Caso Altice é “bom indício” do erro que será privatizar a TAP, diz Mariana Mortágua
Para a coordenadora do Bloco de Esquerda, "toda a situação da PT é uma história de terror, do que acontece quando uma empresa das mais importantes do país é privatizada".
A coordenadora nacional do Bloco de Esquerda (BE) defendeu esta segunda-feira que o caso de alegada corrupção na Altice devido a negócios imobiliários é um bom indício do erro que o Governo irá cometer ao privatizar a TAP.
Em declarações à margem de uma visita ao mercado semanal de Espinho, no distrito de Aveiro e Área Metropolitana do Porto, Mariana Mortágua comentou assim a renúncia apresentada por Alexandre Fonseca ao cargo de diretor executivo da antiga Portugal Telecom (PT) e, atualmente, a maior empresa nacional de telecomunicações.
“Devemos aprender com o que vai acontecendo, olhar para as empresas que foram privatizadas, perguntar o que aconteceu a cada uma delas e aprender com isso. Talvez isso possa dar um bom indício de por que é que é uma má ideia privatizar a TAP”, defendeu a também deputada e líder parlamentar do BE.
A partir do momento em que foi privatizada, a PT transformou-se num joguete na mão de poderosos, sejam eles Ricardo Salgado ou depois os seus donos internacionais, como a Altice.
Para Mariana Mortágua, “toda a situação da PT é uma história de terror, do que acontece quando uma empresa das mais importantes do país é privatizada”. Nesse contexto, a presente investigação do Ministério Público à empresa de telecomunicações “é o último episódio desse processo, que utilizou imóveis da própria PT, da própria Altice, para negócios pessoais e enriquecimento pessoal”.
A coordenadora do BE espera “que a justiça corra rapidamente”, mas considera que já há uma lição a retirar do caso. “A Portugal Telecom empregava milhares de pessoas, tinha tecnologia de ponta, desenvolveu serviços inovadores e fez tudo isto enquanto era pública. Mas, a partir do momento em que foi privatizada, transformou-se num joguete na mão de poderosos, sejam eles Ricardo Salgado ou depois os seus donos internacionais, como a Altice”, afirmou.
Bloco vê ligação entre corrupção e preço das casas
Durante a mesma visita, a coordenadora do BE alertou para ligações entre a corrupção imobiliária por parte de Estado, autarquias e empresas, e a crise na habitação. A sucessora de Catarina Martins distribui panfletos com alertas para o que o BE considera o erro das políticas com que PSD, CDS e PS fizeram, nos últimos anos, duplicar o preço das casas e aumentar em 50% o custo do arrendamento “em Lisboa, no Porto, em Espinho, em Viseu e em todo o país”.
Mariana Mortágua relacionou essas dificuldades com a contrastante facilitação imobiliária a entidades estrangeiras e deu um exemplo recente: “Esta semana ficámos a saber que um empresário chileno de uma petrolífera comprou 14 imóveis na zona de Lisboa através de vistos gold com um investimento total de oito milhões de euros. É um corrupto condenado. Os vistos gold serviram para um corrupto condenado conseguir nacionalidade para o seu filho e para o seu irmão e residência em Portugal”.
Para a líder do BE, “isso é o Estado a promover a corrupção através dos vistos gold”, até porque o Governo “anunciou em fevereiro” que ia acabar com essas autorizações especiais de residência para investidores, mas, chegado o mês de julho, elas ainda vigoram, com 8.000 pedidos em lista de espera.
“Quando o Estado diz que, para resolver o problema da habitação, vai facilitar ainda mais o licenciamento imobiliário, temos aí outro exemplo do que é corrupção”, acrescentou Mariana Mortágua, reforçando esse argumento com referência ao caso de Espinho, município da Área Metropolitana do Porto onde dois ex-presidentes de Câmara são suspeitos de práticas ilegais para agilizar negócios com imóveis.
A coordenadora do BE afirma, por isso, que a corrupção não pode ser um assunto que se valoriza em abstrato, mas que, na prática, não se combate. O discurso anticorrupção do recente texto do primeiro-ministro, António Costa, no Observador é, nessa perspetiva, apenas “um slogan que se usa”, refletindo uma estratégia que até vai “afinando as leis”, mas negligencia que, perante raras condenações, mais importante era lutar contra o que viabiliza as práticas ilegais.
“O que permite a corrupção, em primeiro lugar, é a porta aberta do Estado aos negócios – a forma como os interesses privados entram pelo Estado adentro. Pôr aquilo que é público nas mãos do privado (…) favorece o crime económico”, realçou a coordenadora do BE, notando que também ao nível autárquico “há neste país um problema muito sério de abuso de poder, crime económico e corrupção”.
Isso deve-se precisamente ao negócio imobiliário, “que durante muitos anos se encarou como uma forma de lucro fácil – muitas vezes até com consequências ambientais desastrosas – para enriquecimento de construtores e empresas”, referiu.
A crise da habitação é consequência dessas práticas, porque, enquanto esses negócios imobiliários ilícitos se desenrolavam, em Portugal “não houve uma política que protegesse a habitação” – ao contrário do que aconteceu em metade dos Estados-membros da União Europeia, que já têm legislação a regular as rendas, e em países como o Canadá e a Dinamarca, e regiões como Palma de Maiorca e Ibiza, que “já impedem ou querem proibir a venda de casas a não-residentes”.
Mariana Mortágua propõe-se corrigir as estratégias dos últimos governos nacionais e declara: “Queremos inverter essas políticas, protegendo a habitação com limites às rendas, com limites às taxas das prestações ao banco – porque as pessoas não estão a aguentar – e com regras apertadas na contratação com os privados e no próprio licenciamento”.
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