Hidrogénio verde salta de “laboratório” no Seixal para servir cidades ainda em 2023

O piloto no Seixal, onde se deu a primeira injeção de hidrogénio verde na rede de gás natural, serve como "laboratório" para que seja possível à escala de uma cidade completa.

Há cerca de seis anos, antes de o hidrogénio verde ser uma das energias mais faladas a nível europeu e nacional, Carlos Mendes, gestor da portuguesa Gestene, começou a ouvir falar dos aparelhos que são usados para produzir este gás em feiras internacionais. Em março de 2023, esta empresa do Seixal tornou-se a primeira produtora a injetar hidrogénio verde na rede de gás a nível nacional, uma corrida que se espera que ganhe ritmo a partir daqui. “Prevemos que tenhamos projetos à escala real ainda durante o ano de 2023”, garante o CEO da Floene, Gabriel Sousa.

O primeiro-ministro, António Costa, juntou-se ao ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, e ao presidente da Câmara do Seixal, Paulo Silva, para abrirem a válvula que marcaria o momento de injeção do hidrogénio verde na rede de gás natural, ocupando 5% do volume total de gás a circular na rede.

Um “dia muito importante”, considerou Costa, ou “histórico”, nas palavras de Cordeiro. “A história repete-se. Agora, mais de 20 anos depois da energia renovável eólica e solar, é a vez dos gases renováveis. Do eletrão à molécula”, pontuou o presidente do Conselho de Administração da Floene, Diogo da Silveira.

O destino são 82 clientes domésticos e empresariais – um deles é o Complexo dos Serviços Operacionais da Câmara Municipal do Seixal, onde o primeiro-ministro acendeu depois um fogão alimentado pela mistura de hidrogénio verde com gás natural, para demonstrar como este novo “cocktail” pode ser usado nos equipamentos domésticos comuns.

Mas como se chegou até aqui? Quando estava no processo inicial da aquisição do equipamento para produzir hidrogénio, a Gestene inscreveu-se na Associação Portuguesa de Hidrogénio, onde estabeleceu contactos até acabar por entrar em diálogo com a então Galp Gás Natural Distribuição, que em 2022 passou a chamar-se Floene. “O meu objetivo era gás para potência [para gerar eletricidade]. Mas quando surgiu esta oportunidade achei interessante”, afirma Carlos Mendes.

O projeto, chamado “Green Pipeline Project”, foi lançado a 15 de outubro de 2021, e contou desde logo com vários parceiros. Além da Gestene, que entra na história como produtora, a leiriense PRF desenvolveu a tecnologia necessária juntamente com a Floene, nomeadamente a estação onde se misturam os dois gases, conta o CEO da Floene. Em paralelo, a Bosch e a Vulcano verificaram se os aparelhos em casa dos clientes teriam capacidade para receber o novo gás (poderiam ser demasiado antigos ou ter deficiências). “Não foi preciso substituir absolutamente nada”, garante Gabriel Sousa.

Agora, o hidrogénio verde é produzido localmente pela Gestene, no Parque Industrial do Seixal, recorrendo a energia renovável – energia solar durante o dia e energia verde da rede elétrica durante a noite. É uma instalação de 60 quilowatts. O eletrolisador produz 10 normais metros cúbicos por hora, à pressão de 10 bar e, considerando toda a instalação, exigiu um investimento de 400.000 euros à Gestene, indica o gestor. Na altura em que se deparou com a oportunidade de investimento, “havia uma nova linha de máquinas eletrolisadoras que estariam mais acessíveis em termos de aquisição para empresas da nossa dimensão”, conta, rematando que “para uma pequena empresa é significativo”, mas conseguiram fazê-lo com capitais próprios. “É um eletrolisador relativamente pequeno, mas que servia exatamente o propósito deste projeto piloto”, indica o CEO da Floene.

É em cidades que podemos ter injeções a variar entre os 2 e 20%, mas não será para 80 clientes [como no piloto no Seixal], será para a rede toda. Prevemos que tenhamos projetos à escala real ainda durante o ano de 2023

Gabriel Sousa

CEO Floene

Depois de produzido, o hidrogénio é armazenado no chamado “depósito pulmão”, e percorre 1.400 metros num gasoduto de polietileno, igual a cerca de 95% da rede de gás utilizada em Portugal, até uma estação, onde é misturado com gás natural, sendo depois distribuído aos clientes.

O piloto vai continuar a decorrer no Seixal. Num horizonte de dois anos, espera-se aumentar a percentagem de injeção até aos 20%, fazer testes de como esta fatia é recebida por alguns equipamentos como esquentadores e fogões, e ainda se querem fazer testes com a injeção de 100% de hidrogénio verde. “Isto é um laboratório real para testarmos este processo”, afirma Gabriel Sousa, que espera retirar daqui a capacidade tecnológica e o conhecimento necessário para se transitar para um projeto à escala real. “Quando passarmos daqui para uma cidade inteira, a tecnologia vai ser a mesma, a estação de mistura é que vai ser diferente, com maior capacidade, mas a tecnologia é exatamente a mesma”, explica.

Noutras localizações existe um conjunto de projetos de maior dimensão que já apresentaram pedidos de injeção na rede. Se, como o Capital Verde noticiou, até janeiro deste ano eram 72, agora o número já ultrapassa os 80. “E aí claramente o que estamos a considerar são projetos à escala real. É em cidades que podemos ter injeções a variar entre os 2 e 20%, mas não será para 80 clientes [como no piloto no Seixal], será para a rede toda. Prevemos que tenhamos projetos à escala real ainda durante o ano de 2023”, conclui o líder da Floene. Para já, estes projetos estão sobretudo dependentes de financiamento, mas depois poderão lançar-se.

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