Operação Influencer. Quais as razões do juiz para libertar todos os arguidos?
O ECO teve acesso ao despacho da decisão das medidas de coação da Operação Influencer. Juiz de instrução considerou "prisão preventiva completamente desproporcional".
As medidas de coação propostas pelo Ministério Público – prisão preventiva – aos arguidos Lacerda Machado e Vítor Escária são “manifestamente desproporcionais” sobretudo à luz da pena que “previsivelmente pode vir a ser aplicada, não valendo aqui considerações genéricas ou estereotipadas” até porque a aplicação da prisão preventiva “não é compatível como uma pena de prisão antecipada”. E que só seria viável aplicar a prisão preventiva se “todas as outras medidas se mostrassem insuficientes”.
Os argumentos são do juiz de instrução Nuno Dias da Costa, da Operação Influencer, constantes no despacho das medidas de coação assinado pelo magistrado, a que o ECO teve acesso. Que vai mais longe ao escrever que o Ministério Público foi demasiado “conclusivo”, baseado em considerações “genéricas e vagas” no que toca a alguns factos do despacho de indiciação.
Nuno Dias Costa escreveu taxativamente que os indícios “não preenchem nem o tipo de corrupção passiva, nem o tipo de corrupção ativa” e que, “à luz da descrição factual” – feita pelo MP –, ” fica por preencher o elemento do tipo objetivo do tipo de crime de corrupção para a prática de um qualquer ato ou omissão”.
Mas disse que os arguidos Lacerda Machado e Escária “omitiram a verdadeira intervenção que tiveram, para o que agora releva, na situação relacionada com a implantação da fase ‘REST” do projeto da sociedade arguida Star Campus em Zona Especial de Conservação (ZEC)”.
Os cinco arguidos detidos ficaram todos sujeitos a medidas de coação não privativas da liberdade. A decisão do juiz de instrução Nuno Dias Costa – no chamado ‘Ticão’ apenas desde setembro – ficou muito aquém do pedido de promoção do Ministério Público (MP) que pedia prisão preventiva para Lacerda Machado e Vítor Escária, os dois homens próximos de Costa, caução de 100 mil e 200 mil para os administradores da Start Campus e a suspensão do mandato para o autarca de Sines, Nuno Mascarenhas.
Mais: na lista de crimes validados pelo juiz, a corrupção (ativa e passiva) e a prevaricação não constavam. Os cinco arguidos ficaram apenas indiciados por tráfico de influências e oferta indevida de vantagem. Mas isso não implica que o Ministério Público não ‘chame a si’ de novo os crimes. Ou seja: esta decisão do juiz serviu apenas para justificar a decisão das medidas de coação. O que implica que numa eventual acusação do MP, os crimes de corrupção e prevaricação podem voltar a estar na imputação aos arguidos.
A nota enviada pelo tribunal não menciona a indiciação de qualquer crime ao presidente da Câmara Municipal de Sines. O MP indiciou o autarca pelos crimes de corrupção passiva, quanto a titular de cargo político, agravado e um crime de prevaricação. O juiz explica que era a vereadora Filipa Faria quem tinha a competência para “proferir decisão” sobre o pedido de licenciamento urbanístico do data center que a Start Campus queria instalar em Sines. E diz que, quanto a Nuno Mascarenhas, “nenhuma consequência permite retirar para efeitos de enquadramento jurídico-penal”, diz o despacho.
Diogo Lacerda Machado e Vítor Escária ficaram apenas “fortemente indiciados”, em co-autoria e na forma consumada, de um crime de tráfico de influência, cada um. O Ministério Público fazia constar no despacho de indiciação quatro crimes: um de tráfico de influência, um de corrupção ativa quanto a titular de cargo político, agravado e dois crimes de prevaricação. No interrogatório, Lacerda Machado terá dito que nunca imaginou “que a amizade pudesse ser tão custosa para mim!”.
Por seu lado, entendeu que Afonso Salema e Rui Oliveira Neves estão indiciados em co-autoria de um crime de tráfico de influência e um crime de oferta indevida de vantagem. Já o MP considerou que estes estavam indiciados por sete crimes, cada um. Um crime de corrupção ativa quanto a titular de cargo político, agravado,
um crime de tráfico de influência, três crimes de prevaricação e dois crimes de recebimento ou oferta indevida de vantagem, quanto a titular de cargo público, agravado.
A decisão do juiz Nuno Dias da Costa
Esta segunda-feira, o juiz surpreendeu todos com a sua decisão. Diogo Lacerda Machado, amigo do primeiro-ministro, ficou sujeito a uma caução de 150 mil e a não se ausentar para o estrangeiro, devendo entregar o respetivo passaporte no prazo de 24 horas.
Vítor Escária, ex-chefe de gabinete do primeiro-ministro, ficou sujeito a não se ausentar para o estrangeiro, devendo entregar o respetivo passaporte em 24 horas.
O presidente da Câmara Municipal de Sines, Nuno Mascarenhas, e os administradores Rui Oliveira Neves e Afonso Salema, ambos da empresa Start Campus, ficaram submetidos apenas a Termo de Identidade e Residência (TIR), a medida de coação menos gravosa e a que todos estão sujeitos a partir do momento que são arguidos, seja porque que crime for.
A empresa Start Campus, que é arguida no processo, ficou de prestar uma caução no valor de 600 mil euros no prazo de 15 dias. Ministério Público tinha pedido uma caução no valor de 19,5 milhões de euros.
Do que se trata a investigação?
Esta investigação tornou-se pública com a operação realizada na passada terça-feira pelo MP, que envolveu mais de 40 buscas e levou à detenção de cinco pessoas.
No total, há nove arguidos no processo, incluindo o ministro das Infraestruturas, João Galamba, o presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta, o advogado, antigo secretário de Estado da Justiça e ex-porta-voz do PS, João Tiago Silveira, e a empresa Start Campus.
O processo está relacionado com a exploração de lítio em Montalegre e de Boticas (ambos distrito de Vila Real), com a produção de energia a partir de hidrogénio em Sines, Setúbal, e com o projeto de construção de um centro de dados (Data Center) na zona industrial e Logística de Sines pela sociedade Start Campus.
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