Taxas de retenção de estagiários são elevadas, mas desafio é grande

Atrair e reter talento passou a ser um dos desafios dos escritórios de advogados. Cinco dos seis escritórios contactados pela Advocatus apresentam taxas de retenção de estagiários superiores a 80%.

O mercado de transferências dos escritórios é bastante movimentado ao longo de todo o ano. “Step by step”, os advogados vão traçando o seu próprio caminho e construindo a sua carreira. Boa remuneração, equilíbrio entre a vida pessoal e profissional ou até um projeto desafiador, várias são as motivações dos advogados ao longo do seu percurso.

Atrair e reter talento passou assim a ser um dos desafios dos escritórios de advogados. Numa área de alta rotação como a advocacia, ficarão os estagiários pelo caminho? Ou conseguirão os escritórios reter os talentos que formam?

Dos seis escritórios contactados pela Advocatus é a PLMJ e a Morais Leitão que apresentam uma taxa de retenção de estagiários maior.

Na firma liderada por Bruno Ferreira a taxa encontra-se acima dos 90%. Fonte oficial do escritório assegurou que “só não são convidados a ficar os estagiários que não obtiveram a melhor das avaliações ao longo do estágio, baseando-se essa avaliação na capacidade jurídica adequada àquela fase da carreira, mas também nas características pessoais e forma como se integrou na PLMJ”.

Já na Morais Leitão, liderada por Nuno Galvão Teles, no último triénio (2020-2022), a taxa foi de 90%. “Essa sempre foi, de resto, a nossa filosofia: contratar o número de estagiários com que contamos ficar, como associados, findo o estágio”, sublinhou Joana Almeida, diretora de Pessoas.

Com taxas de retenção superiores a 85% está a Miranda & Associados e a Vieira de Almeida (VdA). A CMS afirmou que a taxa média dos últimos quatro anos é de 80%. Por fim, a SPS Advogados avançou que no escritório ficam cerca de 35% dos estagiários.

À Advocatus, Susana Miranda, diretora de Talento da VdA, considerou que para garantir a retenção de talentos no escritório é “essencial” ouvirem os colaboradores das várias gerações e perceber as suas motivações para conseguirem delinear estratégias que respondam às suas necessidades.

“Para reter talento numa sociedade de advogados, é muito importante termos um conjunto de medidas que articulem o crescimento e desenvolvimento profissional com a promoção do bem-estar de todos. Por último, e não menos importante, temos de garantir que acompanhamos as tendências do mercado com a capacidade de inovar e ser ágeis nas abordagens”, explicou Susana Miranda.

Já Rita Gouveia, sócia da CMS, revelou que no escritório são vários os aspetos que valorizam e que implementam, como a aposta numa aprendizagem e formação contínuas, ambientes flexíveis de trabalho que facilitem um equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, a disponibilização de ferramentas tecnológicas e a integração e interação com os escritórios da rede CMS.

Acreditamos, também, que as várias políticas implementadas pela sociedade numa vertente ESG estão a ter resultados muito interessantes. Entre elas destacamos o apoio a associações de cariz social, o tempo concedido aos pais e às mães para acompanhamento dos primeiros meses de vida dos filhos e a horta comunitária que temos”, acrescentou.

Ciente que o modelo de carreira para a nova geração de advogados está a mudar, a sócia e corresponsável pelo departamento de Recursos Humanos da SPS, Filipa Ruano Pinto, considera que as pessoas já não procuram a estabilidade de se manterem na mesma sociedade para o resto da sua carreira. “Procuram experiências e têm menos apego”, assegurou.

“Para retenção de talentos, o que se tenta fazer, cada vez mais, é oferecer mais cedo uma remuneração que lhes forneça autonomia financeira, um ambiente de trabalho saudável com alguma preocupação de work life balance com que eles se identifiquem e muita preocupação na mentoria, formação e desenvolvimento pessoal já que estes fatores são uma exigência desta nova geração”, explicou Filipa Ruano Pinto.

Na Morais Leitão, por outro lado, procuram encontrar a “combinação certa” de respeito e equilíbrio, numa abordagem “muito pragmática”. Para isso tentam oferecer uma carreira internacional a quem tiver interessado, abrindo escritórios em novas jurisdições, aprovando planos formais e informais de rotação internacional e contratualizando secondments com parceiros.

“Na verdade, o que é necessário é termos a humildade suficiente para reconhecermos que servimos uma instituição de pessoas, que funciona em comunidade, e que evolui e aprende com as pessoas que integra. Somos uma Sociedade estável, sem grandes flutuações, onde as pessoas tendem a querer ficar durante muitos anos. Esta perceção confirma-se nas altas taxas de retenção que temos; ainda assim, o que espero, como diretora de Pessoas, é que cada pessoa possa fazer diariamente e em liberdade as suas escolhas individuais sobre a carreira que desenvolve”, notou Joana Almeida.

À Advocatus, o núcleo de estágio da Miranda explicou que para reter talento é necessário, em primeiro lugar, proporcionar um estágio “verdadeiramente integrado”. Depois apontam a formação como um fator também diferenciador. Por fim, destacam o “espírito de amizade” e “entreajuda” entre os diversos grupos de estágio.

Por fim, na PLMJ existe uma “grande preocupação” com a construção e retenção dos futuros advogados. Segundo fonte oficial, o escritório tem “capacidade de remuneração muito acima do mercado e exposição dos advogados, desde muito cedo nas suas carreiras, a assuntos particularmente desafiantes e a talento fora de série”.

Feedback é essencial

Independentemente dos tipos de programas e organização dos estágios, nas sociedades de advogados contactadas pela Advocatus é dado durante todo o processo várias vezes um feedback aos “novos talentos”.

Por exemplo, na VdA estão previstos pelo menos dois momentos formais de avaliação e de feedback. “O estágio na VdA é rotativo e no final de cada rotação por área de prática, o estagiário é avaliado pelos sócios da respetiva área e pelo seu coach, estando também contemplado que no âmbito desta avaliação exista um momento de feedback com a liderança da área”, sublinhou Susana Miranda.

Também na PLMJ os estagiários são avaliados duas vezes a seguir à rotação por área, que dura cerca de um ano cada. “Trata-se de uma avaliação em tudo igual à dos advogados em estatutos mais avançados, em que é feita uma avaliação 360º, contemplando a componente técnica e também as competências de trabalho em equipa, e contributo para o escritório”, disse fonte oficial. Essa avaliação é feita por uma Comissão de Avaliação que integra advogados e é nomeado um avaliador-relator que reúne os feedbacks, integrando ainda os Recursos Humanos (RH).

Já na SPS, ao longo do período de estágio são realizadas reuniões de mentoria e desenvolvimento, nomeadamente na transição de fase de estágio e, no caso dos estágios rotativos, na passagem interdepartamental. “As reuniões são asseguradas pelo sócio responsável do RH, pelo sócio da equipa onde o estagiário está integrado e pelo responsável de RH”, disse Filipa Ruano Pinto.

A CMS considera que o feedback contínuo é “essencial” para o desenvolvimento e formação dos estagiários. Assim, o escritório liderado por José Luís Arnaut possui vários programas de acompanhamento e avaliação dos estagiários: o “Programa de Mentoring” e o “Processo de avaliação de desempenho”.

Segundo explicou a sócia, no “Programa de Mentoring” é atribuído logo no primeiro dia um mentor, que é um associado com mais senioridade e experiência, a cada estagiário. O objetivo é o de acompanhar de forma individualizada o estagiário na integração no escritório, no desenvolvimento do respetivo estágio e no alcançar dos seus objetivos de desenvolvimento individuais.

Já o segundo programa consiste na inclusão dos estagiários no processo de avaliação de desempenho, após seis meses de estágio. “Nesse âmbito, os nossos estagiários têm a oportunidade de fazer a sua autoavaliação e de transmitir a sua análise e visão sobre o estágio e sobre a sociedade, bem como, de receber feedback do seu estágio por parte de quem os avalia, ou seja, sócios e associados coordenadores.

Por sua vez, na Miranda o estágio está organizado em três rotações por áreas de prática distintas, uma das quais obrigatoriamente contencioso e arbitragem. Em cada uma dessas rotação é atribuído um mentor por estagiário, que fica responsável pelo seu acompanhamento durante essa rotação.

“No termo de cada uma das rotações o estagiário é avaliado, sendo essa avaliação realizada com base nos inputs da área e sob coordenação do respetivo mentor. De um ponto de vista prático, temos uma articulação muito próxima entre o Núcleo de Estágio e quer os estagiários, quer os mentores, que nos permite acompanhar o percurso dos estagiários ao longo da sua formação”, explicou a Miranda.

No momento da verdade, de decidir se um estagiário depois de ser aprovado na Ordem dos Advogados fica no escritório, quem decide varia de escritório para escritório e nunca envolve apenas uma pessoa.

“A decisão é tomada pelo Conselho de Administração da Morais Leitão, ponderado o percurso global do advogado estagiário e auscultados os que com ele ou ela trabalharam e contactaram, seja na estrutura profissional (os demais advogados), seja nas estruturas de suporte à gestão”, explicou Joana Almeida.

Também na VdA a decisão passa por “diversas mãos”, envolvendo membros da liderança do escritório que têm em consideração as avaliações obtidas ao longo do estágio, as necessidades de recursos em cada área de prática e a estratégia da firma em matéria de negócio e gestão de talento.

Tanto na PLMJ como na SPS e CMS, o convite pode partir dos sócios e sócios coordenadores das áreas por onde o estagiário passou, sendo depois aprovado pelos restantes pessoas competentes.

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