IPCC alerta que subida da temperatura mundial poderá chegar aos 1,5ºC até 2035. “Estamos a andar quando devíamos estar a correr”

Num relatório-síntese, os cientistas do IPCC deixam claro: é necessário aumentar os planos de ação climática e cortar as emissões em cerca de metade até 2030 para manter a temperatura abaixo dos 1.5ºC

Perante o aumento das emissões de gases com efeito de estufa e o agravamento aquecimento global, os cientistas do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) emitiram um novo alerta: se o ritmo da ação climática se mantiver, é provável que o mundo ultrapasse 1,5 graus Celsius (ºC) entre 2030 e 2035.

O ritmo e a dimensão dos planos de ação climática colocados em curso atualmente são insuficientes para enfrentar as alterações climáticas. O rápido e sustentado corte nas emissões e planos claros para adaptação e mitigação são necessários para enfrentar a crise climática. Estamos a andar, quando deveríamos estar a correr“, referiu Hoesung Lee, presidente do IPCC durante a conferência de imprensa, na Suíça.

Os cientistas do IPCC divulgaram esta segunda-feira um relatório-síntese, que faz um resumo de todos os documentos publicados entre 2018 e 2023. Na análise, é dado conta do consenso científico sobre a urgência da crise climática, as suas causas primárias, os seus atuais impactos devastadores, especialmente nas regiões mais vulneráveis ao clima e os danos irreversíveis que ocorrerão se o aquecimento ultrapassar os 1,5 graus Celsius, mesmo que temporariamente.

“Este relatório é um apelo claro à massificação dos esforços climáticos de cada país e de cada setor, ao longo do tempo. O nosso mundo precisa de uma ação climática em todas as frentes: tudo, em todo o lado, ao mesmo tempo“, apontou o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, num vídeo transmitido durante a conferência de imprensa

Para o IPCC, a evolução da crise climática e o atual aquecimento global, situado nos 1,1 graus Celsius, não deixa margens para dúvidas: é provável que o mundo ultrapasse 1,5 graus Celsius na primeira metade da próxima década — temperatura que deveria manter-se abaixo desse nível até 2050 quando comparado com o período pré-industrial, tal como foi acordado a nível mundial com o Acordo de Paris.

“Este relatório aponta o fracasso global em reduzir as emissões e traça um caminho claro para ultrapassarmos os 1,5 graus Celsius“, referiu uma das cientistas autoras deste relatório, durante a conferência de imprensa.

O relatório-síntese confirma dados anteriores: para o mundo se manter dentro do limite de 1,5 graus Celsius, as emissões globais de gases com efeito de estufa precisam de ser reduzidas em pelo menos 43% até 2030, em comparação com os níveis de 2019, e em pelo menos 60% até 2035. Quanto mais tempo for necessário até que as emissões globais recuem, maiores serão as necessidades de reduções posteriores.

“A ciência diz que temos de agir rapidamente e que o objetivo ainda pode ser alcançado. É uma questão de vontade política fazê-lo, e não de barreiras tecnológicas ou financeiras“, aponta a associação ambientalista Zero, em comunicado, sublinhando que “os próximos sete anos são essenciais para decidir o nosso destino“. Na mesma nota, a associação refere que a diferença entre 1,5 e 2 graus não é de 0,5, mas sim na gravidade dos impactos que “seriam duas vezes piores ou mais para muito riscos”. Nomeadamente, acesso à água potável e perda de biodiversidade.

“Se ultrapassarmos 1,5 graus de aquecimento global, não é literalmente o fim do mundo, mas o mundo parecerá muito diferente. Cada fração de grau conta e precisamos trabalhar muito, independentemente de onde estivermos”, apontam.

Mas apesar dos alertas, o documento reflete sobre o objetivo de manter o aquecimento global abaixo dos 1,5 graus Celsius reconhecendo que este é difícil, mas exequível. “O relatório identifica soluções testadas e verificadas, mas precisam de ser escaladas e adaptadas a vários contextos e regiões“, explicou Hoesung Lee.

Além disso, o documento sublinha ser necessário aumentar o financiamento para proteger as regiões mais vulneráveis e que são incapazes de reunir mecanismos e ferramentas para se protegerem dos fenómenos climáticos.

Falando em “justiça”, o presidente do IPCC afirmou que “os [países] que menos contribuíram para as alterações climáticas são as mais vulneráveis“, dando a título de exemplo que estes países estão, pelo menos, 50 vezes mais expostos a cheias e tempestades. “É necessário aumentar o financiamento para proteger estes países em, pelo menos, seis vezes até 2030. As regiões mais vulneráveis não têm essa capacidade de financiamento”, vincou.

“A ciência é clara. Agora, precisamos de vontade política, de apoio público para tomar as ações necessárias para que os objetivos de neutralidade carbónica sejam realistas e ainda motivação pessoal para estarmos nessa trajetória. Estes três elementos são necessários para a ciência se refletir nas decisões políticas“, apelou Heusong Lee.

O Relatório-Síntese do Sexto Ciclo de Avaliação do IPCC incluiu três relatórios especiais (“Aquecimento Global de 1,5°C”, “Alterações Climáticas e Terra”, e ainda “O Oceano e a Criosfera num Clima em Mudança”) e mais recentemente, os relatórios dos três grupos de trabalho (“A Base Científica Física”, “Impactes, Adaptação e Vulnerabilidade” e ainda “Mitigação das Alterações Climáticas”). Um novo relatório é esperado para 2027/2028.

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