Advocacia, uma profissão em risco de burnout
A advocacia é uma profissão chave para o funcionamento da sociedade, e como tal, o compromisso com o bem-estar dos seus praticantes é igualmente fundamental.
O mundo jurídico, notoriamente exigente e regularmente visto como um baluarte da racionalidade, está sob o cerco do burnout. Esta realidade, frequentemente subestimada ou negligenciada, é cada vez mais evidente entre advogados e juristas. A maioria dos profissionais de Direito considera que o trabalho é duro e acarreta uma carga de trabalho esmagadora, levando a horas de trabalho sobre-humanas, ao mesmo tempo que exige um rigor absoluto. Contudo, e apesar do pragmatismo a que a profissão obriga, navegamos num turbilhão de emoções, de altos e baixos, e numa busca incessante por resultados – e clientes. A recompensa? Defender os interesses das pessoas. Afinal, temos as suas vidas nas mãos. Mas, então, as questões que se colocam são: quem defende os nossos interesses quando precisamos? O que fazer quando a concentração, eficiência e produtividade nos falham, e caem como peças de dominó? A quem recorrer quando percebemos que não somos máquinas, mas meros mortais, e as emoções tomam conta de nós? Como é que a comunidade jurídica pode lidar com esta crise?
Para responder a estas perguntas, importa olhar para o primeiro estudo sobre o bem-estar da comunidade jurídica portuguesa, que aborda, de forma clara, alguns desafios enfrentados por estes profissionais. Até à data, o discurso era abafado tanto por presunções como por suposições, mas agora podemos deixar os “achismos” para trás e analisar os factos. Os números não mentem e os recentes resultados revelaram-se preocupantes, com 39% dos inquiridos a apresentarem sintomas clínicos de depressão, outros 51% sintomas significativos de ansiedade e um terço com níveis de burnout superiores à média da população portuguesa.
Os dados não fazem correlações, mas certamente que a cultura de longas horas de trabalho, os casos emocionalmente desgastantes e a difícil conciliação entre a vida profissional e pessoal contribuirão para esta tensão. O estudo revelou ainda que 55% dos advogados e juristas portugueses sentem que a sua profissão os impede de participar em atividades familiares. Ora, é fundamental ter uma boa rede de apoio e, para isso, é necessário cultivar os laços familiares e de amizade, daí a importância de ter uma vida social ativa. Está na hora de abordar estas questões de frente que se têm tornado antagónicas nas vidas pessoais dos advogados e juristas, e criar um ambiente onde o seu bem-estar seja uma prioridade.
Para tal, é fundamental abordar o tema e consciencializar os profissionais, bem como as organizações. Estas, ao disponibilizarem recursos de sensibilização, educação ou mesmo aconselhamento clínico, podem proporcionar benefícios ao nível do bem-estar, promovendo uma cultura de apoio e divulgação da importância da saúde mental para que estes possam procurar ajuda sem receio de estigmatização. Em paralelo, a gestão do tempo e dos prazos devem ser regularmente revistas para evitar sobrecarga.
Admitir que perturbações de saúde mental como o burnout, ansiedade e depressão são desafios reais é o primeiro passo para a mudança e as organizações detém o poder para tal. Embora haja algumas a envergar por este caminho – um sinal de que a comunidade jurídica está a despertar para a necessidade de agir – ainda temos um longo caminho a percorrer.
A advocacia é uma profissão chave para o funcionamento da sociedade, e como tal, o compromisso com o bem-estar dos seus praticantes é igualmente fundamental. Só mediante esforços coletivos é que a comunidade jurídica pode esperar prosperar sem sacrificar a saúde mental dos seus membros. Vamos, então, assumir o compromisso de cuidar daqueles que cuidam dos outros, criando um futuro mais saudável para todos. Afinal de contas, a saúde mental não é um luxo, é uma necessidade.
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