“O trabalho remoto é uma nova forma de emigração”

Em 2022, a queda real do salário dos jovens com o ensino superior foi de 6%. O trabalho remoto pode ser uma forma de elevar os salários, e é já uma nova forma de emigração, admite o presidente da FJN.

Apesar de a educação superior continuar a garantir salários mais elevados, o diferencial entre o ensino universitário e o secundário tem vindo a diminuir. No ano passado, a queda real do salário dos jovens com o ensino superior alcançou os 6%, tendo sido a mais acentuada, revela esta quinta-feira o “Estado da Nação 2023“. O trabalho remoto pode ser uma forma de elevar os salários. É “uma realidade incontornável” e até “uma nova forma de emigração”, admite Carlos Oliveira, presidente executivo da Fundação José Neves (FJN), em entrevista ao ECO Trabalho.

“Os salários são, de facto, mais competitivos. Mas, no final do dia, o talento e as competências destes portugueses não estão a ser utilizadas para desenvolver e gerar valor para as empresas e para o país. As áreas das TIC são as que pagam melhor aos jovens diplomados. Mas os salários em Portugal não competem com os da Europa e outras partes do mundo”, afirma.

Carlos Oliveira considera que é urgente apostar no reforço da educação e da qualificação dos portugueses jovens e adultos para as competências e para os empregos do futuro. “A educação tem que ser o elevador social para os portugueses“, defende.

Ter educação superior continua a garantir salários substancialmente mais elevados, mas este diferencial está a diminuir, tendo atingido níveis mínimos históricos em 2022. Temos cada vez mais jovens qualificados, mas os salários não acompanham. Como é que isso se explica?

A diferença salarial está a diminuir porque, enquanto o salário médio dos trabalhadores com ensino secundário em 2022 estava sensivelmente ao mesmo nível do de 2011 (em termos reais), o dos trabalhadores com o ensino superior ainda era 13% inferior ao de 2011. A queda real do salário dos jovens com o ensino superior é muito significativa e só entre 2021 e 2022 chegou aos 6%, a mais acentuada.

O emprego dos jovens tem crescido muito em setores com baixa produtividade, que tendem a ter salários mais baixos e piores condições de trabalho, nomeadamente contratos precários que não incentivam o desenvolvimento e progressão na carreira.

Uma outra razão tem que ver com a sobrequalificação dos jovens. Cerca de 20% está a trabalhar em profissões que não exigem esse nível de escolaridade e, portanto, estão a ser remunerados abaixo do seu potencial. O emprego dos jovens tem crescido muito em setores com baixa produtividade, que tendem a ter salários mais baixos e piores condições de trabalho, nomeadamente contratos precários que não incentivam o desenvolvimento e progressão na carreira.

Por outro lado, em geral os salários têm aumentado pouco e uma das principais razões está na estagnação da produtividade em Portugal, revelando uma clara desassociação com o aumento das qualificações. O Estado da Nação de 2022 aborda esse círculo virtuoso entre qualificações, produtividade e salários, que não está a funcionar em Portugal.

O desemprego jovem em Portugal tem diminuído, mas continua acima da média europeia. Face ao aumento de qualificações, como se explica este fenómeno? Como é que o país pode obter mais ROI na aposta feita na educação destes jovens?

A coexistência de desemprego e de empresas com dificuldades em recrutar é um dos paradoxos da realidade portuguesa, que se pode dever a vários fatores. Esta situação não será alheia à estrutura produtiva portuguesa, que está muito assente em setores pouco intensivos em conhecimento.

Carlos Oliveira, presidente executivo da Fundação Jóse NevesRicardo Castelo

Há ainda sinais de desfasamento entre a procura e oferta de qualificações de nível superior, uma vez que há áreas de formação com uma elevada taxa de desemprego entre os recém-diplomados.

Finalmente, os salários baixos podem ser outro fator relevante, uma vez que muitos podem não estar disponíveis para trabalhar com níveis salariais tão baixos.

Outros estudos, nomeadamente o mais recente relatório da Landing.jobs, sugerem que trabalhar a partir de Portugal para o estrangeiro faz disparar o salário. Estamos a assistir a um novo ‘brain drain’, mas sem sair do país?

O trabalho remoto é uma realidade incontornável e uma nova forma de emigração. Os salários são, de facto, mais competitivos, mas, no final do dia, o talento e as competências destes portugueses não estão a ser utilizadas para desenvolver e gerar valor para as empresas e para o país.

Os salários são, de facto, mais competitivos, mas, no final do dia, o talento e as competências destes portugueses não estão a ser utilizadas para desenvolver e gerar valor para as empresas e para o país.

As áreas TIC são as que pagam melhor aos jovens diplomados. Mas os salários em Portugal não competem com os da Europa e outras partes do mundo.

Estudos internacionais concluem que, devido à pandemia da Covid-19, os alunos perderam 56% da aprendizagem prevista. Qual o impacto destas perdas nas Metas para uma Sociedade do Conhecimento em 2040?

Esta geração até poderá vir a ter taxas de conclusão do ensino secundário e superior semelhantes às anteriores, mas é expectável que as competências efetivas que venham a desenvolver fiquem aquém. E isso terá implicações no alinhamento entre educação e emprego, ou seja, os jovens terem ou não terem o nível de competências que os empregadores procuram.

O PRR tem uma série de investimentos para a questão da formação. Considera que são suficientes? Que outras apostas deveriam ter sido feitas?

Mais do que falarmos do PRR e daquilo que o mesmo deveria contemplar, é urgente criar e implementar uma Agenda da Educação em Portugal para a próxima década. É fundamental olhar para a educação de uma forma concertada, como um processo contínuo ao longo da vida, que inclui a educação obrigatória, a educação e formação profissional, a educação superior e a educação dos adultos ao longo da vida.

É urgente apostar no reforço da educação e da qualificação dos portugueses jovens e adultos para as competências e para os empregos do futuro. A educação tem que ser o elevador social para os portugueses.

É urgente apostar no reforço da educação e da qualificação dos portugueses jovens e adultos para as competências e para os empregos do futuro. A educação tem que ser o elevador social para os portugueses.

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