Quatro anos depois de ter substituído Adalberto Campos Fernandes, Marta Temido deixa a pasta da Saúde. Neste período, e com uma pandemia pelo meio, o Orçamento da Saúde teve injeções recorde.
Foi em outubro de 2018 que Marta Temido substituiu Adalberto Campos Fernandes à frente do Ministério da Saúde. Na altura, uma das críticas feitas ao governante era a excessiva dependência da Saúde do Ministério das Finanças. Foi nesse ano, num debate no Parlamento, em que Adalberto Campos Fernandes respondia às críticas dos deputados sobre as falhas na Saúde, que o então ministro disse a célebre frase do “Somos todos Centeno.” Mário Centeno era ministro das Finanças.
Saiu Adalberto e entrou Marta Temido, especialista em Administração Hospitalar e, até então, presidente do conselho diretivo da Administração Central do Sistema de Saúde. Mas as relações tensas com as Finanças não desapareceram.
“Somos todos Centeno.” Somos todos Medina?
A contestação a Marta Temido, que durante a pandemia chegou a ser a ministra mais popular de António Costa, subiu de tom este ano com a crise nas urgências em áreas como a obstetrícia e ginecologia. Em meados de junho, o ministro das Finanças, Fernando Medina, foi confrontado com a crise na Saúde e assegurou que “o que está a acontecer relativamente ao nosso Serviço Nacional de Saúde não decorre de nenhum condicionamento financeiro que lhe tenha sido imposto, pelo contrário”.
De acordo com Fernando Medina, “o que está hoje colocado não é um problema financeiro”, antes “um problema nesta área específica de escassez de médicos a trabalhar na área pública [obstetrícia e ginecologia], num momento especial de conjuntura, de fins de semana, de dificuldade em organizar esses serviços, mas com uma dimensão mais estrutural, que tem a ver com a carência de efetivos”.
Estava dado o recado. Dois meses e meio depois, e após ter anunciado um novo modelo de funcionamento e organização do SNS, Marta Temido bate com a porta e sai sem nunca ter dito “Somos todos Medina”.
Durante os quase quatro anos em que Marta Temido esteve à frente da pasta, a Saúde recebeu uma injeção recorde de verbas e admitiu milhares de novos funcionários por causa da pandemia da Covid-19.
Numa das suas últimas idas ao Parlamento, Marta Temido apresentou o Orçamento da Saúde para este ano e nas notas explicativas do documento é possível ver que nunca o SNS teve tanta injeção de dinheiro e de recursos humanos como nos últimos anos.
Despesa recorde de 13,321 mil milhões de euros
Quando entrou para o cargo, em 2018, a despesa do SNS ultrapassava ligeiramente os 10 mil milhões de euros, e, quatro anos volvidos, a despesa cresceu para um valor recorde de 13,321 mil milhões de euros. Ou seja, são mais 3,126 mil milhões de euros (ver gráfico em baixo).
O peso da Saúde na despesa do Estado também cresceu. Se em 2018 o SNS “pesava” 11,8% no total da despesa das Administrações Públicas, este ano passou a representar 13,2%. Mesmo assim, as contas da Saúde continuam a ser deficitárias, em mais de mil milhões de euros.
A “fatia de leão” dos gastos da Saúde vai para as despesas com pessoal (5,204 mil milhões de euros), e também para a aquisição de bens (2,595 mil milhões de euros) e para pagar aos fornecedores (4,751 mil milhões de euros). O financiamento é quase todo feito através de transferências do Orçamento do Estado, sendo as receitas próprias como as taxas moderadoras quase residuais. Este ano, a Saúde vai receber ainda o dinheiro da cobrança do imposto sobre as bebidas alcoólicas, bem como a contribuição extraordinária da indústria farmacêutica e sobre os dispositivos médicos.
Mais de 20 mil entraram no SNS com a pandemia
Com uma pandemia pelo meio, que começou em 2020 e se arrastou por 2021 e 2022, o Ministério da Saúde também contratou milhares de profissionais. As notas explicativas do Ministério da Saúde sobre o Orçamento do Estado mostram que em março de 2022, o número total de recursos humanos das entidades do SNS e Ministério da Saúde atingiu um total de 155.531 profissionais, incluindo hospitais em regime de Parceria Público-Privada.
São mais 20.130 entradas líquidas no sistema de Saúde face aos 135.401 profissionais que existiam no final de 2018, quando Temido assumiu a pasta (ver gráfico em baixo).
O mandato à frente da pasta da Saúde chega ao fim, mas ainda será Marta Temido a levar ao Conselho de Ministros a nova reforma da Saúde, que prevê, entre outras coisas, a criação da figura de CEO do SNS e ainda uma maior autonomia para os hospitais e centros de saúde na gestão dos seus profissionais.
Esta reforma pretende dar corpo a uma promessa feita por Marta Temido em outubro do ano passado, ainda antes da queda do Governo anterior, de que “por detrás de cada euro investido no Serviço Nacional de Saúde estão mais cuidados e qualidade de vida”.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Saúde “engordou” nos quatro anos de Temido: + 3,1 mil milhões de euros e 20,1 mil profissionais
{{ noCommentsLabel }}