As novas regras para os imigrantes em Portugal entraram em vigor a 4 de junho. Apesar das alterações à lei, as firmas de advogados revelam que a procura dos serviços não aumentou substancialmente.
Em junho foram anunciadas novas regras para os imigrantes em Portugal, como a revogação dos procedimentos de autorização de residência baseados em manifestações de interesses. Apesar das alterações à lei dos estrangeiros, os escritórios de advogados contactados pela Advocatus revelam que a procura dos serviços nestas matérias não aumentou substancialmente.
“A extinção, pelo legislador, das manifestações de interesse implica, essencialmente, que o cidadão estrangeiro deve apresentar agora, junto do consulado português localizado do país de nacionalidade/residência, o pedido de visto de residência devidamente fundamentado e acompanhado da documentação legalmente necessária”, explica Vanessa Rodrigues Lima, sócia da Prime Legal. Esse pedido de visto de residência é a solução que o legislador dá aos cidadãos que pretendem mudar-se para Portugal.
A advogada sublinha que a manifestação de interesse era considerada uma “exceção” a essa regra e que, agora, não basta o cidadão estrangeiro “manifestar” a sua intenção de residir em território nacional, passando a ser exigido que providencie à autoridade consular a necessária documentação de suporte e em momento prévio à mudança para Portugal.
“O fim das manifestações de interesse não alterou a procura pelos nossos serviços. Apenas nos obrigou a lidar, de mais perto, com as entidades consulares e, necessariamente, com o Ministério dos Negócios Estrangeiros, assim como com a Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), a qual desempenha um papel crucial, quando abordamos o consulado português competente no caso concreto”, acrescenta.
Também Bárbara Pestana, sócia da paxlegal, assegura que não houve um aumento da procura dos serviços, mas garante que o interesse em Portugal mantém-se. “Depois da instabilidade criada com a alteração do regime do Golden Visa e do Residente Não Habituais (na sua formulação anterior), temos notado um interesse crescente no mercado português e nos nossos serviços, o qual não cremos estar relacionado com o fim das manifestações de interesse”, nota.
Segundo a sócia, os clientes da paxlegal entram em Portugal para fixar residência e investir no País, mas já com vistos de residência devidamente aprovados junto das entidades consulares portuguesas no estrangeiro ou com a autorização de residência já deferida pela AIMA. “São clientes com uma situação profissional e financeira confortável, que precisam de viajar frequentemente, e não encaram a possibilidade de ficar retidos em Portugal a aguardar pela emissão das suas autorizações de residência”, revela.
Já a sócia Raquel Galinha Roque e o associado Gustavo Machado Dias, da CRS Advogados, sublinham que, mesmo quando as manifestações de interesse eram uma possibilidade, a grande maioria das pessoas que pretendiam submeter esse tipo de processos procuravam assessoria jurídica para assegurar que, “tanto na preparação do processo e respetivos documentos, bem como na sua submissão, estava tudo em conformidade com o que era legalmente exigível”.
“Aliás, qualquer que seja a modalidade de visto e/ou autorização de residência procurada pelos potenciais clientes – que dependerá sempre de qual o objetivo dos mesmos em Portugal – os serviços jurídicos prestados por advogados são absolutamente essenciais, pelo que a procura dos mesmos sempre foi, e sempre será, independentemente de alterações legislativas, uma constante”, referem.
Assim, apesar das alterações a esta lei, os advogados explicam que na CRS continuam a assistir a uma elevada procura dos serviços, continuando a área de Imigração a ser uma das principais áreas de atuação do escritório. “Com o fim das manifestações de interesse o que na verdade sentimos que tivemos de alterar foi a gestão de expectativas dos clientes. Quer quanto ao processo em si, que deixa de ser possível de iniciar com a pessoa já a residir em Portugal, bem como de entidades que pretendiam crescer em Portugal com a contratação de trabalhadores estrangeiros que passam a ter uma gestão de equipas diferente, menos imediata”, acrescentam.
Clientes procuram obtenção de visto
Entre os principais motivos que levam os clientes a procurar “ajuda” nos escritórios de advogados está a autorização de residência por diversos motivos, desde investimento a trabalho remoto.
Por exemplo, na paxlegal, dedicada a private clients, a procura baseia-se na obtenção de autorizações de residência para investimento, para atividade altamente qualificada, empreendedores e trabalhadores independentes, para trabalho remoto, titulares de rendimentos passivos e nacionalidade Portuguesa. Segundo explica Bárbara Pestana, este perfil de cliente implica que tenham vários serviços jurídicos no âmbito do direito imobiliário, societário, sucessório, da família, fiscal e, uma série de parcerias.
“Seja temas mais complexos como a definição da sua situação fiscal, patrimonial e sucessória, seja temas mais simples como a escolha da escola dos filhos ou a mera legalização de um carro, por exemplo, no nosso escritório procuramos disponibilizar uma ampla gama de serviços jurídicos para que a mudança para Portugal se faça de uma forma suave e integrada”, acrescenta.
Também Raquel Galinha Roque e Gustavo Machado Dias alertam que este tipo de clientes começam por procurar os serviços para pedir ajuda para uma eventual obtenção de visto e/ou autorização de residência, mas que ao longo do processo e da relação estabelecida com a sociedade acabam por solicitar assessoria em outras áreas.
Entre as principais nacionalidades dos clientes estão a americana, brasileira, coreana, chinesa, canadiana, libanesa, britânica, sul-africana, turca, indiana e vietnamita.
“Os clientes são, as mais das vezes, extracomunitários. O que pressupõe que atuemos junto da AIMA. Se os clientes fossem comunitários, o processo seria mais simples, pois a intervenção da AIMA seria dispensada ou seria muito diminuta. A maior parte dos nossos clientes provêm dos Estados Unidos, Brasil, Ásia e Médio Oriente”, revela Vanessa Rodrigues Lima.
A nova lei dos estrangeiros
As novas regras para os imigrantes em Portugal entraram em vigor a 4 de junho e fazem parte do Plano de Ação para as Migrações. Para além do fim das manifestações de interesse, entre os principais pontos desta lei está o reforço da rede diplomática, a transformação do visto CPLP em visto Schengen, a estrutura de missão com recursos humanos, materiais e financeiros, a atração de quadros estrangeiros, criação de de centros de emergência e reforço do asilo, criação da Unidade de Estrangeiros e Fronteiras na PSP para fiscalizar imigrantes, reorganização da AIMA e reforço do apoio à integração.
Um conjunto de medidas que Bárbara Pestana considera necessárias para “estancar o fluxo de imigração irregular” e recuperar os cerca de 410.000 processos pendentes na época.
“As manifestações de interesse geraram o colapso do antigo SEF. Claramente um erro do anterior Governo, tendo em conta que o SEF não tinha recursos (nem a agora AIMA tem) para fazer face a cerca de 1.000 pedidos de autorização de residência diários, que se materializavam através das manifestações de interesse, e que deixou, em face dessa incapacidade, durante anos a fio, milhares de cidadãos estrangeiros em situação precária, muitas vezes sujeitos a situações deploráveis de violação de direitos humanos e outros direitos fundamentais”, revela a sócia da paxlegal.
A advogada considera ainda que é fundamental que haja uma “mudança urgente” e “profunda” nos serviços consulares portugueses, os quais não têm, em regra, capacidade de resposta. “Mostra-se dificilmente aceitável que requerentes de vistos de residência fiquem meses à espera de um agendamento para apresentação dos seus pedidos de visto de residência ou, pura e simplesmente, para a legalização de documentos”, acrescenta.
Já Vanessa Rodrigues Lima considera que as alterações à lei vêm colocar requisitos adicionais à imigração. “Apesar de a questão ser eminentemente política, cremos que a medida em apreço foi positiva, pois veio prevenir situações de imigração ilegal, e limitar os casos em que os imigrantes estão em território português, mas não dispõem de quaisquer meios de subsistência”, refere.
“No entanto, mais do que alterações legislativas que ainda se afiguram necessárias, é fulcral que a agora AIMA funcione! Sabemos que estão a ser adotadas medidas para reduzir os tempos de análise que, em certos casos, chegam a três anos. Esta situação é insustentável e cria uma péssima imagem de Portugal na comunidade internacional, pelo que devemos fazer os melhores esforços para que a atual situação (cerca de 400.000 processos pendentes de análise) seja solucionada e a AIMA volte a ser uma agência funcional”, frisa a sócia.
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Novas regras de imigração e a oportunidade de negócio para firmas de advogados
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