regressar do BEI, foi também promovido a diretor de um departamento criado à medida, para as relações internacionais e cooperação, como se lê no Linkedin do economista, E este departamento, curiosamente, surge, funcionalmente, entre o conselho de administração e a Secretaria Geral, ao lado do Encarregado/Gabinete de Proteção de Dados, e não na lista de todos os outros departamentos do banco.
Economista, Rita Poiares é, desde 2015, coordenadora do núcleo de contas nacionais financeiras no Departamento de Estatística do Banco de Portugal. É licenciada em economia pela Universidade Católica e concluiu a parte escolar do mestrado em economia monetária no ISEG.
Apesar da resposta oficial do Banco de Portugal, segundo a qual foram seguidas as regras de gestão de recursos humanos da instituição, indiciando que haverá casos semelhantes no passado, as duas nomeações, por razões diferentes, causaram desconforto no Banco de Portugal. Por um lado, Álvaro Novo tem uma função, a de diretor do GAB, que é de confiança pessoal e profissional do governador em funções e por isso mesmo, escolhido pelo próprio, por outro lado, Rita Poiares é nomeada já para uma função que só se iniciará em outubro, o que, consideram duas fontes do banco que pediram o anonimato, deveria ser uma escolha do conselho com o novo governador em funções.
Uma terceira fonte do ECO apontou outra explicação para a renovação do mandato de Álvaro Novo como diretor do Gabinete do Governador. “Ao ser reconduzido para um segundo mandato, de acordo com as regras do Fundo de Pensões, poderá passar a ter direito a reforma sobre as componentes que só são pagas aos diretores”, e que representarão, em média, um aumento de 50% no salário mensal. No primeiro mandato com o estatuto de Diretor, essas componentes não serão tidas em conta na pensão.
(Noticia atualizada às 10h00 com a informação de que o departamento de relações internacionais e cooperação aparece no organograma diretamente dependente do conselho de administração e não na lista geral de todos os outros departamentos)
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