📹 Da literacia à regulamentação. Como as empresas podem precaver os riscos e tirar partido da IA
É uma oportunidade que não pode ser desperdiçada e promete aumentar produtividade, eficiência e inovação. Mas há riscos relevantes, alertam os oradores de ""Será o ChatGPT o seu novo colaborador?".
Da indústria à banca, passando ainda pela saúde, o impacto da inteligência artificial (IA) será transversal a todas as áreas. É uma oportunidade que não pode ser desperdiçada, e que promete aumentar a produtividade, a eficiência e a inovação nas empresas. Mas, na sombra de enormes oportunidades, encontram-se riscos relevantes. Aumentar a literacia em IA e acelerar a regulamentação a nível europeu destas ferramentas foram algumas das principais ideias deixadas durante o debate “Será o ChatGPT o seu novo colaborador?”, organizado pelo Trabalho by ECO, e que juntou à conversa Carla Pombeiro, diretora de Pessoas da Sumol+Compal, Paulo Dimas, vice-presidente de inovação da Unbabel e CEO do Center for Responsible AI, e Rute Belo, national senior manager de recrutamento e seleção especializado da Multipessoal.
A Sumol+Compal é uma das empresas que tem sabido tirar partido da tecnologia. “Nos últimos três anos fizemos um investimento muito grande para trazer para a Sumol+Compal o benefício da inteligência artificial. Inaugurámos um armazém em Almeirim que é todo ele automatizado”, começa por dizer Carla Pombeiro.
Hoje, nessa fábrica — que em 2021 já tinha sido apelidada da primeira fábrica 5G em Portugal —, a arrumação de paletes e de produtos, bem como o carregamento dos produtos nos camiões são já tarefas totalmente automatizadas, que não necessitam de intervenção humana.
“E não houve despedimentos quando criámos este armazém automático”, garante a diretora de pessoas da companhia. “Houve foi a necessidade de requalificar trabalhadores e contratar novas competências para poderem operar neste novo ecossistema”, explica.
Mas não só nas operações na fábrica têm sido feitas alterações, rumo a um futuro mais tecnológico e eficiente. Também noutras áreas, mais transversais ao negócio, tem sido feito um investimento, nomeadamente em equipas de data e analytics.
“Percebemos que este tema nos traz uma vantagem enorme em termos de competitividade, produtividade, de fazer coisas novas e de forma mais rápida (…) No fundo, estes movimentos de transformação são cíclicos e têm de ser encarados com otimismo, até porque não os podemos travar”, afirma.
Inaugurámos um armazém automático em Almeirim, que é todo ele automatizado. (…) E não houve despedimentos quando criámos este armazém automático. Houve foi a necessidade de requalificar trabalhadores e contratar novas competências para poderem operar neste novo ecossistema.
Paulo Dimas não podia estar mais de acordo. O vice-presidente de inovação da Unbabel e CEO do Center for Responsible AI acredita que estas tecnologias vão contribuir para aumentar a produtividade e que não devem, de todo, ser encaradas como destruidoras de postos de trabalho. “O que há é uma transformação dos postos de trabalho”, refere.
“Vão permitir criar novos produtos, oportunidades absolutamente transformadoras e que vão ter impacto em setores muito concretos, desde logo na área da banca e da saúde. A saúde é precisamente uma área que estamos a atacar no Center for Responsible AI”, adianta.
No âmbito do consórcio do PRR que a Unbabel está a liderar, um dos produtos que está a ser desenvolvido tem como objetivo ajudar os médicos dos hospitais a darem alta aos seus doentes. “Este é, normalmente, um processo muito ineficiente, porque o médico não tem a certeza se pode ou não dar alta, e isso faz com que as camas estejam ocupadas por mais tempo. Portanto, reduz toda a eficiência de um hospital”, explica.
Mas, ao mesmo tempo, e tendo em conta que se trata de uma área tão sensível, alerta para a necessidade de que a IA seja “confiável” e “responsável”.
Contratar, redirecionar e formar o talento
Neste contexto, também as necessidades das empresas ao nível de competências estão a mudar. Apesar de, sobretudo no que toca a perfis tech, a escassez de talento já ser bem notória, não se prevê um abrandamento das necessidades de recrutamento das empresas. “Vai ser necessário cada vez mais talento. E há que criar condições para que esse talento — que é gerado em Portugal — fique cá”, diz Paulo Dimas.
Rute Belo, national senior manager de recrutamento e seleção especializado da Multipessoal, nota também que a rápida evolução tecnológica está já a ter impacto ao nível dos perfis mais procurados pelos empregadores. “Perfis relacionados com inteligência artificial, com a ciência dos dados, perfis ligados à transformação do negócio…”, elenca.
Além de profissionais com competências mais técnicas, no sentido de saberem usar estas novas tecnologias, Rute Belo fala também em profissionais capazes de repensar e, muitas vezes, transformar o negócio, pensando nas potencialidades e mais-valias destas ferramentas que vão surgindo.
E os atuais colaboradores que veem as suas funções mudarem? “Ou tentamos redirecionais os perfis que temos para áreas onde também necessitamos daquele tipo de competências e estão menos tecnológicas; ou apostamos na formação“, responde Carla Pombeiro.
No que toca à segunda hipótese, a Sumol+Compal conta com uma academia que agrega toda a formação e aprendizagem dentro da empresa. Este ano, a transformação digital é precisamente um eixo estratégico na academia, adianta ainda gestora de pessoas.
“Às vezes são tomadas decisões por grande iliteracia em IA”
Para garantir que a transformação digital tem sucesso, investir na literacia em inteligência artificial é absolutamente crítico. Em vez de proibir o uso destas ferramentas — como algumas empresas já o fizeram, nomeadamente aquando do aparecimento do ChatGPT — há que “apanhar o comboio” o quanto antes.
“É preciso usar, até porque isso vai aumentar as nossas capacidades como seres humanos. Proibir o uso destas ferramentas não faz sentido (…) Há sempre receios, mas às vezes são tomadas decisões por grande iliteracia em inteligência artificial”, defende Paulo Dimas.
É preciso usar, até porque isso vai aumentar as nossas capacidades como seres humanos. Proibir o uso destas ferramentas não faz sentido (…) Há sempre receios, mas às vezes são tomadas decisões por grande iliteracia em inteligência artificial.
“O fundamental é educar as pessoas para a IA. Estou sempre a dizer aos meus filhos que têm de usar o ChatGPT. Uma criança pode ter uma conversa com o ChatGPT sobre qualquer tema da História. Ele é um especialista em tudo aquilo que já passou. Temos um especialista no bolso que nos pode satisfazer a curiosidade sobre todos os temas da História”, continua o CEO do Center for Responsible AI.
Na Sumol+Compal “não proibimos a utilização de nenhuma ferramenta”, garante, por sua vez, Carla Pombeiro. “Pelo menos, por enquanto, não existe essa diretriz, mas sentimos que temos de investir nesta área”. Como? Através da sensibilização e promoção de uso correto.
“Este ano criámos uma equipa responsável pela segurança da informação dentro da organização para haver um owner deste tema, ficando responsável pela definição da estratégia, das políticas e dos procedimentos a adotar na organização”, exemplifica. “É fundamental prepararmos as pessoas para saberem trabalhar e gerir neste novo ecossistema”, salienta ainda.
Regulamentação para evitar efeitos nocivos
Rute Belo alerta ainda para a necessidade de regulamentação e legislação a nível europeu. “É algo que nos vai permitir ter alguma segurança”, acredita.
Este é um tema que tem estado em cima da mesa na União Europeia (UE). Ainda no mês passado, o Parlamento Europeu deu “luz verde” às primeiras regras da UE para a inteligência artificial, que irá agora negociar com o Conselho, para proibir a vigilância biométrica e impor transparência em sistemas como ChatGPT.
As regras em causa visam “promover a adoção de uma IA centrada no ser humano e fiável e proteger a saúde, a segurança, os direitos fundamentais e a democracia dos seus efeitos nocivos”, explicava a assembleia europeia na altura.
Em concreto, nesta posição agora adotada pelos eurodeputados, está definido que as novas regras prevejam uma total proibição da IA para vigilância biométrica, reconhecimento de emoções e policiamento preventivo, imponham que sistemas geradores desta tecnologia como o ChatGPT indiquem de forma transparente que os conteúdos foram gerados por IA e ainda que os programas utilizados para influenciar os eleitores nas eleições sejam considerados de alto risco.
Paulo Dimas reconhece que existem riscos e que são “muito significativos”. “O maior risco que eu vejo é na área da democracia. Uma grande preocupação que existe neste momento é o impacto que a IA vai ter nas eleições americanas do próximo ano. Porque, pela primeira vez, vamos ter robôs e chats que vão poder criar conversas que são indiferenciadas de seres humanos. Vamos ter proliferação de robôs que são falsas pessoas. Vão parecer pessoas, têm fotografia, falam como se fossem uma pessoa, mas não são”, alerta.
A UE está unida na necessidade de regular a IA e evitar estes possíveis efeitos nocivos. “O problema é sempre a lentidão destes processos. A melhor hipótese aponta para 2025 e, até lá, os riscos existem“, conclui.
A Comissão Europeia apresentou, em abril de 2021, uma proposta para regular os sistemas de IA, a primeira legislação ao nível da UE e que visa salvaguardar os valores e direitos fundamentais da UE e a segurança dos utilizadores, obrigando os sistemas considerados de alto risco a cumprir requisitos obrigatórios relacionados com a sua fiabilidade.
O documento tem estado desde então em discussão entre os colegisladores e, no final de maio, a vice-presidente executiva da Comissão Europeia, responsável por Uma Europa Preparada para a Era Digital e para a Concorrência, Margrethe Vestager, disse esperar um acordo este ano na UE relativamente à primeira lei sobre IA. Contudo, prevê-se que as novas regras só entrem em vigor em 2025, dado o necessário tempo de adaptação, não acompanhando a velocidade da tecnologia.
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