Maternidade e carreira: o papel das empresas na igualdade de oportunidades

  • Célia Brás
  • 14 Agosto 2023

Enquanto continuarmos a falar em maternidade e não paternidade, muitas mulheres vão continuar a enfrentar obstáculos na promoção ou progressão na carreira.

Conciliação, equilíbrio, sacrifício, resiliência, expectativas, culpa, desafios, apoio, determinação, ambições, dedicação, cuidado, crescimento, perseverança, plenitude, e solidariedade: são estas as palavras da maternidade do século XXI. É no início de 2019, enquanto aguardo o nascimento do meu primeiro filho, que estas palavras têm verdadeiro impacto em mim. Lembro-me do turbilhão de emoções que sentia: por um lado, o receio e a incerteza profissional, e, por outro, a alegria e ansiedade pela chegada da maternidade.

Na altura, era Country Manager de Espanha, responsável por gerir a equipa, fazer crescer a área de negócio e cumprir um P&L ambicioso. Era um projeto ao qual me tinha dedicado de corpo e alma e, de repente, chega o momento de entregar tudo a um colega e focar-me na maternidade. Recordo-me de ir para casa com confiança na empresa, mas com um sentimento de incerteza face ao que seria a minha carreira profissional a partir daquele momento.

Tinha a ambição de um dia vir a ser COO, a possibilidade de assumir esta função numa empresa com um ritmo acelerado e inserido no setor dinâmico como o do marketing digital, é algo que me entusiasma pelos desafios de crescimento e evolução que enfrentamos. Todavia, o facto de estar a ter o meu primeiro filho sem ter atingido este marco profissional criava-me inquietude. E receber o convite, durante a licença, para assumir o cargo de COO, aquando do meu regresso, foi um marco muito importante e reforçou a confiança na empresa. Infelizmente, não são muitas as empresas que têm este tipo de cultura de valorização do profissional por aquilo que este aporta (e aportou), independentemente do género ou da sua situação familiar.

Já passaram quatro anos e entretanto já tenho um segundo filho e tem sido uma aventura profissional e pessoal fantástica, onde posso ser completa como profissional, mãe, mulher e amiga. Mais do que partilhar a minha experiência pessoal, que considero de sucesso, é importante poder partilhar os desafios significativos que ainda hoje são sentidos e que afetam a progressão de carreira das mulheres que sonham com a maternidade. Alguns desses desafios incluem a falta de tempo para investir em si mesmas e no seu desenvolvimento profissional, a pressão de equilibrar as responsabilidades familiares com as exigências do trabalho, a falta de apoio adequado e opções de cuidados infantis de qualidade, além da persistência de estereótipos de género que podem limitar as oportunidades de progressão. As mulheres enfrentam uma série de pressões sociais e expectativas quando se trata de equilibrar maternidade e carreira. A sociedade muitas vezes impõe um ideal de mãe perfeita, que deve ser capaz de se dedicar integralmente aos filhos sem comprometer a sua carreira. Essas expectativas podem gerar conflitos internos e externos, levando muitas mulheres a sentirem-se culpadas por não atender a esses padrões irreais.

Infelizmente, ainda está muito enraizado na sociedade que é da responsabilidade da mãe tomar conta das crianças. Na minha opinião, enquanto continuarmos a falar em maternidade e não paternidade, muitas mulheres vão continuar a enfrentar obstáculos na promoção ou progressão na carreira. Falar em paternidade com medidas verdadeiramente repartidas significa falar em equidade. Para mim, um exemplo muito óbvio é a licença de parentalidade, que idealmente teria a duração de 12 meses, repartida de forma equitativa entre pai e mãe, com 83% da remuneração de referência. Assim, seria possível equilibrar as responsabilidades da parentalidade, reduzindo o impacto da falta de creches, tornando viável a recomendação da OMS de prolongar a amamentação e fortalecer os laços emocionais do bebé com mãe e pai.

Questiono-me porque, como sociedade, continuamos a insistir numa estrutura que cria pressão nas famílias, em vez de promover soluções dinâmicas capazes de acompanhar os desafios da atualidade. A elaboração e revisão de leis que garantam a igualdade de oportunidades e a proteção dos direitos das mulheres e mães é crucial. Além disso, as empresas devem implementar políticas e práticas que apoiem a conciliação entre a paternidade e a carreira, incluindo horários flexíveis, opções de trabalho remoto, programas de licença parental remunerada e programas de desenvolvimento profissional contínuo.

Durante este meu caminho, tenho conseguido desenvolver algumas estratégias que me têm ajudado a encontrar o equilíbrio, tais como estabelecer prioridades claras, aprender a delegar tarefas, procurar apoio em redes de suporte, aproveitar ao máximo o tempo disponível, cuidar do meu bem-estar e estabelecer metas realistas. Mas também não posso deixar de reconhecer a importância de poder contar com o apoio e compreensão de todos para o cumprimento da redução horária e o apoio emocional para batalhar as noites sem dormir, enquanto procurava equilibrar a gestão familiar. A verdade é que, mais uma vez, se destacou a importância da cultura da empresa.

Com o apoio adequado, é possível equilibrar a maternidade e a carreira. Assim, é essencial que as empresas ofereçam um ambiente de trabalho inclusivo e flexível, onde as mães se sintam apoiadas e valorizadas. Espero conseguir inspirar responsáveis de empresas a acreditarem que a maternidade não é um obstáculo, mas uma força impulsionadora para o sucesso.

  • Célia Brás
  • COO da Adclick

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