Câmara de Setúbal acusada de “insensibilidade” no acolhimento de refugiados ucranianos

  • Lusa
  • 22 Fevereiro 2023

“A Câmara Municipal de Setúbal percebeu tardiamente tal facto, provocando uma degradação da imagem” para a cidade, indica o relatório da Comissão de Fiscalização da autarquia.

A Comissão de Fiscalização da Câmara de Setúbal ao acolhimento de cidadãos ucranianos considera que houve insensibilidade do município sadino ao colocar cidadãos russos na receção aos refugiados daquele país invadido pela Rússia.

A maioria das entidades que estiveram nas audições consideram uma falta de sensibilidade o recebimento de refugiados ucranianos por cidadãos de nacionalidade russa, pelo facto de ambos os países se encontrarem em conflito”, lê-se no relatório da Comissão Eventual de Fiscalização da Conduta da Câmara e dos Serviços Municipais no Acolhimento de Refugiados Ucranianos em Setúbal (CEFCCSMARUS), a que a agência Lusa teve acesso.

“A Câmara Municipal de Setúbal percebeu tardiamente tal facto, provocando uma degradação da imagem de Setúbal”, acrescenta o relatório, considerando que também “não é claro o papel que representava a Associação dos Imigrantes dos Países de Leste (EDINSTVO), em particular o seu representante, Igor Kashin, no âmbito do processo de acolhimento dos refugiados ucranianos”.

O semanário Expresso noticiou, em 29 de abril do ano passado, que cerca de 160 cidadãos ucranianos foram recebidos na Câmara de Setúbal por dois cidadãos russos, Igor Khashin, membro da EDINSTVO e antigo presidente da Casa da Rússia e do Conselho de Coordenação dos Compatriotas Russos, e pela mulher, Yulia Kashina, funcionária do município.

De acordo com o jornal, Igor Khashin e Yulia Kashina, alegadamente, simpatizantes do regime de Vladimir Putin, teriam fotocopiado documentos pessoais dos refugiados da guerra, iniciada em 24 de fevereiro do ano passado com a invasão militar russa da Ucrânia.

De acordo com a comissão constituída pela Assembleia Municipal de Setúbal, no dia 28 de fevereiro de 2022, a Associação Anjos da Misericórdia, que três dias antes tinha iniciado a recolha de apoios e donativos para ajudar refugiados provenientes da Ucrânia, alertou a câmara sadina de que “não era de muito bom senso a presença de Yulia Kashina e Igor Kashin, de nacionalidade russa, no acolhimento dos refugiados ucranianos em Setúbal, pelo desconforto que poderia causar” ao serem recebidos por nacionais do país agressor da Ucrânia.

A comissão refere ainda que a ex-presidente da Câmara de Setúbal, Maria das Dores Meira (CDU), admitiu na audição em que foi ouvida que “houve falta de sensibilidade” do município por ter dois cidadãos russos na receção aos refugiados ucranianos. De acordo com a comissão, Maria das Dores Meira disse que “não considerava Igor Kashin como pessoa suspeita”, mas reconheceu que sendo russo, “naquele momento não poderia estar a receber refugiados” ucranianos.

Por outro lado, a CEFCCSMARUS considera que a autarquia “não atuou com os cuidados a que está obrigada” ao permitir que pessoas estranhas aos serviços municipais pudessem aceder a equipamentos informáticos utilizados para o tratamento de dados pessoais e à informação dos refugiados apoiados através da Linha Municipal de Apoio a Refugiados (LIMAR).

Em reação, o presidente da Câmara de Setúbal defendeu que o relatório da Comissão de Fiscalização ao acolhimento de refugiados ucranianos pelo município sadino “não confirma nenhuma das infundadas suspeitas lançadas no fim de abril de 2022”.

“O relatório da Comissão Eventual não confirma nenhuma das graves e infundadas suspeitas lançadas no fim de abril de 2022 sobre a atuação da Câmara Municipal no processo de acolhimento de refugiados ucranianos em Setúbal”, afirma André Martins (CDU), que reagiu à divulgação do relatório através de um comunicado na sua página oficial na rede social Facebook.

O relatório, acrescenta o autarca setubalense, “comprova, por outro lado, em alguns dos depoimentos que foram prestados à comissão por responsáveis de entidades da administração central, que existia uma relação de colaboração destas entidades com a Associação dos Imigrantes dos Países de Leste (EDINSTVO) e com os seus dirigentes no que diz respeito ao acolhimento e integração de cidadãos de vários países de leste, em particular de ucranianos”.

O presidente da Câmara de Setúbal afirma, no entanto, que o relatório, “perante a mais do que evidente falta de indícios de má conduta municipal neste caso, limita-se a apontar uma suposta “falta de sensibilidade”, que considera ser uma “conclusão puramente subjetiva e apenas sustentada em convicções pessoais dos autores do documento”. Para André Martins, “saem completamente frustradas as intenções daqueles que acusaram a Câmara Municipal de Setúbal e o seu executivo de intenções malévolas no acolhimento de refugiados”.

O autarca setubalense recorda ainda que pediu esclarecimentos ao Governo sobre alegadas suspeitas levantadas pela embaixadora da Ucrânia sobre associações de imigrantes que estavam a ajudar na receção aos refugiados da guerra na Ucrânia, mas não obteve resposta. Por outro lado, André Martins lembra que ele próprio solicitou que o Governo investigasse todos os procedimentos do município no que respeita ao acolhimento de refugiados ucranianos.

Em novembro do ano passado, a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) aplicou uma coima de 170.000 euros e duas repreensões à Câmara de Setúbal devido a alegadas “violações no tratamento de dados” de refugiados ucranianos e por a autarquia não ter, na altura, um Encarregado de Proteção de Dados. A Câmara de Setúbal impugnou as sanções junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que ainda não se pronunciou.

A agência Lusa contactou a Câmara de Setúbal, mas a autarquia sadina remete para mais tarde uma reação do presidente do município, André Martins (CDU), ao Relatório da Comissão Eventual de Fiscalização da Conduta da Câmara e dos Serviços Municipais no Acolhimento de Refugiados Ucranianos em Setúbal.

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