Diretiva do IVA alarga isenções à comida, bebidas e medicamentos

Nova lei europeia tem de ser transposta até ao final do ano. Há 11 projetos da oposição no Parlamento para mexer nas taxas do imposto.

Uma nova diretiva europeia, aprovada em 2022 e que tem de ser transposta para o regime jurídico português até ao final deste ano, vai alargar as isenções do IVA (Imposto sobre o Valor Acrescentado) a sete categorias de produtos, designadamente medicamentos, alimentação e bebidas, exceto as que contenham álcool. Mantém-se, no entanto, o limite máximo de 24 grupos de bens ou serviços com taxas reduzidas ou zero.

O ECO questionou o Ministério das Finanças quando irá apresentar uma proposta de lei que transponha a diretiva (que depois tem de ser aprovada pelo Parlamento) e se pretende alargar as isenções a um maior leque de produtos mas, até ao fecho deste artigo, não obteve resposta.

A grande novidade deste diploma é a possibilidade de os Estados-membros poderem aplicar uma terceira taxa reduzida abaixo de 5%, o que antes não era permitido, além de duas acima desse limiar que, em Portugal, são de 13% e 6%. A União Europeia avançou com esta alteração logo em 2022 e os países puderam aplicá-la logo, mesmo antes de ser vertida na letra da lei nacional, para dar resposta à crise pandémica e inflacionista.

Em Portugal, o então Executivo de António Costa implementou temporariamente o IVA zero para um cabaz de 46 bens alimentares essenciais durante seis meses, entre abril e outubro de 2023.

Essa medida terminou entretanto e apenas “certos bens utilizados na produção agrícola (adubos e fertilizantes; farinhas, e outros produtos para alimentação de gado, etc.) e produtos para alimentação de animais de companhia quando acolhidos por associações de proteção animal” gozam da taxa zero, de acordo com o ex-subdiretor-geral do Fisco, Miguel Correia. A atual proposta do Orçamento do Estado para 2025 (OE) renovou estas isenções.

A nova diretiva alarga então a possibilidade de isenção a sete categorias de produtos:

  1. Produtos alimentares (incluindo bebidas, com exceção das bebidas alcoólicas) destinados ao consumo humano e animal;
  2. Abastecimento de água;
  3. Produtos farmacêuticos utilizados para fins médicos e veterinários, incluindo produtos contracetivos e de higiene feminina, e produtos de higiene absorventes;
  4. Equipamentos, aparelhos, dispositivos, artigos, material auxiliar e equipamentos de proteção médicos, incluindo máscaras de proteção sanitária, utilizados normalmente em cuidados de saúde ou para uso das pessoas com deficiência;
  5. Transporte de passageiros e de bens como bagagem, bicicletas, incluindo bicicletas elétricas, veículos automóveis ou outros, ou prestações de serviços ligados ao transporte de passageiros;
  6. Fornecimento, incluindo o empréstimo por bibliotecas, de livros, jornais e publicações periódicas, em suporte físico ou por via eletrónica, com exceção das publicações total ou predominantemente destinadas a publicidade e das publicações que consistam total ou predominantemente em conteúdos vídeo ou música;
  7. Entrega e instalação de painéis solares em residências particulares, habitações e em edifícios públicos e de interesse público.

O tema poderá ganhar novo vigor, no âmbito da discussão na especialidade do OE para 2025, que se irá iniciar em novembro, agora que se sabe que o PS irá viabilizar pela abstenção o documento. É durante o debate e votação, artigo a artigo e alínea a alínea, da proposta orçamental que os partidos da oposição costumam propor a extensão da taxa reduzida de 6% ou até alargar as isenções a mais produtos. Neste momento, estão no Parlamento 10 projetos de lei que determinam reduções do imposto, segundo o levantamento realizado pelo ECO. Três são do Chega, dois do BE e quatro do PAN.

Há 11 projetos da oposição no Parlamento para mexer nas taxas do imposto

Os projetos do partido liderado por André Ventura pretendem baixar da taxa máxima (23%), para a intermédia (13%), os serviços prestados por veterinários e os alimentos adquiridos para animais de companhia e propõe alargar a taxa reduzida de 6% que já se aplica na aquisição de equipamentos de socorro por associações de bombeiros a outros utensílios para prevenção.

O PAN, liderado por Inês de Sousa Real, também quer mexer no IVA da comida dos animais de companhia e dos serviços médico-veterinários, mas vai mais longe do que o Chega e propõe aplicar a taxa reduzida de 6%. Para além disso, tem uma proposta para alargar o IVA a 6% no aluguer de velocípedes e para isentar a compra de produtos de higiene menstrual, que tem, neste momento, uma taxa reduzida. Esta proposta, por exemplo, tem enquadramento na diretiva europeia.

O Bloco de Esquerda deu entrada de um projeto para descer para 6% os serviços de telecomunicações e o fornecimento de eletricidade e gás engarrafado ou canalizado para consumo. Em sentido inverso, o partido de Mariana Mortágua propõe aumentar da taxa reduzida, de 6%, para a máxima, de 23%, o IVA suportado pelos alojamentos hoteleiros.

De recordar que ainda antes das férias, o Parlamento aprovou uma proposta do PS, à revelia do Governo, que aumenta o consumo de eletricidade que está sujeito à taxa reduzida de IVA, de 6%, medida que terá um custo no OE2025 de 110 milhões de euros, segundo o relatório da proposta orçamental. Assim, a taxa reduzida deverá aplicar-se aos primeiros 200 kWh de energia elétrica consumida em cada mês (duplicando os atuais 100 kWh), ou de 300 kWh mensais no caso das famílias numerosas (duplicando os atuais 150 kWh). Em paralelo, prevê que a redução deixe de ter um caráter transitório.

“Certamente que agora durante o debate do Orçamento do Estado teremos uma discussão quente sobre taxas, atenta a maior flexibilidade já concedida pelo Direito Europeu nesta matéria“, sublinha Miguel Correia, professor da Universidade Católica e ex-subdiretor-geral da Autoridade Tributária (AT) para a área do IVA.

Como Portugal atingiu ou até “já ultrapassou em violação da diretiva” o teto de 24 pontos dos 29 que podem estar sujeitos a taxas reduzidas, de 13%, 6% e 0%, como conclui Rogério Fernandes Ferreira, sócio da RFF Lawyers, seria necessário retirar alguns desses itens para poder incluir novos.

Miguel Correia lembra ainda que várias associações da sociedade civil têm já reclamado descidas do IVA, como é o caso da Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP), que quer baixar a taxa intermédia de IVA de 13% para os 10% e a reposição dos refrigerantes e bebidas alcoólicas nesta taxa do IVA, que atualmente são taxados a 23%.

Mas, como nota o especialista em Direito Fiscal, “Portugal não pode ter mais do que três taxas reduzidas de IVA”. “Não pode ter taxa de zero, 6%, 10% e 13%. Teria então de baixar a de 13%”, indica Miguel Correia. No entanto, acha “muito pouco provável” que um qualquer Governo “vá mexer muito nas taxas do imposto ou descer a taxa intermédia de 13% para 10%, porque o IVA é uma máquina de fazer dinheiro, representa quase 40% da receita fiscal, rende quase tanto como o IRS e IRC juntos”.

Analisando a proposta do Orçamento do Estado para 2025, verifica-se que o Governo espera arrecadar 25,6 mil milhões de euros só com a cobrança de IVA, o que corresponde a uma subida de 6,4% face a 2024 e representa 40,5% da receita fiscal total, que deverá ascender a 63,3 mil milhões.

Taxa intermédia do gasóleo agrícola tem de acabar até 2030

A Diretiva comunitária alarga as isenções em IVA a sete categorias de produtos, mas também estabelece uma meta para acabar com as taxas intermédias de combustíveis, adubos e pesticidas.

Neste âmbito, a taxa intermédia de 13 % aplicada ao gasóleo colorido e marcado, vulgarmente designado de gasóleo agrícola, “vai ter de acabar até 1 de janeiro de 2030”, alerta o fiscalista Miguel Correia. “E Portugal será forçado a passar este combustível fóssil para a taxa máxima de 23%”, acrescenta.

O diploma do Conselho da União Europeia estabelece que “as taxas reduzidas ou isenções com direito à dedução do IVA pago no estádio anterior aplicáveis aos combustíveis fósseis, a outros bens com impacto semelhante nas emissões de gases com efeito de estufa, como a turfa, e à lenha deixam de ser aplicáveis o mais tardar em 1 de janeiro de 2030″.

Para além disso, “as taxas reduzidas ou isenções com direito à dedução do IVA pago no estádio anterior relativas aos pesticidas químicos e fertilizantes químicos deixam de ser aplicáveis o mais tardar em 1 de janeiro de 2032″.

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