Vendedores de botijas em Lisboa dizem que a escalada de preços está a ter impacto nas vendas e consideram que o controlo de preços é uma medida irrisória. Defendem uma descida do IVA.
O preço das botijas de gás está a subir em flecha desde setembro do ano passado e a tendência agravou-se com a invasão russa da Ucrânia. A escalada pesa no bolso das famílias portuguesas e levou o Governo a voltar a impor limites máximos aos preços de algumas bilhas. Ao ECO, revendedores de botijas em bairros de Lisboa apontam que a conjuntura está a ter impacto nas vendas e consideram que o controlo de preços é uma medida irrisória. Defendem uma descida do IVA.
Mais de metade das famílias portuguesas ainda dependem do gás engarrafado, butano ou propano, para cozinhar ou aquecer as suas casas. O que não impede que a escalada dos preços esteja a afetar o negócio das bilhas de gás. “Tem havido uma quebra algo generalizada nas vendas”, admite ao ECO José Aguiar, responsável pela loja Oz Energia, na zona da Pontinha, em Lisboa, sublinhando que a tendência ” já vem desde a Covid”, mas agravou-se com a guerra.
Apesar de sublinhar que o mês de agosto é sempre atípico, dado que “as pessoas estão de férias, está calor e há mais grelhados”, pelo que “não há muito consumo” de gás engarrafado, José Aguiar denota, ainda que, em julho, esta loja vendeu cerca de 1.800 botijas de 13 kg de butano, a mais comum nos lares portugueses, valor que compara com as cerca de 1.950 bilhas vendidas em igual período de 2021. Contas feitas, é uma quebra na ordem dos 8%.
Uns quarteirões mais à frente, a tendência é corroborada por Jorge Ferreira, dono da loja Artigos Eléctricos Anale. “Como estou aqui há 40 e tal anos, fio àquelas pessoas que já têm muitos anos de casa porque senão as pessoas não tinham hipótese”, diz o revendedor de botijas da Galp, acrescentando ainda que a queda nas vendas também se deve ao facto de “o pessoal novo” não cozinhar tanto. “É só micro-ondas, micro-ondas, micro-ondas”, atira, entre risos.
Sou capaz de estar a vender menos 500 garrafas por mês face ao ano passado.
A trabalhar nesta área de negócio há mais de quatro pares de mãos cheias, Jorge Ferreira assinala que “o gás caiu muito”. Se há cerca de 20 anos este espaço contava com nove funcionários e chegou a vender cerca de “300 a 400 garrafas por dia”, agora conta apenas com dois trabalhadores e as vendas estão a cair a pique. “Sou capaz de estar a vender menos 500 garrafas por mês face ao ano passado”, enumera.
A par destes dois comerciantes, também Gustavo Martins, funcionário de um bomba na zona de Alvalade, bem como Manuel Santos, dono da oficina Auto-fascinante, em Benfica, adiantam que neste período de “verão é muito difícil vender botijas de gás”. Ainda assim, ao contrário dos empresários ouvidos pelo ECO na zona da Pontinha, Manuel Santos não denota uma quebra nas vendas face aos anos anteriores.
“As pessoas que precisam do gás têm que o comprar… É uma coisa essencial em casa para quem tem bilha e para isso têm que arranjar dinheiro“, resume o dono desta oficina, que revende botijas de gás da Galp. No entanto, o comerciante sublinha que desde que os preços começaram a subir “cada garrafa aumentou 10 ou mais euros”. Já Gustavo Martins sublinha que a escalada dos preços tem influenciado as vendas, apesar de não adiantar valores concretos.
Dos subsídios à baixa do IVA, comerciantes pedem medidas ao Governo
Para colmatar a escalada dos preços, o Governo voltou a impor limites máximos aos preços de algumas botijas de gás. A medida é temporária e permite poupanças entre 3,18 euros e 6,206 euros por garrafa. No entanto, os revendedores ouvidos pelo ECO consideram que a medida é irrisória e defendem outras.
As empresas já têm mais custos devido às entregas por causa do aumento dos combustíveis, por isso, baixando o valor tira-nos mais a nossa margem que já é pouca.
“O ideal seria criar um subsídio sobre o valor [a pagar por botija] para ajudar as pessoas“, afirma José Aguiar, sinalizando que este controlo de preços penaliza o setor empresarial. “As empresas já têm mais custos nas entregas por causa do aumento dos combustíveis, baixando o valor tira-nos mais a nossa margem que já é pouca“. Opinião contrária tem Manuel Santos, dono da oficina Auto-fascinante, que vê com bons olhos esta fixação de preços e diz-se contra um eventual subsídio por parte do Estado. “As pessoas devem ter que ganhar o suficiente para não ter que ser o Governo a suportar essas situações”, elenca.
Com a medida decretada pelo Governo, uma garrafa de 13kg de butano não pode exceder os 29,47 euros, enquanto as garrafas de 12,5 kg podem custar até 28,34 euros. Ao mesmo tempo, no caso do GPL propano T3, o máximo varia entre 29,11 euros por garrafa de 11 kg e 23,81 kg por botija de 9kg. Já as garrafas de GPL propano T5 podem custar até 109,08 euros (45 kg) ou 84,84 euros (35 kg).
Certo é que nos estabelecimentos comerciais consultados pelo ECO, a fixação de preços nas botijas de 13kg de butano (as mais usadas nos lares portugueses) teve pouco impacto face aos preços anteriormente praticados, resultando numa poupança entre os 1,43 euros e os 2,53 euros por garrafa. Nos quatro estabelecimentos, o preço desta botija ronda os 29 euros. Ainda assim, “havia aí outros [estabelecimentos] que se aproveitavam, com botijas a 35-36 euros”, comenta um colega de José Aguiar, proprietário da Oz Energia, em Benfica.
Já o dono da loja Artigos Eléctricos Anale lamenta que, apesar de esta medida ser obrigatória para todos os estabelecimentos comerciais em Portugal não seja isso que está a acontecer, pedindo, por isso, um aperto nas fiscalizações. “Isso é como o gasóleo e a gasolina, eles dizem que sim, mas não é. Nem para todas as botijas nem todas as marcas. Se for aí pela estrada vê…”, atira Jorge Ferreira. Numa ação de fiscalização realizada pela Entidade Nacional para o Setor Energético (ENSE), a 17 de agosto –um dia depois de a medida entrar em vigor –, junto a 108 estabelecimentos comerciais tinham sido detetadas sete irregularidades.
Se baixarem o IVA vai beneficiar todas as pessoas.
Em vez da fixação de preços, Jorge Ferreira defende a redução do IVA das botijas de gás. “Já nem digo a redução para 6% para não estarem a dizer que uma pessoa está a pedir muito, mas para os 13%”, aponta o comerciante, acrescentando que esta decisão beneficiaria “todas as pessoas”. A posição é partilhada por José Aguiar que destaca que “em Espanha já funciona dessa forma”. O ECO questionou o Ministério das Finanças sobre se considera essa possibilidade, mas até ao fecho deste artigo não obteve resposta. Não obstante, importa sublinhar que, a verificar-se, terá que ser negociado com Bruxelas.
Paralelamente à fixação dos preços e para mitigar o agravamento da fatura energética, o Governo relançou em abril o programa Bilha Solidária, que previa a comparticipação de dez euros por garrafa, por mês, aos beneficiários da tarifa social de energia elétrica e de prestações sociais mínimas.
Ao ECO, o proprietário da Oz Energia, na Pontinha, admite que teve “alguns clientes” a recorrerem a este apoio, dado que esta loja está localizada perto de “algumas zonas sociais, como o bairro Padre Cruz e a Horta Nova”, pelo que “há pessoas que utilizaram”. “Houve também muitos [clientes] a perguntarem e nós tentámos explicar, mas nem sempre estavam aptos para aderirem”, afirma José Aguiar.
Já Jorge Ferreira considera que essa medida “não convence ninguém” e diz que “muitos clientes desistiram” dada a burocracia inerente. De acordo com o Diário de Notícias, durante os três meses em que este apoio vigorou, abrangeu 25.542 botijas num montante que superou os 255 mil euros. O programa chegou, em média, a oito mil famílias por mês.
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A perder gás nas vendas, revendedores de botijas pedem descida do IVA
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