Amadeu Guerra, o novo PGR, de olhos postos na Operação Influencer
O ex-diretor do DCIAP toma posse este sábado, às 12h30, no Palácio de Belém. Acusação do processo EDP, investigação a Costa e arguidos da Influencer e um efetivo poder hierárquico são os desafios.
Sábado, pelas 12h30, no Palácio de Belém, Amadeu Guerra tomará posse como o novo Procurador-Geral da República (PGR), sucedendo a Lucília Gago, uma das titulares da investigação criminal da história da democracia portuguesa que mais críticas recebeu da sociedade civil, de políticos e até do seio da magistratura do Ministério Público (MP), depois da investigação ao ex-líder do Executivo, que acabou na sua demissão, a 7 de novembro do ano passado, e à marcação de eleições antecipadas. E é precisamente essa investigação, chamada de Operação Influencer, o maior desafio do novo PGR, depois de, até à data, uma acusação dos arguidos parece estar longe e nem António Costa chegou a ser constituído arguido.
António Costa foi ouvido, mas apenas seis meses depois das buscas feitas a São Bento e não como arguido: a audição foi realizada segundo um artigo do Código de Processo Penal que permite ouvir o ex-governante como suspeito.
A Lucília Gago são apontadas falhas na comunicação relativamente a este e outros casos mediáticos e a dificuldade de impor um verdadeiro poder hierárquico às equipas dedicadas às investigações criminais, para conseguir uma maior responsabilização sobre as decisões tomadas nos processos. Exemplo óbvio dessa falha é o chamado processo EDP/CMEC, cuja acusação a António Mexia, Manuel Pinho e Manso Neto tem sido consecutivamente adiada, ao fim de 12 anos de investigação. Tem agora a obrigatoriedade de deduzir essa mesma acusação – caso venha a acontecer – até 23 de outubro e Amadeu Guerra terá de estar com os olhos postos nessa decisão.
Ricardo Salgado, Henrique Granadeiro, Armando Vara, Zeinal Bava e José Sócrates foram alguns (só alguns) dos nomes sonantes que durante o mandato de Amadeu Guerra à frente do maior departamento que investiga a criminalidade económica e financeira, o DCIAP, foram investigados e acusados.
Ao longo do seu mandato à frente do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) – de 2013 a 2019 – surgiram alguns dos mais mediáticos processos judiciais. E não se coibiu – durante a investigação e acusação da Operação Fizz – de aceitar que um dos seus pares na estrutura do Ministério Público, Orlando Figueira, fosse alvo de uma acusação que, posteriormente, culminaria numa condenação. Menos sucesso teve no caso Vistos Gold, já que este processo resultou na absolvição do ex-ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, e de quase todos os restantes arguidos. Foi, diria depois, um “caminho difícil e de muita responsabilidade de empenho”.
Amadeu Francisco Ribeiro Guerra, de 69 anos, nomeado para um mandato de seis anos como Procurador-Geral da República, foi assim diretor do DCIAP, numa altura marcada por processos como Operação Aquiles, Operação Fizz, processos de Tancos, Hells Angels, EDP, Monte Branco, BES, entre outros. Foi procurador-geral regional de Lisboa, entre 2019 e 2020, tendo abandonado o cargo por motivo de aposentação. Benfiquista, filho de um militar da GNR, é visto como um nome sólido na estrutura do Ministério Público. Foi o braço direito de Joana Marques Vidal – antecessora de Lucília Gago -, mas não deixou de dar um ‘murro na mesa’ quando não aceitou a sugestão da então PGR de tirar das mãos de Rosário Teixeira (magistrado titular) a investigação contra José Sócrates.
Apesar de benfiquista ferrenho, não se coibiu de investigar o Benfica e o então presidente Luís Filipe Vieira na equipa especial que constituiu no DCIAP para investigar suspeitas relacionadas com o futebol.
O procurador de carreira foi a primeira e única opção de Luís Montenegro – que o conhece dos tempos em ambos estiveram na Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos. Marcelo Rebelo de Sousa concordou de imediato. O anúncio foi feito menos de uma hora depois de Luís Montenegro ter saído do Palácio de Belém, onde esteve reunido com o Chefe de Estado num encontro “muito breve”, que durou apenas 20 minutos.
Natural de Tábua, distrito de Coimbra, Amadeu Guerra entrou para a magistratura do Ministério Público (MP) há 45 anos e desempenhou funções em diversos tribunais, como o Tribunal de Trabalho de Lisboa e o 3.º Juízo Criminal de Lisboa.
Acabaria por demitir-se em março de 2006 da CNPD depois de descobrir e denunciar o controlo das chamadas telefónicas no seu próprio local de trabalho, durante 15 dias, entre 27 de janeiro e 5 de fevereiro de 2005.
Em outubro de 2018, a então nova Procuradora-Geral da República, Lucília Gago, manteve a confiança no então diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), Amadeu Guerra, pegando no processo da “Operação Marquês” para justificar essa confiança. Tanto que em março de 2019 o seu mandato foi renovado. Jubilado desde 7 de julho de 2020 (quando saiu em Diário da República o despacho com a decisão de “Desligamento do serviço por motivo de aposentação/jubilação do procurador-geral regional de Lisboa”), Amadeu cessou nessa altura 40 anos de ligação ao Ministério Público, na altura já estava há alguns meses de baixa.
“O caso do Marquês é bem ilustrativo dos níveis de exigência e qualidade do trabalho desenvolvido”, sendo plena “a confiança que deposito em Amadeu Guerra”, dizia Lucília Gago, na sua tomada de posse. O mandato do líder do DCIAP terminaria em março de 2019 e falava-se na hipótese de não recondução dessa mandato, à semelhança do que aconteceu com Joana Marques Vidal.
Amadeu Guerra é um homem discreto e, nestas funções, vai exigir-se que se rodeie de pessoas que, de forma continuada, mantenha uma comunicação externa da atuação do Ministério Público. E espera-se ainda que o seu mandato não se afaste muito do estilo a que nos habitou Joana Marques Vidal.
O agora mais velho PGR de sempre, foi ainda alvo do hacker Rui Pinto. A 31 de outubro de 2022, em julgamento, Rui Pinto respondeu em tribunal às questões de um coletivo de juízes sobre a maneira como acedeu a documentos da Procuradoria-Geral da República (PGR). Em declarações perante o coletivo, o hacker português explicou que, no momento dos acessos, estava em Budapeste e que “a forma de acesso foi, em concreto, a caixa de correio de Amadeu Guerra”. Rui Pinto explica como fez: “O método foi o mesmo utilizado para aceder a uma sociedade de advogados”, afirmou, garantindo que “não queria entrar no site da PGR”, uma vez que “o interesse que tinha era no DCIAP.”
A ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice defendeu que o novo PGR é a pessoa indicada “para pôr a casa em ordem e pôr ordem na casa”, considerando ainda que tem um “currículo inatacável” e que “é uma pessoa que conhece bem a casa”.
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