Antonio Carricarte, presidente da Câmara do Comércio de Cuba, diz que o país está focado no desenvolvimento económico. Quer mais produtividade, empresas privadas e investimento estrangeiro.
Cuba é um país sempre “em transformação”, onde o “conceito de revolução é permanente”. Quem o garante é Antonio Carricarte, presidente da Câmara do Comércio da República de Cuba. Em entrevista ao ECO, o responsável diz que este território insular localizado no mar do Caribe é mais do que turismo.
O foco está em aumentar a produtividade, incentivar a criação de empresas privadas e o envolvimento jovem e obter investimento estrangeiro para crescer mais e “de forma sustentável”. Até agora, Espanha e Canadá são os maiores investidores, mas Portugal “já está presente” no país com três empresas e “há outras que estão a mostrar interesse no setor do turismo”.
O que aconteceu à economia do país desde que Fidel deixou o poder em 2008?
Houve uma continuidade do percurso. É de destacar a criação de pequenas, médias e micro empresas que, nos últimos tempos já são mais de 7.000 em vários setores, públicas e privadas. Mais de 90% das novas empresas são do setor privado e dedicam-se a diferentes setores: construção, serviços, produção agroalimentar e informática.
Estabeleceu-se um Plano Nacional de Desenvolvimento, que define os principais setores económicos onde vamos apostar e quais as prioridades que vamos ter até 2030. Os setores de maior destaque serão a produção alimentar, energia renovável, saúde, indústria farmacêutica e biotecnológica, produção industrial e turismo — especificamente o turismo de saúde, onde Cuba tem um amplo potencial.
Que objetivos económicos querem alcançar?
Um dos objetivos é apostar em projetos em diferentes setores, contando com a participação de empresas públicas e privadas. Queremos resolver os problemas estruturais da economia cubana e ter acesso ao mercado internacional de forma mais competitiva, passando da exportação de produtos básicos à exportação de produtos com maior valor acrescentado (como o açúcar e o café).
Creio que o turismo continuará a ser essencial. Mas, no imediato, o fundamental é aumentar a produção de alimentos e apostar em fontes energéticas renováveis. Para tudo isto o investimento estrangeiro é fundamental. Queremos que participem na comercialização e sejam fomento para a indústria e cultura.
Mais de 90% das novas empresas são do setor privado e dedicam-se a diferentes setores: construção, serviços, produção agroalimentar e informática.
Como é que o Governo tem incentivado a criação de empresas privadas?
Primeiro que tudo com a própria criação. Há alguns anos isto não estava presente na economia cubana. Hoje, não só estão as empresas privadas, como também cooperativas. Inclusivamente, as empresas do setor privado converteram-se num fator dinâmico já criaram a possibilidade de substituir a importação de certos serviços e produtos e contribuíram para as exportações do país (essencialmente em produtos agrícolas, mas também em produtos com maior conteúdo tecnológico).
Mas ainda é muito prematuro avaliar o resultado das medidas. Esperamos que continuem a crescer, até porque tem tido um grande impacto na criação de emprego. Nos próximos anos contaremos certamente com um fortalecimento da união entre o setor público e privado e, principalmente, com mais investimento estrangeiro.
A economia cubana já recuperou do impacto da pandemia?
Estamos num processo de recuperação. Em 2021 o nosso PIB cresceu 2%. O estimado para este ano é entre 3 e 4%. Não falamos, portanto, de uma recuperação, mas de um caminho de recuperação. Para isso tem havido uma abertura do país ao investimento estrangeiro e uma aposta nas relações com outros países. Também temos apostado na ciência e inovação e na transformação digital. E temos valorizado muito a participação dos jovens na vida económica e social.
Como é que incentivam a participação jovem?
Temos incorporado os jovens na transformação do país. Têm sido criadas empresas de interface em muitas universidades, que têm como objetivo transladar o conhecimento para a produção, convertendo-o em projetos e negócios, atraindo os jovens diretamente para lá. Assim criou-se o Parque Tecnológico de Havana.
Além disso, temos também muitos jovens já a dirigir empresas e envolvidos em organizações. Uma boa parte das empresas criadas no setor privado são de jovens muito talentosos que têm aplicado os seus conhecimentos. Outro exemplo: muitos dos deputados que se estão a candidatar às próximas eleições [no dia 26 de março] são jovens.
Porque é que Cuba deve estar “na mira” do investimento estrangeiro?
Temos vários atrativos. O primeiro é a natureza das suas gentes, e temos também uma identidade histórica e cultural única. Em Cuba há segurança social e jurídica, que está assente nas nossas leis. Há estabilidade governativa e há, de certa forma, uma previsibilidade. Há um nível de criminalidade baixo comparado com alguns países do sul. E há responsabilidade civil.
O importante é garantir a sustentabilidade dos projetos. Queremos garantir que os projetos que temos são, desde o início, sustentáveis financeiramente e que contam com a liquidez externa. E isto dará solidez ao projeto que queremos montar em Cuba.
Mas o país tem estabilidade económica?
Cuba sempre teve problemas económicos devido ao bloqueio dos EUA. Mas o que aconteceu em 2021 foi inédito. Cuba foi incluída na lista de países patrocinadores de terrorismo [pelos EUA], o que é absolutamente mentira e reconhecido internacionalmente. Isso teve impacto sério nas relações financeiras, no comércio e nos bancos do país. Só no turismo perdemos quase cinco milhões de visitantes, uma remessa abruptamente interrompida devido ao governo dos EUA.
Depois tivemos uma pandemia e Cuba não teve acesso à vacina nem a outros medicamentos. A sorte foi o nível de ciência que o país tem neste momento. E, graças a isso, conseguimos restaurar a segurança, ultrapassar a Covid e começar a crescer. Houve muita instabilidade, mas mesmo assim o país resistiu. E agora, com estas mudanças, a economia vai crescer de forma sustentável, utilizando toda a força que a nossa sociedade tem.
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“Mais de 90% das novas empresas cubanas são do setor privado”
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