• Entrevista por:
  • Cristina Oliveira da Silva e Paula Nunes

“Uberização das relações de trabalho” está para ficar

O Inspetor-Geral do Trabalho diz que há "grande capacidade imaginativa" de fechar e abrir empresas com números de contribuinte diferentes. E há notificações que não chegam ao destino.

A organização dos tempos de trabalho continua a liderar a tabela de infrações das empresas, e, em muitos casos, o incumprimento resulta do desconhecimento da lei. Esta é uma falha recorrente com que os inspetores de trabalho se deparam ano após ano. Mas também há fenómenos novos a ter em conta e que precisam de ser pensados, diz Pedro Pimenta Braz, o Inspetor-Geral da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT).

É o caso da uberização das relações de trabalho”. Em entrevista ao ECO, Pimenta Braz diz que não é possível parar o vento com as mãos e que estas novas formas de trabalho “vieram para ficar”. Por isso, é preciso regulá-las. Além disso, há que olhar para os critérios elencados na lei laboral que permitem presumir a existência de contrato de trabalho, defende o Inspetor-Geral. É que há aqui um problema: muitas vezes a ACT deteta uma situação que entende estar à margem da lei e, depois, o tribunal tem uma leitura diferente, dizendo que aquele trabalhador é “um genuíno prestador de serviços”.

Mas há outros desafios que se colocam. O Inspetor-Geral do Trabalho apela a “uma revolução informática” na casa e volta a frisar a importância da troca de dados com fisco e Segurança Social. Neste último caso, já há reuniões técnicas com estas entidades que, se chegarem a bom porto, vão permitir dar “um salto qualitativo gigante” na resolução dos problemas.

Uma das grandes dificuldades da ACT passa pela notificação das entidades empregadoras. Porquê? Moradas falsas, exemplifica o Inspetor-Geral, acrescentando que “há uma grande capacidade imaginativa de fechar e abrir empresas com as mesmas pessoas”, mas “com números de contribuinte diferentes”. Com a troca de dados, é possível saber “imediatamente” quem são e onde estão os sócios-gerentes da empresa.

Entre moradas falsas, avisos de receção que não são levantados ou portas que não se abrem, há notificações de sanções que não chegam ao destino. A consequência? “Passados cinco anos, prescreve”, afirma Pimenta Braz. E sugere uma solução para o problema.

O Governo fala no fim da austeridade. Sente que isso se reflete na atuação das empresas? O incumprimento tem vindo a diminuir ou não?

Não posso ligar uma coisa a outra. Infelizmente, em algumas entidades empregadoras ainda há uma cultura de incumprimento generalizado no que diz respeito a condições de trabalho, ao cumprimento do Código do Trabalho. Durante a crise poderá ter havido algum desinvestimento na segurança e saúde do trabalho. Mas que aumentou incumprimento devido à crise não posso dizer, porque eu continuo a achar que o grau de incumprimento ainda é muito apreciável em Portugal, nomeadamente na organização dos tempos de trabalho.

Continua a ser a principal infração?

Exatamente.

Onde é que se notam melhorias?

Aquilo em que se nota melhorias, que em 2013 e 2014 se sentiu muito, é nos lay-off, despedimentos coletivos, salários em atraso. Neste momento voltamos a números pré-troika.

Na organização dos tempos de trabalho, qual é o principal problema?

O trabalhar muito mais do que 40 horas por semana, mais do que 8 horas por dia, e isto é generalizado. É algo que não mudou na nossa cultura.

Porquê?

Em primeiro lugar, acho que a legislação não é fácil. E se pensarmos que exige algum grau de tecnicidade e que a esmagadora maioria das nossas entidades empregadoras são micro e pequenas empresas — muitas delas sem um nível suficiente de hermenêutica jurídica que leve a uma compreensão mais técnica — temos aqui um problema. A complexidade da legislação. Segundo problema: a falta de organização das ainda muitas organizações empregadoras, porque muitas das vezes quando falamos da organização de tempo de trabalho…

…é feita em cima da hora?

Falta de planificação. Este problema não encontramos em muitos dos países que queremos imitar na Europa desenvolvida. Terceiro lugar, ainda diretamente ligado com a nossa matriz de aprendizagem no que diz respeito a essas matérias: ainda não percebemos que a produtividade não está diretamente ligada com a quantidade de trabalho. A maior parte das vezes não está. O foco naquilo que se faz, a organização do tempo de trabalho, vale muito mais do que uma pessoa estar 10 ou 12 horas no trabalho e ter depois uma produtividade de cinco ou seis horas. É de longe a nossa maior contraordenação na organização dos tempos de trabalho, que tem a ver depois com fixação do horário de trabalho, o horário não está feito, registo de tempos de trabalho, trabalho suplementar não pago, etc.

Defenderia uma simplificação da legislação?

Com certeza.

A lei também prevê um conjunto de mecanismos: bancos de horas, horários concentrados…

E depois há um paradoxo ainda maior. Temos um conjunto de instrumentos no Código, muitos deles não são utilizados e levam ao incumprimento.

Está a falar de bancos de horas?

Bancos de horas… Não digo que esses instrumentos deviam desaparecer, cabe ao legislador decidir, nós somos técnicos. No dia-a-dia percebemos que a maior parte destes instrumentos não são utilizados. Porquê? Lá está a complexidade técnica, a forma como estão redigidos, a sua leitura não é fácil. Acho que na redação de algum articulado devia haver uma maior reengenharia — se é que posso dizer — jurídica, para explicar às pessoas que aquilo pode ser utilizado. E porque não são utilizados, leva ao incumprimento.

No dia-a-dia percebemos que a maior parte destes instrumentos [de organização do tempo de trabalho] não são utilizados. E porque não são utilizados, leva ao incumprimento.

Pedro Pimenta Braz

Inspetor-Geral do Trabalho

Como não usam, as pessoas trabalham mais tempo?

O inspetor no local do trabalho é, em primeiro lugar, um informador, e deve dizer como se faz. Na maior parte das vezes, quando dizem que se podia usar aqui o banco de horas ou contratar uma pessoa a contrato a termo incerto no caso da trabalhadora grávida que está em casa…

Para substituir…

No caso das grávidas é uma coisa ainda mais gritante. As pessoas nem sequer sabem que há um instrumento no Código que permite contratar alguém a termo incerto enquanto aquela trabalhadora estiver ausente. Há algo que tem de ser feito porque nós não estamos em todos os locais de trabalho.

Na maior parte das vezes, o incumprimento é deliberado ou inconsciente, por falta de conhecimento da lei?

Neste momento, muito é de forma inconsciente, porque não conhecem os mecanismos que têm à sua disposição.

Fala de tempos de trabalho ou de forma geral?

Em termos gerais, mas tempos de trabalho sim, claramente é um articulado que não é fácil de interpretar. E até há pouco tempo alterava-se constantemente. Às vezes, a inconsciência, digamos assim, é tão grande, que dizem que estão a fazer desta forma porque houve articulação com o trabalhador, e nós dizemos que está tudo ilegal…

Sente que tem havido novas formas de precariedade?

A ACT não existe para combater a precariedade…

É para averiguar a precariedade ilegal.

Cabe ao legislador decidir se quer mais ou menos. Até posso ir mais longe. De que precariedade estamos a falar? Contratos a termo bem fundamentados numa empresa sólida ou contratos efetivos numa empresa que vai à falência e desaparecem os sócios-gerentes?

Então reformulo: que novos mecanismos têm sido “inventados”?

A denominada uberização das relações de trabalho. A uberização tem a ver não só com transportes, mas com muitos setores. Na parte hoteleira, já há pessoas que vão a casa de outros fazer jantares e almoços. E são trabalhadores…

E a ilegalidade…

É que não há relações de trabalho, não há contrato, é um trabalho totalmente não declarado. O que se entende por uberização das relações de trabalho? A clássica subordinação jurídica deixou de aparecer tal e qual a conhecemos. Porque muito do que está no Código, ainda, tem a ver com relações industriais de trabalho, que estão a desaparecer. Nunca vão desaparecer todas, mas em vez de serem 70 ou 80% se calhar hoje são 10% ou 20%.

É uma nova forma de trabalho?

Sim.

À margem da lei…

Muita dela à margem da lei, totalmente não declarada. E que põe em causa até o que entendemos por trabalho subordinado. Vamos ver ao artigo 12.º do Código do Trabalho os critérios de subordinação jurídica [características que permitem aferir a existência de um contrato de trabalho] e o mais importante — e isto está a ter alguma dificuldade em passar para os nossos tribunais — é que o maior critério de todos é a dependência económica. A maior parte daquele critérios já passaram à história.

Porque diz isso?

A fronteira entre um falso prestador de serviços e um trabalhador subordinado hoje em dia é muito ténue a maior parte das vezes. Porque se a pessoa está 100% dependente economicamente daquele que lhe paga os serviços, pode até o computador ser dela, pode nem ter horário de trabalho ou não receber ordens diretas [alguns dos critérios previstos na lei] mas a subordinação económica é total. Aquela pessoa está dependente hierarquicamente daquela instituição. Para mim, estamos perante uma subordinação jurídica que já não é compaginável exclusivamente com aqueles critérios.

Ou seja, as novas formas contratuais vão continuar, a informatização vai continuar, o trabalho ao domicílio ou teletrabalho já existem e o teletrabalho é muito complicado de compaginar com o que está no articulado do Código do Trabalho. O foco tem que começar a ser feito na dependência económica da pessoa perante a instituição que lhe paga. É o grande critério da subordinação jurídica moderna.

Agarrando esse critério, é possível perceber quem está à margem da lei nessa uberização?

É muito mais fácil, mas depois vai chocar com alguma interpretação, alguma hermenêutica jurídica ainda mais conservadora. Por exemplo, chegarmos a um sítio, levantarmos o auto de notícia, e depois o tribunal reconhece como um genuíno prestador de serviços a pessoa.

Contra o entendimento da ACT.

No terreno percebemos que há uma dependência económica, uma subordinação jurídica entre a pessoa e a entidade, e o tribunal diz que não. Porque de acordo com o que está estipulado na lei, há um conjunto de fatores que ainda estão nas cabeças de quem tem obrigação de fazer alguma interpretação jurídica dos fenómenos.

Ou seja, a rapidez com que as novas formas de trabalho estão a aparecer na sociedade ocidental não estão a ser acompanhadas pela rapidez da agilidade mental da nossa parte, de conseguirmos trazer essas formas para a regulação laboral. Não é fácil, mas é um caminho que tem de ser feito com alguma rapidez porque não vamos parar o vento com as mãos. Esses novos fenómenos vieram para ficar.

No terreno percebemos que há uma dependência económica, uma subordinação jurídica entre a pessoa [trabalhador] e a entidade, e o tribunal diz que não.

Pedro Pimenta Braz

Inspetor-Geral do Trabalho

Têm é de ser trazidos para dentro da lei?

Têm é de ser regulados. Tem de haver um grande esforço de todos, e sobretudo do legislador, de perceber o que se entende por relação do trabalho. O diretor-geral da OIT [Organização Internacional do Trabalho] já disse que, à escala global, apenas 25% dos contratos de trabalho são o velho contrato subordinado. O que quer dizer que há 75% que está fora disto. O que quer dizer que as inspeções de trabalho só acodem a 25% das pessoas.

Mas a inspeção não age sobre os que estão fora?

Não. Só age sobre o contrato subordinado e sobre o que tipificamos como contrato subordinado. Há aqui o perigo de daqui a uns tempos podermos estar a falar sozinhos para meia dúzia de privilegiados. Ou porque não se altera o que se entende por contrato por subordinação jurídica, e acho que se deve ir por aí…

Mexer no articulado…

Mexer. Incluir. E perceber que a dependência económica é algo cada vez mais fundamental nesta relação de trabalho jurídica, porque cada vez mais há um mundo todo a trabalhar com outras formas multifuncionais, multi qualquer coisa, a tal uberização das relações de trabalho, que ficam de fora do critério industrial da normal relação de trabalho subordinada.

Mas a ACT só pode agir nesses casos se houver base legal?

Não, a nossa base legal é a nossa apreciação também. Mas depois há esta dificuldade: estarmos a perceber que é um falso prestador de serviços e não conseguirmos perante a lei subsumir a realidade concreta do fenómeno que estamos a ver.

Mas pode agir…

Mas agimos… Perdemos é depois em tribunal. Como diria o diretor-geral da OIT, os 75% não são todos falsos recibos verdes. Há aqui um fenómeno de precarização, desregulação, do que estou a exigir a uns trabalhadores, e depois há um conjunto de outros que estão fora e que não são falsos prestadores de serviços.

Onde está esse perigo?

Em todo o lado, no setor dos serviços, na comunicação social, na saúde, tudo o que seja “colarinho branco”.

Mas não existiu sempre este problema com os falsos recibos verdes?

Era diferente porque era algo muito localizado, não havia o background informático que há hoje. Hoje, através de plataformas, das redes informáticas, eu posso nem ver as pessoas e estar a contratá-las.

Se me diz que a ACT avalia estes casos mas depois perde em tribunal, há aqui alguma redução dos recursos destacados para estes casos?

Até agora não, mas a ACT não pode deixar de tomar atenção às decisões que vêm de tribunais, nomeadamente superiores.

A ACT perde a maior parte destes casos?

Não vou dizer que são a maior parte, mas temos claramente casos desses.

Agora que chegamos ao verão, continuarão a existir empresas que encerram para férias e depois já não abrem?

Espero que seja mais tranquilo. Nada nos diz, do terreno, que possa acontecer este verão. Não quer dizer que não possa haver um caso ou outro.

Já defendeu que os salários em atraso deviam ser criminalizados. Não foram tomados passos nesse sentido. Porquê?

Não faço ideia. Mantenho a mesma ideia. Parece-me um fenómeno muito lusitano. Qualquer legislador que procure alterar uma lei deve antes de mais avaliá-la no terreno. Se os salários em atraso não desaparecem e temos, ao longo da nossa história jurídica, um conjunto de articulados que visa combater isso, acho que o legislador deve olhar com seriedade para o enquadramento e perceber que tem de fazer alguma coisa para aumentar a dissuasão desse fenómeno. Claro que não estou dizer que a pessoa deixa de pagar um mês e vá receber uma participação-crime.

Em que áreas estão os inspetores de mãos atadas?

Tudo o que é processos de recrutamento é muito difícil, a não ser que seja muito óbvio no anúncio escrito. Outro é o trabalho doméstico, não podemos entrar no domicílio das pessoas a não ser com autorização…

Sente que o Governo coloca a Inspeção-Geral do trabalho no topo das prioridades?

Não sei. Tem de perguntar ao Governo.

Agora há concursos de recrutamento…

Sim, há dois. Um que vem de outro Governo, um concurso interno de 40, e é minha expectativa que entrem em outubro. Há ainda um concurso externo, aberto por este Governo, é um sinal muito importante para nós… Mas está mais atrasado. O que gostaríamos é que no futuro não tivéssemos um hiato tão grande sem contratar. Este concurso de 40 vai dar muito trabalho, o de 80 também. Somos poucos e, para dedicar à formação de 120 pessoas, a casa quase para. Estes colegas, se entrarem em outubro, antes de novembro do ano que vem não estão na rua trabalhar. Tivemos um excelente sinal mas muito mais importante que estes 40 ou 80 é uma revolução informática que temos de fazer na casa.

Do sistema? Ou fala também das trocas de informação que tem vindo a defender?

Tudo. Mas agora estou a falar numa dimensão interna. Quando tivermos [a revolução do sistema informático], não tenho dúvida de que vai aumentar exponencialmente o grau de eficácia da nossa atuação. A interação de base de dados também, e estamos neste momento em reuniões técnicas com a AT [Autoridade Tributária] e o ISS [Instituto da Segurança Social].

A interação de base de dados também [vai aumentar a eficácia da atuação da ACT], e estamos neste momento em reuniões técnicas com a AT [Autoridade Tributária] e o ISS [Instituto da Segurança Social].

Pedro Pimenta Braz

Inspetor-Geral do Trabalho

Como pode a ACT ir mais longe com essa troca de dados?

A CNPD [Comissão Nacional de Proteção de Dados] terá uma palavra a dizer…

Mas assumindo que aceitaria…

Se aceitar, revoluciona a nossa forma de atuar. Eu tenho de ter um conjunto de critérios, um algoritmo — e nós fazemos esse algoritmo quase à mão. Se temos um problema num setor qualquer, vamos bater todos esses locais? Isso é um absurdo. Com um algoritmo, que já temos, e os dados just in time daquilo que os trabalhadores recebem e do que estão a pagar ou não à Segurança Social e ao fisco, consigo perceber exatamente onde estão os problemas. Em termos de focalização de números e de resolução de problemas dou um salto qualitativo gigante. Se há uma empresa que até paga a [contribuição] dos trabalhadores mas vejo que a contribuição patronal não está a ser paga, vejo ali um sinal de alerta porque amanhã se calhar sobra para os trabalhadores.

Há um conjunto de matérias que me permite a priori atuar, e a jusante atuar também, com a notificação das sanções. Não vou dizer que é mais importante que a prevenção — [esta] é mais barata e eficaz — mas quando sanciono uma entidade empregadora, tenho que notificá-la. E uma das grandes dificuldades é notificar essas entidades empregadoras.

Porquê?

Ou porque as moradas que temos são falsas…

Mas fala de uma base de dados desatualizada?

Não. Em Portugal é que há uma grande capacidade imaginativa de fechar e abrir empresas com as mesmas pessoas, com números de contribuinte diferentes. Eu posso saber imediatamente que os sócios-gerentes daquela empresa — devido até à responsabilidade solidária que o Código prevê — não é o Manuel mas é o senhor Joaquim, não mora na rua das Tílias mas na rua dos Anzóis. Este cruzamento torna muito mais eficaz também a minha atuação depois a jusante, na notificação da sanção, que é algo em que que temos uma grande dificuldade também neste momento.

Quer isso dizer que hoje em dia há notificações que não chegam aos destinatários?

Há.

E como se faz?

Passados cinco anos, prescreve.

E isso acontece?

Sim. Menos do que há uns tempos atrás, mas não estava a ser verdadeiro a dizer que isso não acontece. Acontece. Aliás, havia até há bem pouco tempo algumas entidades que tinham instruções para não receberem ofícios da ACT.

Como?

Não recebe o aviso de receção, fica nos Correios, formalmente não foi notificada. Porque a lei ainda nos obriga a aviso de receção para o início do procedimento das contraordenações.

O inspetor não pode fazer isso no local?

Os inspetores agarram no processo de outro colega — foram as instruções que eu dei — e avançam para a empresa que o outro colega sancionou, vão à morada que está no nosso processo. A muitas conseguimos fazer a notificação com a ajuda das autoridades policiais, quando é possível, por modo próprio, quando é possível, e depois há outras que não são possíveis, porque não nos abrem a porta, não atendem ou as moradas são falsas.

Como alterar isto?

Correio eletrónico. Cada cidadão ter uma morada eletrónica obrigatória. Temos para as Finanças… Connosco não. Em Espanha, o inspetor decide uma sanção e há uma morada eletrónica, qualquer entidade empregadora tem de dar ao inspetor. E é notificado eletronicamente. Não há cá aviso de receção. E se deixar a caixa de correio ficar repleta, também se resolve. É enviado um mail, que vem devolvido porque a caixa está cheia — muito simples, têm uma coisa que se chama edital eletrónico na página da inspeção espanhola e dizem que fulano tal foi notificado por mail e veio devolvido, está agora a ser notificado formalmente…

Em Portugal é que há uma grande capacidade imaginativa de fechar e abrir empresas com as mesmas pessoas, com números de contribuinte diferentes.

Pedro Pimenta Braz

Inspetor-Geral do Trabalho

É para si o principal problema?

Sim, o processamento das sanções. Tenho sido mais que contestado por pôr os inspetores a fazer instrução de contraordenações. E porquê? Porque não há ação inspetiva sem efetividade da lei. Não me interessa andar a fazer 3.000 visitas inspetivas sem consequências. O auto de notícia não é um fim em si mesmo, é um instrumento. Se a entidade empregadora receber um auto de notícia passado um ano, se calhar até já fez investimento para ultrapassar a situação. Imagine uma situação de segurança no trabalho, já investiu em máquinas… É autuado passado um ano?

Perde a lógica da prevenção?

Sim. A lei de processo tem de ser muito agilizada para tornar de forma muito mais eficaz a nossa atuação no terreno. É uma lei muito pesada que leva a que os próprios técnicos superiores e os inspetores que têm de fazer instrução dessas contraordenações percam muito tempo.

Que outras prioridades tem a ACT para este ano?

No que diz respeito à nossa atividade, reduzir de forma significativa os acidentes de trabalho. Face às ultimas estatísticas, 2014, o número manteve-se, 160. É muito. E os nossos dados — dos acidentes de trabalho que nos são comunicados e objeto de inquérito da nossa parte — mantiveram-se: 142 em 2015 e 140 em 2016. É uma tendência. Houve uma descontinuidade na descida porque há um retomar na atividade económica, por isso dizia que a descida não era 100% sustentável. Muita dela tinha a ver com anos da troika, com a redução da atividade.

A estratégia nacional 2015-2020 tem como objetivo reduzir em 30% a taxa de incidência de acidentes de trabalho graves e mortais, à data de 2015, um objetivo ambicioso, mas acho exequível. E ficamos a meio da tabela em termos comunitários, não damos nenhum salto. Este é para mim o problema mais grave que temos nos locais de trabalho.

Confia na sua equipa?

100%. Acho que é uma classe excecionalmente bem preparada. Não quero dizer que não possa haver um ou outro… Não têm todos os meios que gostariam, e eu gostaria de dar mais meios, mas isso faz parte da premissa económica, os meios são sempre escassos. Muitos deles, segundo aspeto, gostavam de estar noutras delegações. Neste momento não estou a autorizar enquanto esses concursos não avançarem.

Depois será possível?

Algumas sim. Mas os inspetores, quando são colocados naquelas delegações, vão por livre vontade. Neste concurso de 40 vão ser colocados no interior, só três ou quatro no litoral. O que disser que sim vai para o interior e depois não me peça para vir para Lisboa. É o que se está a passar agora: pessoas que entraram em 2009 e que sabiam que iam para ali… Com estes 40 vamos conseguir mudar alguns. São mais de 40 os pedidos que tenho de mobilidade interna.

  • Cristina Oliveira da Silva
  • Redatora
  • Paula Nunes
  • Fotojornalista

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