Patrões e sindicatos apontam falhas na quantificação do custo com redução de impostos nas GOP

Conselho Económico e Social aprovou um parecer crítico às Grandes Opções do Plano do Governo pela "dispersão de medidas", como a descida do IRS, cujo impacto não está quantificado.

O Conselho Económico e Social (CES), que junta confederações patronais e sindicais, aprovaram um parecer crítico às Grandes Opções do Plano (GOP) 2024-2028 do Governo, apontando várias falhas como a “dispersão de medidas” e a ausência da quantificação do seu custo, como a descida do IRS. Os parceiros sociais criticam ainda a ausência de respostas de combate ao desemprego, baixos salários e precariedade laboral dos jovens.

Verifica-se assim “alguma dispersão nos temas e nas medidas que, em diversos casos, se entrecruzam ao longo dos diferentes desafios estratégicos com repetições frequentes”, de acordo com o mesmo relatório. A entidade, presidida por Luís Pais Antunes, considera que “algumas das medidas são referenciadas em múltiplos desafios, como sucede com a descida do IRS, e não existe uma quantificação dos respetivos custos, nem é fixado um prazo preciso para o período de implementação”.

“A escassez é a nota dominante com o destaque a ir para as reduções do IRS e do IRC que se fazem acompanhar de um conjunto de medidas que não estão verdadeiramente alinhadas com os grandes objetivos enunciados”, de acordo com o mesmo parecer.

CES arrasa proposta inicial do Governo para o IRS Jovem

Especialmente em relação ao IRS Jovem, proposto anteriormente pelo Governo e que consta do seu programa, o CES é particularmente arrasador, porque, na sua perspetiva não vai efetivamente conseguir reter talento em Portugal. “Existe uma distância assinalável entre as intenções e as medidas de políticas públicas concretas apresentadas neste domínio”, escrevem os parceiros.

De recordar que medida inicial para IRS Jovem, e não a que entretanto foi apresentada ao PS como sendo “irrecusável”, previa o fim do regime em vigor, assente em isenções durante cinco anos e até aos 30 anos. E estabelecia um novo modelo, com uma tabela de taxas própria, cuja tributação máxima ía até 15, abrangia todos os jovens até aos 35 anos com rendimentos mensais brutos até ao 8.º e penúltimo escalão de IRS.

“Sem prejuízo de o CES partilhar as preocupações subjacentes à adoção desta medida, não pode deixar de alertar que a mesma pode gerar tensões na sociedade portuguesa, considerando-se que existem outras medidas, que de uma forma mais equitativa, poderiam contribuir para ajudar os jovens na fase inicial da vida”, segundo o relatório.

O CES “considera como positivas medidas que contribuam para a retenção e regresso de jovens a Portugal”, mas “desde que sejam construídas com base em princípios de equidade, justiça social e solidariedade”. Os parceiros sociais alertam que políticas de retenção de talento não se podem esgotar na área fiscal. Por isso, “as medidas incluídas nas GOP não respondem aos problemas com que os jovens se debatem, como o desemprego, os baixos salários e a precariedade laboral, nem às dificuldades no acesso à habitação”.

Falta de respostas de combate à pobreza

No capítulo de combate à pobreza e às desigualdades, um dos desafios das GOP, o CES conclui que “as medidas elencadas são escassas e, em alguns casos, não estão verdadeiramente focadas na pobreza ou nas desigualdades”. Apenas se destacam “o reforço do complemento solidário para idosos (CSI) e o aumento do salário mínimo, o que é manifestamente insuficiente num país em que a taxa de pobreza, antes de transferências sociais, é superior a 40% e, mesmo após essas transferências, o risco de pobreza é significativo”.

Para além disso, patrões e sindicatos reiteram “as preocupações expressas em anteriores pareceres sobre os défices existentes de proteção e de segurança social que abrangem alguns grupos sociais, nomeadamente desempregados”.

Para o CES, há vários problemas de fundo “não estão suficientemente enfatizados no documento”, e “cuja eventual inércia permite antecipar o respetivo agravamento, como sejam: a ameaça demográfica e a perda de talentos pelos elevados fluxos de emigração; o modelo económico ainda predominante no país, que cria pouco valor e assenta em baixos salários e numa baixa produtividade; a questão da efetivação do direito à habitação, as políticas do território associadas, em especial, às ‘políticas de cidade’, essenciais na melhoria da qualidade de vida da população; e, finalmente o défice, em quantidade e em qualidade, de serviços públicos essenciais, a que acresce a morosidade do sistema judicial”.

Acresce que os vários documentos estratégicos referenciados ainda não estão elaborados ou neles se pretende proceder à respetiva revisão (não havendo a indicação de qualquer calendarização e muitos com data-limite de 2030), tornando mais difícil a obtenção dos resultados pretendidos no quadro temporal destas GO”, sinaliza a instituição.

Elevada dependência de fundos europeus e fraca execução do PRR

Por outro lado, o CES olha com preocupação para “a elevada dependência do investimento e, em particular, do investimento público dos fundos europeus”, como já alertou em anteriores pareceres. Citando, aliás, o de 2023, indica que “existe a necessidade de se ponderar a articulação entre as fontes de financiamento nacionais e os fundos europeus, os quais devem ser complementares, devendo o Estado assegurar as dotações necessárias para não comprometer os objetivos de desenvolvimento e investimento”.

“Os números apresentados nestas GO mostram que o contributo dos fundos europeus é, atualmente, superior a 75% do total do financiamento previsto”, sinaliza. Analisando o documento, verifica-se que, dos cofres públicos, mais concretamente, dos Orçamentos do Estado (2024-2028), apenas irão sair 14,28 mil milhões de euros, isto é, um quarto (24,6%) dos cerca de 58 mil milhões que o Governo estima gastar. A fatia de leão, de 43.651 milhões de euros (75%), vem de Bruxelas: 18,58 mil milhões são do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), 18,38 mil milhões do PT2030 e 6,7 mil milhões terão origem noutras fontes europeias, tal como o ECO já escreveu.

Por outro lado, há um “problema” na “execução dos programas Comunitários, que, na opinião do CES, deveria merecer uma referência reforçada, seja no plano qualitativo, seja no plano da execução quantitativa, em que os baixos níveis de execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e os atrasos na implementação do PT 2030 são altamente preocupantes”.

“A alteração deste contexto impõe a tomada de medidas por parte do Governo que não podem ser meramente circunstanciais, exigindo uma resposta à reconhecida falta de recursos humanos, mas também a alteração de aspetos organizacionais e processuais”, recomenda.

Dando respaldo aos alertas já manifestados pela Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) do Parlamento, o CES considera que as GOP do Governo correm o risco de se transformar num “texto rapidamente desarticulado”, tendo em conta que esta proposta de lei pode ficar desatualizada face ao novo um plano orçamental estrutural de médio prazo que Portugal vai entregar em Bruxelas este mês e que irá substituir o plano de estabilidade.

Para além disso, o CES refere que “a necessidade do Governo para efeito da aprovação do(s) Orçamento(s) do Estado de negociar as medidas a contemplar no(s) mesmo(s) pode também limitar a sua capacidade de concretização das GOP 2024-28, ficando por esclarecer como se articula o projeto de lei das GOP 2024-2028, em apreciação, com o plano orçamental estrutural nacional de médio prazo (POENMP) com uma duração de quatro anos, podendo a existência de possíveis incongruências tornar estas GOP um texto rapidamente desarticulado”.

O CES aprovou o parecer com a abstenção da CGTP e da CAP. UGT e as restantes confederações empresariais (CIP, CCP e CTP) votaram favoravelmente.

(Notícia atualizada às 18h23)

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