Costa enfrenta Parlamento. Preços, TAP e habitação prometem animar o debate
O primeiro-ministro vai à Assembleia da República uma altura em que enfrenta contestação social e acusações de cansaço por parte do Presidente da República.
O primeiro-ministro regressa esta quarta-feira à Assembleia da República para mais um debate sobre política geral, num momento de tensão para o Governo socialista. O Executivo de António Costa enfrenta contestação social em setores como a educação e a saúde e está a preparar respostas para a crise na habitação e a escalada dos preços dos bens alimentares.
Esses são apenas alguns dos temas com que António Costa poderá ser confrontado no debate marcado para as 14h00. Mas esperam-se também outros assuntos, como as críticas recentes do Presidente da República, que considerou a maioria absoluta “cansada e requentada”, as polémicas da TAP e os resultados da companhia aérea, ou a turbulência que tem afetado o setor da banca a nível internacional.
Para responder às críticas dos adversários políticos, o “próprio primeiro-ministro pode antecipar os assuntos” e referir passos nas negociações com os sindicatos, bem como “tentar evidenciar os avanços no plano da habitação”, antecipa Paula do Espírito Santo, investigadora e docente no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP).
Com vários dossiês difíceis em mãos, António Costa poderá também “escudar-se um pouco na parte económica” e evidenciar os passos na consolidação orçamental, apesar de ser um “terreno fugidio e frágil”. O plenário dá-se ainda na semana em que o primeiro-ministro já revelou que vai anunciar novos apoios aos portugueses.
A resposta à crise na Habitação
O tema da habitação está na ordem do dia e a consulta pública de parte do pacote “Mais Habitação” termina esta sexta-feira. Duas das principais medidas, nomeadamente as que visam apoiar as famílias no pagamento de rendas e da prestação do crédito à habitação, foram aprovadas em Conselho de Ministros na semana passada e o Presidente da República prometeu promulgar os diplomas “com urgência”.
No entanto, Marcelo Rebelo de Sousa não está satisfeito com as respostas decididas pelo Governo e começou esta semana a “decretar” a sua reprovação às propostas do Executivo para o setor, apelidando-as de “leis cartaz”. “São aquelas leis que aparecem a proclamar determinados princípios programáticos, mas a ideia de base não é que passem à prática”, criticou, durante uma iniciativa do Correio da Manhã.
Anteriormente, em entrevista à RTP e ao Público na noite de 9 de março, o Chefe de Estado já tinha levantado dúvidas sobre o pacote de medidas do Governo, que comparou a um “melão” (“só depois de abrir o melão é que será possível ver se será bom”, disse), mas tinha aberto a porta a alguns consensos sobre políticas de habitação entre PS e PSD.
Estará a maioria “requentada”?
A mesma entrevista também pode vir a ser tópico no debate desta quarta-feira, prevê Paula do Espírito Santo. A partir do momento em que Marcelo Rebelo de Sousa considera que existe uma “maioria requentada”, significa que “acabou o estado de graça da relação entre o Presidente e o Governo” e os partidos da oposição “vão procurar ancorar-se”, refere a politóloga.
Esta declaração, que revela que o Chefe de Estado “tem consciência de que o Governo perdeu a frescura e não tem força suficiente para os desígnios a que se propôs”, pode, assim, ser um “motivo de esgrima política” neste debate, diz a especialista.
O tema TAP
Também é importante notar que o debate com o primeiro-ministro na Assembleia acontece um dia depois de a TAP apresentar as contas anuais de 2022, tendo registado lucros de 65,6 milhões de euros, voltando aos resultados positivos cinco anos depois.
No entanto, a situação em torno da companhia aérea deverá ser abordada pelos partidos à esquerda e à direita, principalmente devido à polémica indemnização de meio milhão de euros paga a Alexandra Reis e, acima de tudo, à demissão da presidente executiva e do chairman da TAP, visto que, como diz a investigadora do ISCSP, o assunto “ainda não está plenamente resolvido”. Os partidos podem “invocar alguns casos”, perspetiva.
Contestação social aumenta…
Embora a contestação social nos setores da educação e da saúde tenha sido um tema central já no anterior debate com António Costa, que ocorreu em janeiro, Paula do Espírito Santo considera que o assunto voltará a ser abordado pelos deputados esta quarta-feira. Na semana passada, o Expresso escreveu mesmo que é preciso recuar a 2013, no período da troika, para contar mais greves do que as 1.087 comunicadas no último ano.
Tendo em conta que continua “sem resolução à vista”, a politóloga não acredita “que o assunto deixe de ser abordado por parte da oposição”. No entanto, “provavelmente, o próprio primeiro-ministro pode antecipar o assunto”, acredita. Aliás, durante a manhã, o Ministério da Educação e os sindicatos dos professores voltam a estar reunidos.
… assim como o custo de vida
A inflação já é tema central há cerca de um ano, tendo acelerado com o início da guerra na Ucrânia em fevereiro de 2022. Mas o foco virou-se, ultimamente, para o preço dos alimentos. Ainda que a subida generalizada dos preços esteja a abrandar, o indicador que mede a evolução dos preços dos bens alimentares continua com tendência de aceleração.
Para responder ao problema, o Governo já prometeu “reprimir com rigor práticas comerciais abusivas”, através de um reforço da fiscalização da ASAE nos supermercados, mas continuam a existir apelos para mais ação. À esquerda, há propostas para a fixação de preços. À direita, surgem sugestões como limitar a margem de lucro nos bens alimentares essenciais.
No tema do aumento do custo de vida, os partidos também deverão tentar perceber melhor quais vão ser os apoios sociais que o Governo disse que vai anunciar na próxima sexta-feira. O primeiro-ministro adiantou que, nesta semana, serão lançadas novas medidas de apoio às famílias, cuja dimensão vai depender dos números finais da execução orçamental de 2022.
Estes apoios surgem também numa altura em que as instituições internacionais, como o Banco Central Europeu (BCE) e a Comissão Europeia, apelam a que os Governos comecem gradualmente a pôr fim aos apoios generalizados, que deveriam ser temporários, nomeadamente no que toca aos preços da energia. Além disso, alertaram também os governos para que os apoios sejam focados nas famílias mais carenciadas.
Turbulência na banca
Os últimos dias têm sido marcados por alguma turbulência no setor da banca, que começou a ganhar expressão com o colapso dos bancos Silicon Valley e Signature nos EUA. As ondas de choque cruzaram o Atlântico e chegaram à Europa, levando as autoridades suíças a promoverem o negócio relâmpago da compra do Credit Suisse pelo UBS, anunciado no final deste domingo. Apesar de garantias do BCE de que o setor bancário da Zona Euro é resiliente, os deputados podem expressar algumas preocupações sobre a situação atual.
Insubordinação na Marinha e o 25 de Abril
Habitualmente, estes debates também costumam ser marcados por temas da atualidade. Pode ser o caso dos militares da Marinha que se recusaram a embarcar no navio NRP Mondego, alegando problemas de segurança na embarcação. “É um sinal de falta de comando e autoridade”, sendo que as “forças mais conservadoras poderão evidenciar uma espécie de desnorte nas forças armadas, ilustrado com esta circunstância de haver caso e incidente que não devia ter acontecido”, aponta a politóloga.
Enquanto, por um lado, alguns argumentam que “não há justificação para a recusa de fazerem o trabalho”, outros criticam também “alguma precipitação” na resposta do chefe do Estado-Maior da Armada, Henrique Gouveia e Melo, sendo que os “elementos foram logo avaliados em praça pública”, aponta. A ministra da Defesa ainda não se pronunciou sobre o caso em profundidade, apontando que é preciso “aguardar pelas averiguações”.
Outro tema que poderá ser trazido a debate, já que se aproxima a data, são as celebrações do 25 de Abril, sobre as quais recaiu uma polémica devido ao convite do ministro dos Negócios Estrangeiros a Lula da Silva para discursar. Pode assim ser mencionada esta “circunstância de imiscuir entre Governo e Assembleia da República”, aponta Paula do Espírito Santo, sendo que são dois órgãos distintos e trata-se de um evento no espaço do Parlamento.
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