Banco de Portugal tem mil milhões em risco na dívida pública
Se tivesse de vender a dívida pública portuguesa que comprou perderia mil milhões de euros. O risco de isso acontecer existe, mas ter ou não de pagar essa fatura está nas mãos do BCE.
A perda potencial com os títulos de dívida pública adquiridos pelo Banco de Portugal (BdP) atingiu os 1.092 milhões de euros em 2016. São mais 964 milhões de euros face ao estipulado em 2015, ano em que se iniciou o programa de compra de ativos do setor público (PSPP) do Banco Central Europeu (BCE) através do qual Carlos Costa já comprou 21.357 milhões de euros de dívida portuguesa. No entanto, o reforço das provisões para riscos gerais constituídas para este programa diminuiu em 280 milhões de euros.
Um dos riscos destes títulos de dívida pública, segundo a metodologia do Eurosistema seguida pelo Banco de Portugal, são as variações do valor de mercado. A carteira do Banco de Portugal relativo ao PSPP duplicou de um ano para o outro, mas a diferença entre o custo amortizado (valor da compra) e o valor de mercado aumentou muito mais — cerca de 8,5 vezes.
Ou seja, entre 2015 e 2016, os ativos do PSPP passaram de 10.104 milhões de euros para os 21.357 milhões de euros. Mas a diferença entre o custo amortizado e o valor de mercado passou de uma perda potencial de 128 milhões de euros para uma perda potencial de 1.092 milhões de euros, caso a dívida fosse vendida de imediato.
O mesmo é dizer que a carteira de títulos de dívida pública portuguesa detida pelo Banco de Portugal vale neste momento, no mercado secundário, menos mil milhões de euros face ao valor da sua aquisição. Esta perda potencial disparou fruto da subida dos juros da dívida nacional ao longo do último ano, levando à perda de valor das obrigações do Tesouro. A título de exemplo, os títulos a dez anos registaram uma desvalorização de 6,5% nesse período.
Existe a possibilidade, neste momento, de o BCE decidir interromper o programa de compras e obrigar os bancos centrais a venderem uma parte das suas carteiras em mercado, o que poderá trazer prejuízos para o Banco de Portugal. As provisões para riscos gerais são utilizadas, por isso, em parte, para cobrir esse risco potencial. A incógnita passa assim por saber se e como é que o BCE vai “desfazer” o seu programa de estímulos.
Este risco, se consumado, será absorvido por inteiro pelo BdP uma vez que estes títulos são de risco não partilhado. Ou seja, ao contrário de outros títulos de política monetária de risco partilhado (em que o BdP responde pela sua chave de capital, que ronda os 2,5%, em conjunto com os outros bancos centrais da Zona Euro), a responsabilidade da dívida adquirida ao abrigo do PSPP é toda do banco central nacional — estes ativos representam agora 40% do total da carteira. Contudo, se esses ativos de política monetária se mantiverem no balanço do banco até à sua maturidade, esse risco reduz-se consideravelmente.
Para além deste risco de menos-valias com uma venda antecipada a preços atuais de mercado, existem outros riscos ponderados, segundo uma metodologia do Eurosistema, onde se inclui o perigo para as contas do BdP de o custo de financiamento (atualmente a 0%) ser superior face ao rendimento destes títulos adquiridos. Este indicador de risco, calculado através de uma matriz de risco fornecida pelo BCE para tornar o processo mais objetivo, teve como resultado em 2016 uma subida desse risco menor face ao projetado em 2015.
Isso traduziu-se num reforço de provisionamento 58,3% inferior (-280 milhões de euros) àquele que tinha sido executado em 2015, o que em parte justificou a entrega de mais dividendos ao Estado do que o previsto. Em 2015 tinham sido constituídas provisões dedicadas especificamente ao PSPP na ordem dos 480 milhões de euros. Um ano depois esse reforço foi de 200 milhões de euros.
A cobertura foi feita pelo mínimo dada a especificidade do ativo e a informação privilegiada, motivos que poderão indicar que a expectativa é a de que o BCE conserve uma parte importante dos ativos do PSPP até à sua maturidade nos balanços dos bancos centrais.
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