AD admite governar com Orçamento de Costa até final do ano

Montenegro disse, em novembro, que "com certeza" apresentará um retificativo caso ganhe. Cenário de maioria relativa e impacto das medidas fiscais só a partir de 2025 podem levar a repensar opção.

A Aliança Democrática (AD), coligação que junta PSD, CDS e PPM, já admite governar com o Orçamento do Estado para 2024, da maioria absoluta socialista, caso vença as legislativas de 10 de março. Há três meses, o presidente do PSD, Luís Montenegro, garantia que iria avançar com um retificativo. Rui Baleiras, coordenador da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), considera, aliás, que “é possível encontrar folga no Orçamento do Estado para 2024, já aprovado, para acomodar novas medidas”, isto é, sem correções ao documento atual, que está em vigor.

A 9 de novembro, no dia em que o Presidente da República anunciou que iria dissolver o Parlamento e convocar eleições antecipadas, na sequência da demissão do primeiro-ministro, o presidente do PSD, Luís Montenegro, afirmou que “com certeza” apresentará um Orçamento retificativo se ganhar os votos dos portugueses.

De lá para cá, o volume da “certeza” baixou e até emudeceu. No PSD, já ninguém quer falar de um eventual Orçamento retificativo, porque cria ruído e confusão na campanha que está prestes a arrancar, segundo apurou o ECO. O tiro de partido para as caravanas dos partidos arrancarem é dado no domingo, 25 de fevereiro.

Por outro lado, são agora várias as peças do xadrez que é preciso ter em conta. É muito pouco provável uma maioria absoluta de PS ou da AD no pós 10 de março. O cenário político tem de entrar na equação, assim como a evolução da economia. O Programa de Estabilidade vai ser atualizado para ser enviado a Bruxelas, em abril.

Para além disso, as medidas que constam no programa eleitoral da AD com maior impacto orçamental, como a redução de impostos, em IRS e IRC, ou o descongelamento da carreira dos professores, só vão começar a pesar nas contas a partir de 2025. Eventualmente o plano de emergência na saúde, que Montenegro quer colocar de pé nos primeiros 60 dias de Governo, poderá necessitar de ajustes orçamentais. Mas só se violar a norma travão, que impede que a assunção de despesas ultrapasse o que está orçamentado, é que a AD terá de apresentar um retificativo. Contudo, este não “um compromisso eleitoral”, ouve-se nos corredores sociais-democratas.

Mas antes destas contas, é preciso primeiro saber qual o resultado eleitoral. Se a AD não conseguir uma maioria estável à direita, com a Iniciativa Liberal (IL) e sem o Chega, isto é, com autonomia para aprovar orçamentos de Estado, teria que negociar com o PS. O que significaria ficar vulnerável a um chumbo provável dos socialistas em conjunto com a restante esquerda.

Pedro Nuno Santos admite viabilizar Governo minoritário da AD, mas depois recua

O cenário político de uma vitória relativa da AD com um programa de Governo aprovado com a ajuda do PS, através da abstenção, foi lançado para cima da mesa pelo secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, no último frente a frente com Luís Montenegro, que foi transmitido na passada segunda-feira pelas três televisões generalistas: RTP, SIC e TVI.

“Quero aqui deixar claro que o PS, se não ganhar, por humildade democrática, o PS não apresentará uma moção de rejeição nem viabilizará uma moção de rejeição, se houver uma vitória da AD, que esperamos que nunca aconteça“, defendeu Pedro Nuno Santo no debate televisivo.

Mas o secretário-geral do PS avisou, também, que não vai dar aval a Orçamentos do Estado da AD que não conhece, sublinhando que a tomada de posição dos socialistas vai depender das “soluções” apresentadas, sendo que as duas formações partidárias têm “visões muito diferentes”. “Quanto aos Orçamentos do Estado, o pior serviço que podíamos prestar à nossa democracia era fazermos um negócio sobre um documento que não é conhecido, era fechar um acordo para Orçamentos do Estado que não conhecemos”, afirmou no mesmo espaço de debate.

Acusando Montenegro de manter “o tabu” pelo facto de o líder do PSD não revelar se dá ou não a mão ao PS, caso os socialistas vençam as legislativas sem maioria estável, Pedro Nuno Santos acabou por dar o dito pelo não dito.

“O PS foi claro naquilo que está disponível para fazer, foi o único que foi claro e já disse o que fará se não obtiver esse resultado. Não havendo essa reciprocidade, o PS sente-se desobrigado“, afirmou esta quarta-feira, dois dias depois de ter garantido que viabilizaria um Executivo minoritário da AD.

O presidente do PSD está em silêncio e assim se manterá sobre um futuro em que perca as eleições, porque o passo seguinte é abandonar o partido que o obriga a ganhar. Nesse cenário, será outro líder social-democrata a decidir se deixa passar um Governo minoritário, chefiado por Pedro Nuno Santos, caso seja esse o desenlace das eleições.

A atualização do cenário macroeconómico de Portugal para 2024-2028 no Programa de Estabilidade que terá de ser entregue a Bruxelas em abril, também poderá a influenciar a decisão de avançar ou não com um retificativo. As contas públicas estão saudáveis, com a perspetiva de um excedente de 0,2% para este ano, ainda assim abaixo do saldo positivo de 0,8% de 2023, e a dívida pública tem mantido uma trajetória descendente até mais ambiciosa do que o previsto, devendo ficar, já no final deste ano, em 95% do PIB. Mas o crescimento económico tem abrandado significativamente, tendo passado de 6,8%, em 2022, para 2,3%, em 2023.

Por outro lado, a curta janela temporal entre a apresentação de um retificativo e o Orçamento de Estado para 2025 não é favorável a mexidas no plano orçamental para este ano. O novo Governo deverá tomar posse em abril/maio, depois é preciso aprovar o programa do Executivo na Assembleia da República. Entre este momento e a entrega da proposta do Orçamento do 2025, em outubro, há apenas um hiato de três meses, tirando as férias parlamentares durante agosto.

Ainda assim, e se apenas for necessário mudar algumas rubricas no Orçamento de 2024, o processo deverá ser ágil e rápido, não conflituando com a discussão e aprovação do Orçamento para 2025.

UTAO descarta necessidade de retificativo

Em relação às medidas com verdadeiro impacto orçamental da AD, nomeadamente a redução de impostos em IRS e IRC, aumento do complemento solidário para idosos (CSI) e descongelamento gradual da carreira dos professores (seis anos, seis meses e 23 dias) que, no conjunto e ao longo da legislatura, deverão custar 7.240 milhões de euros só vão começar a pesar nos cofres do Estado a partir de 2025. Ou seja, não é por esta via que há necessidade de um retificativo.

Eventualmente, o plano de emergência que Luís Montenegro quer implementar nos primeiros dois meses de Governo para acabar com a listas de espera no Serviço Nacional de Saúde (SNS) poderá implicar um acréscimo de despesa para além da margem orçamental, obrigando a um orçamento retificativo.

Nesse programa, a AD quer atribuir um voucher para consultas e cirurgias de especialidade quando os tempos de espera ultrapassarem os prazos máximos previstos, e encurtar os prazos das consultas de medicina familiar, através da implementação da “teleconsulta e da atribuição de um enfermeiro e um médico de família a todos os portugueses, recorrendo, para isso, aos profissionais do SNS, aposentados que estejam interessados e também à capacidade do setor privado e social”, revelou Montenegro há um mês durante a convenção da AD.

Mas o programa pode ser lançado e os pagamentos aos privados só arrancarem em 2025, afastando assim a necessidade de um retificativo. Mesmo que a fatura tenha de ser liquidada já este ano, o coordenador da UTAO, Rui Baleiras, afirmou ao ECO que “é possível encontrar folga no Orçamento do Estado para 2024, já aprovado, para acomodar novas medidas”.

“Deixa-se de executar determinadas medidas para executar outras, transferindo verbas entre rubricas. Há muita flexibilidade orçamental no ano corrente”, defendeu o responsável pela unidade apoio aos trabalhos parlamentares.

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