Economia robusta pode adiar corte de juros da Fed
Apesar da descida da inflação, a atividade económica e o mercado de trabalho continuam sólidos nos Estados Unidos, pelo que a Fed deverá evitar o compromisso com o corte de juros já em março.
A Reserva Federal dos Estados Unidos (Fed) surpreendeu na reunião de 13 dezembro ao sinalizar uma inversão da política monetária, abrindo a porta a descidas de juros já em março. A descida da inflação e os sinais de abrandamento da economia deram confiança ao presidente Jerome Powell para efetuar um discurso inesperadamente suave.
Seis semanas depois, o Comité de Política Monetária da Fed (FOMC, na sigla em inglês) enfrenta o dilema de continuar a apontar para descidas de juros no curto prazo, colocar um travão nas expectativas de cortes já em março, ou deixar tudo em aberto para a próxima reunião. A única certeza é que vai manter as Fed Funds no intervalo de 5,25%-5,5%, o que corresponde ao nível mais elevado desde a crise financeira de 2008.
Depois da reunião de dezembro foram publicados uma série de indicadores que podem levar a Fed a adotar uma postura mais cautelosa. Isto porque a atividade económica persiste bastante robusta, o mercado de trabalho a crescer a bom ritmo e a tendência de alívio da inflação abrandou.
O PIB dos Estados Unidos cresceu a um ritmo anual de 3,3% no quarto trimestre, bem acima das expetativas dos economistas (2%), embora a abrandar face ao terceiro trimestre (4,9%). Apesar da inflação elevada e subidas de juros, o consumo das famílias continua a crescer a bom ritmo. No conjunto de 2023, a economia cresceu 2,5%, acima dos 1,9% do ano anterior, um desempenho surpreendente tendo em conta que a esmagadora maioria dos economistas apontava para uma recessão na maior economia do mundo devido à subida agressiva de juros.
A evolução do mercado de trabalho também valida a ideia de que a maior economia do mundo continua bem distante de uma recessão. Foram criados 216 mil empregos em dezembro, acima do esperado por todos os economistas. Em 2023, os Estados Unidos criaram 2,7 milhões de postos de trabalho, o que representa uma média mensal acima de 200 mil.
Um crescimento saudável da atividade económica e um mercado de trabalho sólido não combinam com alívio da inflação. Os últimos dados sobre a evolução dos preços parecem apontar nesse sentido. O índice de preços no consumidor cresceu a um ritmo anual de 3,4% em dezembro (três décimas acima de novembro), sendo que a inflação subjacente (exclui alimentos e energia) baixou uma décima (3,9%) para mínimos de maior de 2021. O indicador preferido da Fed para medir a inflação, publicado na semana passada, ficou abaixo dos 3% pela primeira vez desde 2021.
Investidores ainda acreditam em março e economistas apontam a junho
Os investidores chegaram a atribuir uma probabilidade em redor de 90% a um corte de juros da Fed a 20 de março, mas os últimos indicadores motivaram um recuo de expectativas. A probabilidade de redução na próxima reunião é agora inferior a 50%, com os investidores a mostrarem maior confiança num corte a 1 de maio (perto de 90%).
Entre os economistas as expectativas são mais cautelosas. Uma sondagem da Reuters mostra que o consenso (86 entre 123 economistas) aponta para que a Fed espere pelo segundo semestre para iniciar o ciclo de descida de juros, com junho a ser mais provável que maio (55 contra 31).
A média das estimativas desta sondagem da Reuters dá conta que as Fed Funds estarão em 4,25%-4,50% no final do ano, o que implica quatro cortes de 25 pontos base ao longo de 2024. Os investidores estão mais agressivos, descontando cinco a seis descidas de juros em 2024, como é possível constatar através da ferramenta FedWatch da CME (imagem em baixo). Na reunião de dezembro, os responsáveis da Fed sinalizaram apenas três cortes este ano.
Os economistas divergem no timing em que a Fed vai começar a baixar os juros, mas existe um consenso de que para garantir um abrandamento suave da economia, o banco central vai começar em breve a aliviar a política monetária, tirando partido da tendência descendente da inflação.
A Capital Economics assinala a dificuldade em reconhecer qual o desenvolvimento mais notável. Se a aceleração do crescimento da economia em 2023, ou a descida da inflação para 2% tendo em conta a anualização dos dados do segundo semestre. “Chegou a altura de os responsáveis da Fed declararem vitória e começarem a reduzir em breve a restritividade da política monetária”, refere o economista Andrew Hunter.
O Wells Fargo estima o primeiro corte de juros a 1 de maio e vê a reunião desta quarta-feira como uma oportunidade para a Fed “ganhar tempo para discernir se a inflação está mesmo num rumo sustentável em direção aos 2%” e gerar consenso de que “estão reunidas as condições para aliviar a política monetária”.
O ING também aponta a maio, assinalando que após dois trimestres de inflação a um ritmo anualizado de 2%, “será uma questão de tempo antes de a Fed avançar com cortes de juros”. Os economistas deste banco dos Países Baixos veem “riscos descendentes para a atividade económica nos próximos trimestres, face ao que é o consenso do mercado”, estimando que a taxa de juro baixará para 3,75%-4,00% no final do ano.
A Schroders estima o primeiro corte só em junho, considerando que “a política monetária está a ficar demasiado restritiva”, tendo em conta que “crescimento económico deverá abrandar e o mercado de trabalho normalizar este ano”, ao mesmo tempo que a inflação modera. “Tendo em conta o desfasamento do impacto da política monetária, a Fed não se por dar ao luxo de esperar pela confirmação de que venceu a batalha contra a inflação”, refere o economista George Brown. A Schroders espera cortes em todas as reuniões seguintes, até os juros atingirem nível neutral em torno dos 3,5%.
Allianz Global Investors só prevê cortes de juros na segunda metade do ano, pois o “crescimento permanece surpreendentemente sólido”. O diretor global de investimentos em obrigações, Franck Dixmier, considera que “é prematuro para a Fed contemplar uma mudança na sua política monetária”, pelo que não espera que o banco central “apresente um calendário definitivo para o seu primeiro corte nas taxas de juro”.
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