Dos despedimentos à negação: o que pode estar em causa na investigação ao Bloco de Esquerda?

Bloco de Esquerda pode enfrentar um processo alegado crime de falsificação de documento e de fraude contra a Segurança Social. PGR abriu inquérito para investigar o caso dos alegados despedimentos.

O Bloco de Esquerda (BE) já não pode fugir à polémica. Esta quinta-feira, a Procuradoria-Geral da República (PGR) abriu um inquérito para investigar o caso dos alegados despedimentos que aconteceram no partido. Em concreto, para investigar o caso das trabalhadoras que foram despedidas após terem sido mães e em que dois casos terão sido alvo de contratos-fantasma. Acusações que o partido já negou e que fez com que Mariana Mortágua, a líder do BE, viesse explicar que a atuação do Bloco teve um único propósito: “proteger aquelas duas trabalhadoras e encontrar condições para as proteger”.

Mas, afinal, o que pode estar em causa neste processo-crime?

À Advocatus, a associada sénior da Antas da Cunha Ecija, Isabel Araújo Costa, refere que, a confirmar-se que foram “assinados falsos ou aparentes contratos de trabalho” e que tenham sido usados de forma a “iludir disposições legais”, pode estar em causa um crime de falsificação de documento.

Podemos estar diante de um crime de fraude contra a Segurança Social, na medida em que, tanto quanto parece ter sucedido, se ficcionou a prestação de trabalho e respetivo enquadramento contributivo. Isto é, não terá, tanto quanto se veicula, existido prestação de trabalho, mas terão sido feitos os descontos legais para a Segurança Social. Descontos esses de trabalho não prestado, logo a que as trabalhadoras não teriam direito”, revela.

Para Isabel Araújo Costa, constitui contraordenação muito grave a celebração de contratos a termo cujo motivo justificativo e respetiva necessidade temporária não sejam verdadeiros, “como se diz ter sido o caso”.

“Assim, e para além do enquadramento criminal, também há uma potencial sujeição a um quadro contraordenacional – esse já da competência da Autoridade para as Condições do Trabalho -, cujas coimas podem variar entre o mínimo de 2.040 euros e um máximo de 61.000 euros, dependendo do volume de negócios da empresa e do grau de culpa do infrator”, acrescenta.

Já Madalena Caldeira, advogada da Gómez-Acebo & Pombo, defende que, apesar de desconhecer em absoluto os factos concretos, “o que estará em causa será a situação de dois alegados contratos-fantasma, em que o Bloco é suspeito de dar contratos a termo a duas funcionárias para não ter de as indemnizar pelo despedimento”.

“A ser assim, o que poderá estar em causa é que foi declarado à Segurança Social uma coisa e foram apresentados à Segurança Social documentos que atestam uma relação laboral que não existe e que, portanto, é falsa, eventualmente com o objetivo de obter uma vantagem e que seria a de não pagar a indemnização devida pela cessação do contrato”, assume.

Segundo a advogada, pode ainda questionar-se se ao “manter uma relação laboral que não existiu e no contexto da qual se efetuaram contribuições que vão beneficiar trabalhadoras em sede de prestações sociais e de reforma, quando na realidade estas estão desempregadas, não existe igualmente uma intenção de defraudar a lei”.

O procurador-geral da República, Amadeu Guerra, admitiu esta quinta-feira que havia condições para abrir uma investigação e que os “indícios que também temos são de falsificação, mas isso não significa que que se venha provar”. “Portanto, o que vamos fazer é investigação, como fazemos em todas as situações”, disse.

A coordenadora do Bloco de Esquerda (BE), Mariana Mortágua. RODRIGO ANTUNES/LUSARODRIGO ANTUNES/LUSA

Uma coisa é certa, a líder do partido, Mariana Mortágua voltou a sublinhar esta quinta-feira, após a abertura de inquérito por parte do Ministério Público, que não houve qualquer forma de contornar a lei e que querem prestar todos os esclarecimentos para apurar a verdade. Em declarações ao país, avançou que o Ministério Público não contactou o BE e, portanto, não pediu qualquer informação ou esclarecimento diretamente ao BE.

“Vemos com bons olhos esta investigação porque vai permitir, por um lado, desmentir um conjunto de medidas falsas que têm saído sucessivamente em vários órgãos até de comunicação social. Por outro lado, vai permitir também confirmar que a atuação do BE teve um único propósito: proteger aquelas duas trabalhadoras e encontrar condições para as proteger que fossem mais favoráveis às condições associadas à extinção do vínculo da comissão de serviço”, referiu.

Mortágua explicou que os trabalhadores no BE estão num estatuto de comissão de serviço que está associado aos “ciclos de financiamento” e que pode ser terminado a qualquer momento. “Naquele processo em que o BE teve de extinguir mais de 30 postos de trabalho, porque perdeu mais de metade do financiamento, essas comissões de serviço foram extintas e, nesse momento, fomos confrontados com uma decisão que era de tentar proteger duas trabalhadoras que tinham sido mães à pouco tempo”, disse. Uma versão que, no entanto, também é questionada pelo menos por uma das trabalhadoras alvo deste despedimento.

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