Shadi Osta e Wim Durie, que vieram para Portugal um pouco antes da pandemia, são os impulsionadores da MamaFood, plataforma de entrega de comida com nacionais e imigrantes como cozinheiros-patrões.
“Comer comida caseira todos os dias nunca foi tão fácil”. É este o mote da MamaFood, uma plataforma de entrega de comida ao domicílio, que “aterrou” em Lisboa e que conta já com mais de uma centena de cozinheiros de várias nacionalidades, que partilham as receitas da sua família e da sua cultura.
“Tive a ideia de criar a MamaFood durante o primeiro confinamento. Estava constantemente a encomendar comida em restaurantes e rapidamente comecei a sentir falta de comida caseira de verdade”, conta Shadi Osta, um dos fundadores desta startup, ao ECO. “Todos os dias havia centenas de pessoas a cozinhar comidas deliciosas no meu bairro, mas não tinha como chegar até elas”, acrescenta.
A falta de jeito para cozinhar e o gosto por comida caseira levou-o no início de 2021 a criar o site de modo a “reunir todos os cozinheiros caseiros que pudesse encontrar em Lisboa”, explica o franco-sírio. Ao projeto juntou-se Wim Durie, de nacionalidade belga, mas que cresceu em África. Os dois conheceram-se num evento de caridade no Príncipe Real, em Lisboa, cidade para onde ambos foram morar um pouco antes da pandemia.
Após conseguirem angariar cerca de um milhão de euros junto de investidores, Shadi Osta e Wim Durie elegeram Lisboa para explorar o conceito. Para Shadi, a capital portuguesa é “a cidade perfeita para um projeto” como este. Porquê? “É grande, mas não demasiado grande, tem uma população multicultural e, acima de tudo, um forte amor por cozinhas autênticas”, responde, ao ECO.
E se, numa fase inicial, a MamaFood contava com apenas com um website “simples”, dois funcionários, cinco cozinheiros e fazia as entregas a partir de outras plataformas, volvidos quase dois anos conta já com 17 colaboradores na parte logística e marketing, mais de 100 cozinheiros e “vários estafetas” e uma aplicação própria que foi lançada a 1 de novembro deste ano.
“Os cozinheiros são os seus próprios patrões”, sinaliza Shadi, explicando que a app serve “apenas para fornecer um ambiente seguro” e interligar os cozinheiros com os clientes. Para que possam focar-se apenas no que sabem fazer melhor: cozinhar. Por este serviço, a MamaFood adianta que recebe uma comissão por cada pedido feito pelos clientes, não querendo, no entanto, avançar com valores.
As receitas elaboradas por estes cozinheiros vão desde a Ásia à América do Sul, da África aos países árabes, passando ainda pela Europa, e sem esquecer a gastronomia portuguesa. Os preços por refeição rondam, em média, os oito euros por pessoa. E se no início a equipa do MamaFood tinha de procurar cozinheiros online, hoje em dia chegam-lhes diariamente várias candidaturas. Mas, afinal, como funciona o processo de recrutamento?
Cada cozinheiro precisa de concordar com as políticas da empresa e de ter um certificado europeu de alimentação e comida. Além disso, a MamaFood “prova a comida de cada cozinheiro e visita a sua cozinha”, aponta o fundador francês.
Da “humanização” à preocupação sustentável
Lilia Fortuna colabora com a Mama Food desde o início do projeto. “Há dois anos, quando ainda ainda estavam a pensar projeto, a mulher do Shadi encontrou-me no Instagram e encomendou a minha comida para casa deles”, conta ao ECO esta brasileira, que veio de “malas e bagagens” em 2016 para Lisboa em busca de “conforto e segurança”.
“Eu já fiz muita coisa com comida”, afirma Lilia, entre risos. Tinha duas empresas de catering no Brasil, mas o “medo” da violência no Rio de Janeiro fê-la mudar de vida e embarcar para Lisboa. Depois de uma pausa para “descansar”, em 2020 decidiu arregaçar as mangas. “No primeiro lockdown fiz muitas receitas, vegetarianas, mais saudáveis e postava todos os dias uma receita no meu Instagram e comecei a oferecer às pessoas para experimentarem. Depois tornou-se numa coisa de “boca a boca” e comecei a criar uma história ali”, adianta a cozinheira, que atualmente também uma pequena empresa de catering em Portugal.
Pouco depois começou também a colaborar com a MamaFood. “Compro, cozinho, embalo e só não entrego porque eles vêm buscar”, brinca Lilia, sinalizando que, em média, faz 50 pratos por semana para a MamaFood. A sua gastronomia tem “uma influência muito brasileira”, mas com uma “pegada saudável”. “Uso pouca proteína animal, até por uma questão de impacto de sustentabilidade”, sublinha.
Na MamaFood o cliente consegue ver quem é o cozinheiro, a música que ele ouve, de onde é, o que faz… Há uma humanização no processo”.
Os pedidos chegam-lhe no início da semana “com base numa estimativa”. Mas todos os dias, à exceção do domingo, há um estafeta da MamaFood a bater à sua porta para os recolher. Além da “liberdade” para propor os pratos de que gosta de confecionar, a preocupação com o ambiente (dado que as embalagens são biodegradáveis) e a vertente “mais humana” são alguns dos aspetos que mais lhe agradaram nesta app. Através desta aplicação, o cliente “consegue ver quem é o cozinheiro, a música que ele ouve, de onde é, o que faz… Há uma humanização no processo”, realça.
A culinária vista como uma “memória afetiva”
Tal como Lilia, também Vanessa Aragão vê na MamaFood uma segunda fonte de rendimento. Natural de Florianópolis, no sul do Brasil, mas também com uma “costela” espanhola devido ao seu pai, Vanessa rumou a Lisboa há “três anos e meio” em busca de novas oportunidades profissionais.
Formada em turismo e hotelaria, teve uma empresa de eventos no Brasil, onde também fez alguns cursos intensivos de cozinha. A empresária, que é dona de uma loja de chocolates belgas no centro de Lisboa, destaca que a culinária representa também “uma memória afetiva”. “O meu pai e a minha mãe sempre me incutiram o gosto pela cozinha e o meu pai cozinhava bastante. (…) Recentemente perdi o meu pai, que foi quem me ensinou, e isso conecta-me muito com ele”, conta ao ECO.
Com um gosto particular pela cozinha espanhola, para a MamaFood faz tortilhas de batata e dois tipos de paella: uma adaptada ao público vegetariano e vegano, que são verduras grelhadas; e outra uma paella valenciana “adaptada”, que leva chouriço espanhol, frango e algumas verduras. “Brevemente quero lançar uma paella de frutos do mar”, assinala.
Estamos a planear alargar o projeto a novas cidades europeias em 2023 e continuar a nossa expansão para disponibilizar a MamaFood em todo o mundo”.
Vanessa também recebe os pedidos no início da semana, mas como tem outro negócio — e a “ideia é conciliar as duas coisas” — só cozinha três vezes por semana. “Esta semana vou entregar oito tortilhas e 16 paellas“, adianta, ao ECO. Como maiores benefícios desta startup elenca “a segurança de receber o pedido e ter a garantia da venda”, e o facto de confecionar “pratos específicos sem aumentar muito o leque de produtos”.
Para já, a MamaFood só faz entregas no centro de Lisboa, mas espera alargar a área de exposição a partir do início do próximo ano. Também além-fronteiras. “Em todo o mundo existem cozinheiros incríveis e pessoas que adorariam comprar as refeições deles. Estamos a planear alargar o projeto a novas cidades europeias em 2023 e continuar a nossa expansão para disponibilizar a MamaFood em todo o mundo”, conclui Shadi Osta.
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Aliança franco-belga “desconfina” app de comida internacional em Lisboa
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