“Ministério da Agricultura ainda não pagou 20 milhões” dos apoios no âmbito do IVA zero, alerta Luís Mira

Termina hoje a campanha para os agricultores pedirem o apoio à seca. Apoio é 5% do que Espanha atribuiu em setembro. Luís Mira, secretário-geral da CAP, teme que muitos fiquem de fora.

Os agricultores portugueses ainda esperam o pagamento de 20 milhões de euros do apoio acordado no âmbito do IVA zero para compensar o aumento dos fatores de produção, denuncia o secretário-geral da Confederação dos Agricultores de Portugal, em entrevista ao ECO. Luís Mira tece duras críticas às decisões que foram tomadas pelo Executivo para o setor agrícola e alerta para a inação na resolução do problema da seca em Portugal.

A medida do IVA zero “tinha duas partes”, explica. “Uma, a descida do IVA para os consumidores. Essa foi útil porque se repercutiu imediatamente. A descida, ao longo dos meses, foi até superior a 6%. A outra parte era a compensação pelo aumento dos fatores de produção”, recorda Luís Mira. “Deu uma ajuda”, reconhece, mas “a verba não era muito grande – 180 milhões de euros – face ao que outros países tinham dado relativamente ao problema do aumento dos fatores de produção”.

“Foi pouco, mas ajudou”, reiterou. “Pena é que o Ministério da Agricultura, à data de hoje, ainda não pagou 20 milhões de euros”, denuncia. “Isto acaba sempre por ser atrasado, acaba sempre por não serem as compensações processadas na altura em que fazem falta”, lamenta o responsável.

Questionado se hoje teria pedido uma compensação maior para os agricultores, Luís Mira recorda que os 180 milhões resultaram de uma negociação, cujo resultado foi determinado por uma grande manifestação em Évora “contra a política do Governo e contra a ministra da Agricultura”. Uma oposição tão forte que implicou a ausência de Maria do Céu Antunes da assinatura do acordo que operacionalizou o IVA zero.

A medida termina a 4 de janeiro, para dar tempo aos retalhistas para etiquetar os produtos com os novos preços, mas o secretário-geral da CAP acredita que poderia ser prolongada, caso o Executivo assim o desejasse.

“Não é uma questão temporal”, mas sim de “o Governo prescindir num cabaz de produtos básicos dessa receita fiscal”, diz Luís Mira. “É de receita fiscal que estamos a falar. O Estado, que teve um excedente”, “que injetou 3.200 milhões na TAP para nunca mais os ver”, “tem de dizer: ‘nestas circunstâncias, vamos ajudar os nossos cidadãos e vamos proporcionar um preço mais reduzido prescindindo dessa receita fiscal’. Não foi essa a opção do Governo”, remata.

Luís Mira, secretário-geral da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), em entrevista ao ECO - 20DEZ23
Luís Mira, secretário-geral da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), em entrevista ao ECOHugo Amaral/ECO

O responsável reconhece que esta “é uma questão extremamente discutível”, porque “não é uma medida dirigida”, “é igual para todos os consumidores, e, portanto, é uma medida cega”. Algo criticado pelas instituições internacionais que defendem que as medidas de apoio deveriam ser direcionadas para as camadas mais necessitadas da população.

Mas em termos de compensação dos fatores de produção, algo feito em “linha [com o] que espanhóis e franceses fizeram, justificava-se naquela altura”, frisa. “Agora justifica-se que nos sejam dadas as mesmas condições”, defende.

“Neste momento, está a decorrer uma campanha para que os agricultores solicitem o apoio à seca. Só que esse apoio é 5% daquilo que os espanhóis atribuíram aos seus agricultores. E os espanhóis já receberam este montante em setembro e nós ainda agora é que nos estamos a candidatar”, critica Luís Mira.

Milhares de agricultores, especialmente os pequenos, não vão ter acesso a esta ajuda”, afirma, porque não sabem da existência do período de candidaturas. “Entre 14 e 28 de dezembro não é a melhor altura para se fazer um período de pedidos para esta situação”, critica, lamentando que os agricultores portugueses estejam em desvantagem “face às medidas e às circunstâncias que são criadas aos concorrentes”. “Foi um ano terrível”, garante.

Ao nível do Portugal 2020, o quadro comunitário que agora termina, o Programa Operacional do Desenvolvimento Rural (PDR2020) é o que apresenta piores níveis de execução Mas também foi alvo de um reforço de dotação para assegurar a transição entre quadros comunitários. “Chamo a atenção e alerto para essa questão há mais de quatro anos”, diz. “A última vez que olhei para os números ainda estavam 1.005 milhões de euros por executar/pagar. O tempo não para. Temos um ano e meio para fazer essa execução”, recorda. “Não vejo sinais de mudança, mas não quero sequer admitir que Portugal não vai utilizar essas verbas”, afirma o secretário-geral da CAP.

Além da questão dos apoios, Luís Mira defende que os agricultores portugueses têm de ter condições para exercer a sua atividade, nomeadamente água. “O turismo, se não houvesse aeroportos para trazer os turistas cá, se não houvesse estradas, como é que fazia? A agricultura está na mesma. A água é um fator determinante para se ser competitivo e produtivo num país mediterrânico como o nosso. E não há investimentos sem ser o Alqueva nos últimos 50 ou 60 anos”, lamenta. “Uma rede nacional de distribuição de água era fundamental”, defende o secretário-geral da CAP, reiterando que o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) “foi uma oportunidade totalmente perdida” por não ter investimentos previstos a este nível, a não ser a barragem do Crato.

O facto de Portugal ser líder na cortiça, ter uma produção de tomate para concentrado de qualidade, ter dos melhores vinhos do mundo e a produção de azeite estar a crescer, não se deve a decisões políticas, mas ao esforço dos empresários e agricultores, defende Luís Mira que não poupa farpas “às decisões ideológicas” do Executivo de António Costa que apenas servem os “seus objetivos políticos e partidários”.

Limitar a área de plantação de eucalipto, retirar os apoios ao olival na zona do Alqueva ou extinguir as Direções-gerais de agricultura, para concentrar as suas competências nas CCDR, são algumas das medidas condenadas por Luís Mira. “O país não se governa com ideologias que não tenham como objetivo melhores condições de vida para todos. Queremos criar mais riqueza ou não? Queremos ser um país mais próspero? Não creio que a questão tenha sido essa”, remata.

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