Lucília Gago pode ser chamada ao Parlamento? Sim, desde 2000 que todos os ex-PGR foram

Aguiar-Branco defende que Lucília Gago deve ir ao Parlamento dar explicações. A acontecer, será caso único? Já anteriores PGR foram ao Parlamento prestar contas? Sim, todos.

O presidente da Assembleia da República José Pedro Aguiar-Branco fez saber, esta sexta-feira, que a Procuradora-Geral da República, Lucília Gago, deve ir ao Parlamento dar explicações sobre os processos que provocaram crises políticas, referindo-se implicitamente à Operação Influencer e às suspeitas de corrupção na Madeira. Em declarações à Antena 1, José Pedro Aguiar-Branco disse que Lucília Gago deveria falar para “que não se crie um clima de suspeição”.

“Qualquer um de nós não quer acreditar que haja uma conduta premeditada para à esquerda ou à direita provocar um determinado facto político por via de um investigação criminal, mas a verdade é que ninguém vive sozinho no mundo e é preciso ser explicado, porque se for explicado e se a situação ao ser explicada torna claro que a suspeição não existe, eu acho que estamos a contribuir para que esses dois mundos convivam de uma forma mais saudável para a democracia”, disse.

Quer a Operação Influencer, quer a alegada corrupção na Madeira resultaram nas demissões de António Costa, ex-primeiro ministro e de Miguel Albuquerque, líder do executivo regional da Madeira.

Perante estas declarações, o PCP, Livre e PAN defenderam essa audição da PGR no Parlamento, hipótese que o Chega considerou inadequada.

Contactada pelo ECO/Advocatus, fonte do gabinete de Lucília Gago não deu qualquer resposta relativamente à disponibilidade da PGR em ir ao Parlamento.

Segundo o regulamento da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, nada impede que a Procuradora-Geral da República seja chamada a prestar contar na Assembleia da República, mas Lucília Gago pode recusar-se a responder, porque não está numa Comissão de Inquérito, invocando o segredo de Justiça a que ambas as investigações estão sujeitas. Em declarações ao Observador, Souto Moura, antigo Procurador-Geral da República, defendeu que “um procurador pode ser convidado a esclarecer, mas não é obrigado a esclarecer. Não é não responder, é dizer que não pode responder, invocando o segredo de justiça”, rematou.

A acontecer, será caso único? Já anteriores procuradores-gerais da República foram ao Parlamento prestar contas em relação a casos concretos? A partir de 2000, sim, todos. Incluindo a comissões de inquérito. Recordamos quem e por que razões.

José de Souto Moura (mandato de 2000 a 2006)

Dezembro 2005

Corria o ano de 2005, com o processo Casa Pia a ocupar páginas de jornais, a título diário. Na altura, os advogados de defesa e de acusação do processo Casa Pia mostraram-se contra a audição, no Parlamento, do procurador-geral da República (PGR), Souto Moura, requerida pelo PS e aprovada pelos deputados do PSD e BE. Ma explicar-se o magistrado acabou por ir justificar-se perante os deputados.

O PS quis questionar Souto Moura na Comissão dos Assuntos Constitucionais sobre as alegadas falhas que existiram na investigação do processo de pedofilia da Casa Pia. A audição, como quase todas, foi à porta fechada.

Janeiro 2006

No final do mandato, Souto Moura volta a ser ouvido no Parlamento sobre os registos telefónicos de altas figuras do Estado incluídos no processo Casa Pia, tendo sido forçado a dizer que a investigação acerca do caso ainda não estava concluída.

“A investigação vai continuar”, disse Souto Moura depois da audiência de cerca de 25 minutos que também teve com o Presidente da Republica, Jorge Sampaio, a quem foi apresentar “um conjunto de elementos” já apurados pelo Ministério Público.

A audiência no Palácio de Belém, solicitada pelo PGR, ocorreu seis dias depois do presidente Jorge Sampaio ter pedido que as averiguações acerca dos registos telefónicos incluídos no processo Casa Pia estivessem “concluídas a curtíssimo prazo”.

Fevereiro de 2011

Já como ex-procurador-geral da República Souto Moura, foi ao Parlamento para esclarecer que seguimento foi dado pelo Ministério Público às conclusões da última comissão de inquérito à queda do avião onde morreu Sá Carneiro, nos anos 80, em Camarate.

O deputado social-democrata Campos Ferreira considerou que a audição do antigo PGR é a «diligência das diligências», já que, depois de entregues as conclusões da oitava comissão de inquérito, que concluiu pela ocorrência de um atentado, o «Ministério Público decidiu não fazer as diligências que deviam ter sido feitas».s conclusões da oitava comissão e as guardou na gaveta».

Pinto Monteiro (mandato de 2006 a 2012)

Dezembro 2008

No final de 2008, o Procurador-Geral da República da altura, Fernando Pinto Monteiro, foi ao Parlamento falar sobre as investigações ao Banco Português de Negócios (BPN), na sequência de um requerimento entregue pelo PS.

O líder parlamentar dos socialistas, à data, Alberto Martins, justificou o pedido de audição do PGR, explicando que “os factos graves que conduziram à nacionalização do BPN e que lesaram o interesse nacional não podem deixar de ser alvo de uma investigação criminal célere, profunda e consistente, que responsabilize civil e criminalmente os responsáveis por essa situação”.

O Procurador-Geral da República, Pinto Monteiro, durante a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias na Assembleia da República, em Lisboa, 2 de outubro de 2012.

Março de 2010

Neste caso, foi o próprio Pinto Monteiro que manifestou disponibilidade para ser ouvido na comissão parlamentar de inquérito destinada a averiguar o alegado envolvimento do Governo na intenção de compra da TVI pela PT. Dando por “esclarecidas” as controvérsias relativas ao processo Face Oculta, Pinto Monteiro declarou que, em relação ao negócio PT/TVI, iria “com todo o gosto” à AR. A comissão foi pedida por sociais-democratas e bloquistas de forma a averiguar o alegado envolvimento do primeiro-ministro José Sócrates na intenção da PT de comprar a TVI.

Março de 2011

Pinto Monteiro foi ouvido no Parlamento devido à célebre entrevista em que insinuava que o seu telefone poderia estar sob escuta, já que de vez em quando ouvia “uns barulhinhos estranhos” no mesmo.

O pedido foi feito pelo PSD. Na altura, o presidente da bancada parlamentar social-democrata, Miguel Macedo, criticava o Governo, afirmando que se este “tivesse sentido de Estado teria imediatamente chamado à presença do seu ministro da Justiça e o PGR para esclarecer esta afirmação gravíssima”.

À data, Sócrates afirmou não ter conhecimento de nenhuma escuta ilegal, considerando que o PGR não deixará de exercer as suas competências caso isso se verifique, declarações que o líder parlamentar do PSD considerou deixarem “no ar a ideia de que pode efetivamente haver escutas ilegais”.

Joana Marques Vidal (mandato de 2012 a 2018)

Março de 2019

Joana Marques Vidal, a antecessora de Lucília Gago, em 2018, não poupou críticas à atitude da Polícia Judiciária Militar (PJM) no inquérito ao furto de Tancos, principalmente a rem relação ao “reaparecimento” do material militar. Numa análise, que admitiu carecer ainda de um “estudo aprofundado”, questionou mesmo a necessidade da existência desta polícia.

Ouvida na Comissão Parlamentar de Inquérito, a ex-procuradora recordou a sua surpresa quando soube, por um comunicado da PJM, dia 18 de outubro de 2018, que tinham sido recuperadas as armas, roubadas dos paióis cerca de quatro meses antes, na sequência de investigações em curso. “A partir do momento em que a competência da investigação era do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), coadjuvado pela PJ, a PJM não tinha competência para fazer qualquer diligência de investigação sem comunicar ao MP e à PJ. Esse comunicado denota alguma leitura não adequada da PJM em relação à lei e das suas obrigações face ao ocorrido”.

Lucília Gago (mandato iniciado em outubro 2018 )

Fevereiro 2020

Até a atual esteve prestes a ser ouvida no Parlamento mas a audição da procuradora-geral da República acerca da diretiva sobre poderes hierárquicos no Ministério Público (MP), acabou por ser chumbada. Foi apenas ouvido o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público e o ex-PGR, Cunha Rodrigues. Os requerimentos vieram do Iniciativa Libera (IL), CDS e Chega para que ouvir Lucília Gago, mas foram reprovados, nessa parte, com os votos do PS e a abstenção do PCP e da deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.

A polémica em torno desta orientação de Lucília Gago remonta a outubro de 2019, quando o Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) levantou a questão se a autonomia do Ministério Público (MP) absorve a hierarquia do Ministério Público? Ou seja, se os magistrados do MP são subordinados à hierarquia do diretor do DCIAP, dos DIAP’s ou, da PGR.
Deste modo, o CSMP propôs a Lucília Gago pedir um parecer ao Conselho Consultivo sobre o conflito entre esta autonomia e hierarquia dos magistrados do MP. A procuradora seguiu a proposta do Conselho Superior e pediu o parecer.

Julho de 2023

Mais recentemente, um grupo de deputados do PSD fez uma recomendação ao líder da bancada parlamentar, Joaquim Miranda Sarmento, para que defendesse que a procuradora-geral da República, Lucília Gago, fosse ao Parlamento dar explicações sobre a intervenção do Ministério Público no caso das buscas realizadas pela Polícia Judiciária às residências de Rui Rio e do vice-presidente da bancada, Hugo Carneiro, e a sedes do partido. Mas Montenegro acabou por não pedir, oficialmente, a ida da titular da investigação criminal ao Parlamento, enviando apenas uma exposição do Conselho Superior do Ministério Público.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Lucília Gago pode ser chamada ao Parlamento? Sim, desde 2000 que todos os ex-PGR foram

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião