Com ações da Mota sob pressão, família investe 900 mil euros em 2024 para reforçar posição no capital
Os analistas atribuem a desvalorização das ações a movimentos especulativos, após a escalada do ano passado, e antecipam potencial de recuperação.
Depois de ter triplicado de valor no ano passado, as ações da Mota-Engil têm sido o “patinho feio” da bolsa de Lisboa, este ano. Apesar dos bons resultados operacionais e de uma carteira de encomendas em valores recorde, a companhia acumula uma queda superior a 36%. Um comportamento que analistas e gestores da empresa atribuem a movimentos especulativos e que tem sido aproveitado pela família para reforçar no capital. Apenas em 2024, os dirigentes da construtora já investiram mais de 900 mil euros na compra de títulos.
As ações da Mota-Engil voltaram a estar sob forte pressão numa sessão na última semana, com a empresa a afundar mais de 11,5% na quinta-feira — a maior queda em mais de um ano — , após uma série de cinco sessões positivas, nas quais a empresa tinha acumulado uma valorização de 10,4%.
Este movimento de fraqueza dos títulos foi aproveitado por dois gestores da empresa para reforçar no capital. Enquanto o CEO Carlos Mota dos Santos comunicou a compra de um bloco de 15.000 ações, num investimento superior a 39 mil euros, o vice-CEO, Manuel Mota adquiriu 40.000 títulos a um preço médio de 2,70 euros, o que perfaz um investimento total de 108 mil euros.
Estas aquisições realizadas por dirigentes e membros da família Mota, que controla o capital da empresa, têm sido uma constante ao longo do ano, sobretudo em períodos marcados por maiores correções das cotações. No total, as compras de dirigentes somam 914 mil euros, desde o início do ano, segundo a informação divulgada à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e compilada pelo ECO.
O líder da construtora (e membro da família que controla a empresa) tem sido o dirigente mais constante nas compras. Já foi ao mercado por oito vezes reforçar a sua posição no capital, operações nas quais comprou 40 mil títulos por perto de 129 mil euros, para passar a deter 170 mil ações, equivalentes a 0,06% do capital.
Ainda assim, coube à Mota Gestão e Participações, a “holding” da família, a maior despesa. Entre os dias 14 e 19 de junho, a família foi quatro vezes ao mercado, tendo investido perto de 600 mil euros na empresa que detém, passando a controlar 38,46% do capital.
Manuel Mota, o CFO José Carlos Nogueira e Mª Vasconcelos Mota foram outros dos dirigentes que comunicaram aquisições, mostrando que estão confiantes na evolução das ações da construtora, apesar do desaire sofrido em bolsa este ano.
É verdade que o desempenho da Mota-Engil tem sido bastante negativo este ano e nada indicava que tal pudesse acontecer. Ao nível operacional o desempenho da empresa tem sido até melhor do que tinha delineado no seu plano de negócios para os próximos anos.
“É verdade que o desempenho da Mota-Engil tem sido bastante negativo este ano e nada indicava que tal pudesse acontecer“, reconhece Pedro Barata. O gestor de ações nacionais da GNB considera que, “ao nível operacional o desempenho da empresa tem sido até melhor do que tinha delineado no seu plano de negócios para os próximos anos“.
A Mota-Engil revelou um crescimento de 51% dos lucros até setembro, para 77 milhões de euros, com uma carteira de encomendas recorde, de 14,8 mil milhões de euros, “impulsionada pela adjudicação de projetos de grande dimensão nos mercados principais”, explica a Mota-Engil. México, Angola e Nigéria representam 78% desta carteira.
“Depois da forte valorização do ano passado, é sabido que houve alguns hedge funds que resolveram especular com o título vendendo-o em bolsa na expectativa de comprar depois mais barato, ganhando dinheiro na diferença”, justifica Pedro Barata. “Quando assim é, e face à dimensão de alguns destes hedge funds, resta aos investidores de longo prazo perceberem se esta desvalorização representa uma oportunidade ou não”, realça o gestor.
Pedro Lino nota que “depois de uma forte recuperação da cotação em 2023, a Mota Engil tem corrigido substancialmente, associado às geografias onde opera de maior risco e os recentes problemas com a Duro Felguera“, explica o CEO da Optimize.
“Os principais desafios podem ser a administração Trump e a operação no México bem como a participação indireta na Duro Felguera”, enumera Pedro Lino. Já em relação às oportunidades destaca o “ciclo de obras públicas em Portugal, e a notoriedade e reconhecimento que a empresa conquistou ao longo das últimas décadas”.
A própria empresa poderia aproveitar esta forte correção [dos títulos] e sinalizar que tem tesouraria e está disponível para comprar ações nestes preços.
Feita esta análise, Pedro Lino assume que a Optimize investe na construtora em vários fundos e identifica “bastante potencial na empresa”, adiantando que “a própria empresa poderia aproveitar esta forte correção [dos títulos] e sinalizar que tem tesouraria e está disponível para comprar ações nestes preços.”
Para João Queiroz, “embora os fundamentais de longo prazo permaneçam sólidos (como o crescimento contínuo da carteira de encomendas e EBITDA), o seu desempenho no mercado reflete incertezas macroeconómicas e específicas da empresa, exacerbadas pela atuação de agentes como “short sellers” e ajustamentos regionais.”
No início de setembro foi divulgado que o hedge fund norte-americano Muddy Waters Capital Domino Master Fund entrou no capital da empresa, com uma posição curta, à data, de 0,65% precipitou a queda das ações da empresa, atirando as cotações abaixo dos 3 euros.
Entretanto, as ações mantiveram a tendência descendente, apesar deste hedge fund ter recentemente reduzido ligeiramente a participação a descoberto, que visa ganhar com a queda dos títulos, para 0,57%, de acordo com a informação divulgada no site da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).
Como 2025 encerra um relevante conjunto de incertezas e fragilidades mais relacionadas com as economias emergentes como as de África e América do Sul, o impacto de estratégias curtas ou “short selling” e a necessidade de ajustes estratégicos para lidar com mudanças regionais podem pesar de forma negativa no curto prazo.
De acordo com o administrador financeiro, a Mota-Engil foi a “vítima perfeita para um fundo abutre”. O head of trading do Banco Carregosa realça que “o setor de engenharia & construção são sensíveis aos ciclos económicos e à perceção de risco e, como 2025 encerra um relevante conjunto de incertezas e fragilidades mais relacionadas com as economias emergentes como as de África e América do Sul, o impacto de estratégias curtas ou “short selling” e a necessidade de ajustes estratégicos para lidar com mudanças regionais podem pesar de forma negativa no curto prazo.”
“Apesar de crescimento no volume de negócios e melhoria no EBITDA, alguns segmentos apresentam declínios, como o negócio de ambiente. Estas áreas podem continuar a influenciar a perceção de fragilidade de curto prazo”, acrescenta João Queiroz.
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