Brasil de braços abertos ao investimento? Empresários têm dúvidas

Lula da Silva ainda não definiu as prioridades de política económica. António Saraiva e Jorge Rebelo de Almeida têm dúvidas sobre a possibilidade de um novo ciclo de investimento português no Brasil.

O Brasil vai estar, de novo, de braços abertos para o investimento empresarial português com Lula da Silva como Presidente? O ministro da Economia, António Costa Silva, afirma que Portugal vai procurar uma cooperação comercial mais ativa nesta nova fase política do Brasil, mas os empresários têm mais dúvidas sobre uma mudança política que signifique uma espécie de regresso ao passado quando as empresas descobriram o mercado brasileiro.

À margem a sessão de abertura da Web Summit, o ministro da Economia disse ao jornal Valor Económico que a eleição de Lula abre novas perspetivas para as relações empresariais entre os dois países. A ApexBrasil, a entidade congénere da Aicep naquele país, comunicou que o Brasil tem a maior participação de sempre na edição deste ano da Web Summit, uma Missão de Internacionalização que inclui 60 startups e 20 empresas inovadoras”. Mas muda alguma coisa? António Saraiva não acredita em mudanças significativas relativamente ao que é o passado recente do investimento português no Brasil. “Não vai trazer nada de novo“, atira o presidente da CIP. A mais importante das razões é que o Brasil “é um país economicamente muito protecionista e Lula da Silva não vai mudar isso“.

Lula da Silva ganhou as eleições no domingo, mas pouco se sabe do que será a sua estratégia económica. Como escreve a revista Veja, “o petista Luiz Inácio Lula da Silva ainda não detalhou o que pretende fazer na área económica, e isso preocupa banqueiros e empresários. A dúvida número um é como ficará a política fiscal [orçamental]”. E talvez por isso a reação dos mercados foi ambígua. No discurso de vitória, Lula foi também genérico sobre o que serão as suas prioridades. “A roda da economia vai voltar a girar, com geração de empregos, valorização dos salários e renegociação das dívidas das famílias que perderam seu poder de compra“, prometeu Lula da Silva.

E quais são as perspetivas económicas? Segundo o último relatório do FMI, o PIB brasileiro recuperou para níveis de pré-pandemia e o ritmo económico mostrou-se favorável, apoiado pela expansão e o crescimento robusto do crédito ao setor privado. As estimativas mais recentes do Fundo, datadas de julho, apontam para um crescimento económico de 1,7% este ano, quase um ponto percentual acima da taxa de 0,8% calculada em abril, mas em 2023 prevê uma expansão de 1,1%, 0,3 pontos percentuais a menos do que o previsto quatro meses antes.

António Saraiva, presidente da CIP, em entrevista ao ECO - 04DEZ19

António Saraiva aponta a realidade das “regras trabalhistas“, um enquadramento que é também apontado por Jorge Rebelo de Almeida, presidente do grupo Vila Galé, que tem dez hotéis no Brasil com mais de oito mil camas. O empresário hoteleiro afirma ao ECO que o Brasil precisa de reformas estruturais significativas em três áreas decisivas: “Justiça, área laboral e tributária“.

Não acredito que a eleição de Lula seja determinante para um regresso do investimento português”, diz Rebelo de Almeida, “a não ser que haja uma mudança radical…”, acrescenta.

Os dois líderes empresariais apontam o protecionismo, por um lado, e os níveis de exigência de capital, por outro, como fatores que funcionam como obstáculo ao investimento português no Brasil, e recordam os casos de insucesso de empresas portuguesas naquele país. “A economia brasileira é mais dependente do poder político do que é em Portugal, é mais dependente, mas tem setores pujantes, como a indústria e o agronegócio”, salienta o presidente do grupo Vila Galé.

O presidente da CIP desvaloriza os “chavões” sobre a relação económica e empresarial entre os dois países e põe a tónica no que poderá ser uma mudança no acordo União Europeia/Mercosul, com a eleição de Lula da Silva. “Pode dizer-se que haverá uma relação diferente entre Portugal e o Brasil, mas o que pode criar novas condições para o investimento português é um acordo ao nível comunitário com os países do Mercosul“. Já Rebelo de Almeida vê na melhoria das relações políticas uma eventual oportunidade. “O Presidente Bolsonaro nunca teve grande abertura para Portugal”, como aliás se percebe dos casos políticos que envolveram também o Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa nas suas últimas deslocações ao Brasil.

Jorge Rebelo de Almeida, presidente do grupo Vila Galé.Paula Nunes/ECO

O Presidente eleito vai ter um quadro político adverso na câmara do congresso. O partido com mais assentos é mesmo o de Bolsonaro, com 36% dos lugares, enquanto a base de apoio que serviu a eleição de Lula tem vários partidos e é responsável por 24% dos lugares. Conhecedor da realidade política brasileira, onde está há mais de 20 anos, Jorge Rebelo de Almeida salienta que o chamado “centrão político” desloca-se sempre em direção ao poder. “Lula da Silva vai ter de demonstrar capacidade de negociação política“, reconhece o empresário.

António Saraiva e Jorge Rebelo de Almeida apontam também a necessidade de saber quem serão os ministros do novo Governo de Lula da Silva nas áreas económicas. O líder do grupo Vila Galé valoriza, de qualquer forma, a escolha de Lula para a vice-presidência do Brasil, Geraldo Alckmin, antigo adversário do Presidente eleito. “É um moderado”, sentencia.

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