Da Influencer à Tutti Frutti, conheça os porquês dos nomes de “batismo” das investigações da PJ
Todas as investigações PJ têm algo em comum: um nome característico que os diferencia e que fica no ouvido da sociedade. Descubra o significado de algumas das mais mediáticas.
Dezenas e dezenas de investigações mediáticas da PJ – algumas já em fase de julgamento – ocupam o palco da justiça portuguesa e todas eles têm algo em comum: um nome característico, muitas vezes com algo de cómico, que os diferencia e que fica no ouvido. Desde a Operação Influencer até Tutti Frutti, passando pelo Marquês, todas elas ganham um nome que é escolhido com alguma razão na sua base, a maioria “batizada” pelos próprios responsáveis das unidades responsáveis pelas operações. Na origem, o batismo dos casos é muitas vezes relacionado com as circunstâncias de tempo ou lugar em que esse crime foi cometido, podendo ter a ver com detalhes do processo, seja relativo às vítimas ou aos suspeitos de crime. “Há sempre algo que se destaca numa investigação e é esse algo que se destaca e que dá o nome, geralmente”, disse Pedro Carmo ao ECO, na altura em que era diretor adjunto da PJ.
Operação Influencer
Um dos casos mediáticos mais recentes é a Operação Influencer, que envolve ex-membros do Governo e não só. No processo que investiga crimes como corrupção e tráfico de influências um dos visados foi o ex-primeiro-ministro António Costa. O nome escolhido, “Influencer”, reflete as suspeitas de influência indevida na política.
Foi em novembro de 2023 que este caso surgiu no palco dos media, com a realização de buscas à residência oficial do na altura primeiro-ministro, António Costa, e ainda buscas a ex-membros do Governo. Esta operação levou à detenção de cinco arguidos – o chefe de gabinete do primeiro-ministro, Vítor Escária; o presidente da Câmara de Sines, Nuno Mascarenhas; dois administradores da Start Campus, Afonso Salema e Rui Oliveira Neves; e o advogado Diogo Lacerda Machado, amigo de António Costa e colaborador ocasional do Governo de então – e culminou com a demissão de António Costa, a posterior queda do Executivo e a marcação de eleições antecipadas.

No total, há nove arguidos no processo, entre eles o ministro das Infraestruturas, João Galamba; o presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta; o advogado e antigo porta-voz do PS, João Tiago Silveira; e a empresa Start Campus.
Em causa estão 28 crimes: prevaricação, tráfico de influência, corrupção ativa e passiva – quanto a titular de cargo político, agravada – e recebimento indevido de vantagens quanto a titular de cargo público, agravado. Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, da Start Campus, estão a ser investigados por seis crimes. Diogo Lacerda Machado por quatro.
Tutti Frutti
Há mais de oito anos na justiça, o caso Tutti Frutti teve recentemente desenvolvimentos. No início do mês, o Ministério Público deduziu acusações contra 60 arguidos por crimes de corrupção, prevaricação, branqueamento e tráfico de influência, entre os quais autarcas do PS e do PSD e deputados de ambos os partidos.
Este processo recebeu este nome uma vez que envolve uma investigação complexa sobre alegadas trocas de favores e corrupção entre políticos e empresários em Portugal, especialmente ligados a dois partidos: PSD e PS. Uma vez que a investigação incide sobre um conjunto diversificado de casos e pessoas é um género de “mix de frutas”.
No total estão em causa 463 crimes de corrupção ativa e passiva, prevaricação, tráfico de influência, branqueamento, burla qualificada, falsificação de documento, abuso de poder e recebimento indevido de vantagem. Entre os arguidos, há deputados na Assembleia da República, presidentes de juntas de freguesia em Lisboa e vereadores na capital do PSD e do PS, suspeitos de adjudicações a empresas como contrapartida, sobretudo, à concessão de apoio político local. Alguns dos acusados suspenderam ou renunciaram entretanto aos mandatos.
Operação Marquês
O dia 21 de novembro de 2014 ficou para a história quando o país foi confrontado, com a transmissão em direto pelas televisões, de José Sócrates a ser detido na manga de um avião no aeroporto de Lisboa e a entrar, rodeado de câmaras de televisão, no carro das autoridades policiais. Estávamos a presenciar o início mediático de um dos casos da justiça mais complexos de sempre no nosso país, a Operação Marquês.
Sócrates tornava-se assim o primeiro político que tinha desempenhado funções governativas suspeito de corrupção no próprio exercício desse cargo. Esteve 288 dias detido (quase um ano em preventiva) e mais 42 em prisão domiciliária. A 11 de outubro de 2017, Sócrates foi formalmente acusado da prática de 31 crimes. Poderá deduzir-se que o nome da investigação venha da antiga morada de José Sócrates, na Rua Braamcamp, junto ao Marquês de Pombal.

O universo de arguidos — 19 pessoas individuais e nove empresas — ficou reduzido apenas ao ex-primeiro-ministro José Sócrates, ao empresário Carlos Santos Silva, ao ex-ministro Armando Vara, ao antigo banqueiro Ricardo Salgado e ao antigo motorista de Sócrates, João Perna, sendo que estes três últimos já foram entretanto julgados e condenados.
Entre os arguidos ilibados na decisão instrutória de Ivo Rosa encontram-se, por exemplo, os ex-administradores da PT Zeinal Bava e Henrique Granadeiro, o ex-administrador do Grupo Lena Joaquim Barroca, o antigo presidente da ESCOM Helder Bataglia ou o ex-administrador não executivo dos CTT Rui Horta e Costa.
José Sócrates foi acusado no processo Operação Marquês pelo MP, em 2017, de 31 crimes, designadamente corrupção passiva, branqueamento de capitais, falsificação de documentos e fraude fiscal. Porém, na decisão instrutória de 09 de abril de 2021, o juiz Ivo Rosa decidiu ilibar José Sócrates de 25 dos 31 crimes, pronunciando-o para julgamento por três crimes de branqueamento de capitais e três de falsificação de documentos.
Operação Maestro
A Operação Maestro coloca no centro dos holofotes o empresário Manuel Serrão. O arguido é suspeito de fraude na obtenção de fundos europeus de 40 milhões de euros. O Ministério Público considera o empresário e vogal da Associação Selectiva Moda “o principal mentor” de um alegado esquema na obtenção de subsídios comunitários que levou a PJ a realizar, em março de 2024, 78 buscas no âmbito desta operação, na qual são também suspeitos o jornalista Júlio Magalhães, António Sousa Cardoso, que liderou a Associação de Jovens Empresários, e António Branco e Silva.

A investigação sustenta que, pelo menos desde 2015, Manuel Serrão, António Branco e Silva e António Sousa Cardoso, “conhecedores das regras de procedimentos que presidem à candidatura, atribuição, execução e pagamento de verbas atribuídas no âmbito de operações cofinanciadas por fundos europeus, decidiram captar, em proveito próprio e das empresas por si geridas, os subsídios atribuídos à Associação Selectiva Moda e às sociedades No Less e House of Project — Business Consulting”.
A palavra Maestro foi alegada escolhida por simbolizar a ideia de alguém que orquestra ou dirige um esquema complexo, semelhante a um maestro que conduz uma orquestra, sugerindo a existência de um líder coordenando as atividades ilícitas sob investigação.
Operação Babel
A Operação Babel é relacionada com a alegada viciação de normas e instrução de processos de licenciamento urbanísticos em Gaia. Em julgamento encontram-se 16 arguidos – seis pessoas e dez sociedades -, incluindo o antigo vice-presidente da Câmara de Gaia Patrocínio Azevedo, o empresário Paulo Malafaia e Elad Dror, de origem israelita e fundador do grupo Fortera, por dezenas de crimes económicos, nomeadamente corrupção e tráfico de influências.
Em causa está a suposta viciação de normas e instrução de processos de licenciamento urbanístico em Vila Nova de Gaia em favor de promotores associados a projetos de elevada densidade e magnitude, pelo menos até 2022, estando em causa interesses imobiliários na ordem dos 300 milhões de euros, mediante a oferta e aceitação de contrapartidas de cariz pecuniário.
Entre as razões apontadas para este processo ser “batizado” de Babel está a complexidade e a multiplicidade de elementos envolvidos no caso, evocando a imagem da Torre de Babel, que na tradição bíblica simboliza a diversidade e a confusão de línguas.
Operação Vórtex
Mais uma vez, Vórtex foi o nome escolhido por representar a complexidade e a natureza envolvente do caso. A denominação remete para a ideia de um remoinho que atrai diversos elementos para o seu centro, fazendo o paralelismo com o caso que é composto por uma rede de diversas relações e possíveis irregularidades no contexto político e empresarial.
O processo está relacionado com projetos imobiliários e respetivo licenciamento, respeitantes a edifícios multifamiliares e unidades hoteleiras, envolvendo interesses urbanísticos de dezenas de milhões de euros, tramitados em benefício de determinados operadores económicos.
A operação culminou em 10 de janeiro de 2023 com a detenção do então presidente da Câmara de Espinho, Miguel Reis (PS), o chefe da Divisão de Urbanismo e Ambiente daquela autarquia, um arquiteto e dois empresários por suspeitas de corrupção ativa e passiva, prevaricação, abuso de poderes e tráfico de influências.
Em 10 de julho do mesmo ano, o Ministério Público deduziu acusação contra oito arguidos e cinco empresas, incluindo dois ex-presidentes da Câmara de Espinho, Miguel Reis e Pinto Moreira.
Da Éter ao O-negativo, lista não tem fim
A lista de nomes originais e sonantes dados a investigações da justiça portuguesa é extensa. Elencamos aqui alguns exemplo:
- Éter: Simboliza a natureza difusa e intangível das alegadas atividades ilícitas sob investigação. Esta operação incluiu buscas em entidades públicas e sedes de empresas, estando relacionada com alegadas práticas de corrupção e tráfico de influências.
- O-negativo: Este processo envolve suspeitas de corrupção relacionadas com negócios de sangue. O nome do caso refere-se ao tipo de sangue O negativo, conhecido por ser um doador universal, ou seja, pode ser transfundido a qualquer pessoa independentemente do seu grupo sanguíneo.
- E-toupeira: Esta investigação centra-se em supostos subornos oferecidos a, pelo menos, três funcionários judiciais, para a obtenção de informação nos processos relacionados com o recente “caso dos e-mails“, envolvendo um assessor jurídico da SAD do Benfica. A operação, batizada pela Polícia Judiciária (PJ) de e-toupeira. O acesso a esta informação terá sido feito através do programa de informática Citius, surgindo daí o “e-“, referente a eletrónica. Já “toupeira” foi escolhida porque é uma expressão para infiltrado, que designa pessoas que num determinado sistema ou organização obtêm ou procuram obter informação reservada e transmiti-la para fora.
- Lex: A Operação Lex investigou um alegado esquema em que juízes do Tribunal da Relação de Lisboa seriam pagos para decidir favoravelmente relativamente a pessoas ou empresas. O nome terá a ver com o facto de o caso envolver maioritariamente figuras do meio jurídico. “Lex” deriva do latim e quer dizer “lei, contrato, condição, regra, norma ou preceito”. Relembre-se a famosa expressão “dura lex, sed lex” — “a lei é dura, mas é a lei”.
- Face Oculta: O nome desta operação é inspirado, nada mais, nada menos, numa casa de alterne de Aveiro com o mesmo nome — cidade onde arrancou o processo de que o ex-vice-presidente do BCP, Armando Vara, foi arguido. O caso, que envolveu lavagem de dinheiro, corrupção política e evasão fiscal, contou com 188 sessões do julgamento, onde foram ouvidas mais de 350 pessoas entre arguidos, testemunhas, peritos e consultores.
- Tupperware: Em 2007 a PJ anunciou a detenção, na Figueira da Foz, de duas mulheres suspeitas de tráfico de droga. A operação é denominada de “Tupperware“. Acontece que o modo de operação consistia em esconder o material estupefaciente em caixas de plástico, que eram depois enterradas na areia.
- Carta Fora do Baralho: A operação “Carta Fora do Baralho”, que data de maio de 2011, não tem nada a ver com jogo mas estava sim relacionada com desvio de correspondência. A PJ e a PSP desmantelaram uma rede suspeita do desvio de correspondência que terá rendido “dezenas de milhares de euros” aos dois homens detidos e acusados de peculato, posse de armas proibidas e receptação agravada.
- Banana Mix: Em 2009, a PJ desmantelou um grupo transnacional dedicado ao tráfico de cocaína da América do Sul para a Península Ibérica. O grupo tinha elementos da Colômbia, Cabo Verde, Equador, Espanha e Portugal e estava localizado em território nacional por motivos estratégicos. A investigação resultou em duas operações policiais nos arredores do Porto, levou à apreensão de 82 quilogramas de cocaína, que tinham sido introduzidos no nosso país dissimulados em paletes de banana e mandioca. A operação ficou então conhecida como “Operação Banana Mix”.
- Rollerball: Ficou assim batizada pela PJ a operação de um processo extraído do caso BPN, em 2010, que acabou com a detenção de dois advogados e a constituição de mais seis arguidos, suspeitos de burla, fraude fiscal, falsificação de documentos, abuso de confiança, branqueamento e corrupção. A “Operação Rollerball” investigou o sistema de fraude que assentava numa lógica de “roullement” de créditos — os suspeitos utilizariam sucessivos financiamentos bancários através de sociedades que representavam ou controlavam — que terá lesado em mais de 100 milhões o BPN.
- Remédio Santo: Esta operação remonta a 2014 e ficou assim conhecida por condenar suspeitos, acusados de burlar o Serviço Nacional de Saúde (SNS) em mais de três milhões de euros, a penas efetivas até nove anos de prisão. Entre os 18 envolvidos estavam seis médicos, dois farmacêuticos, sete delegados de informação médica, uma esteticista (ex-delegada de ação médica), um empresário brasileiro e um comerciante de pão. Três dos arguidos ficaram com penas suspensas até cinco anos e dois dos envolvidos foram absolvidos de todos os crimes.
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