Exclusivo Ordem dos Advogados abre averiguação de procuradoria ilícita à empresa familiar de Montenegro
Está ser investigado se a Spinumviva executou atos que eram exclusivos de advogados até abril de 2024, já que esta é uma sociedade comercial e não de advogados.
O Conselho Regional do Porto da Ordem dos Advogados (OA) abriu uma averiguação de suspeitas de procuradoria ilícita à Spinumviva, empresa familiar de Luís Montenegro. A confirmação foi dada ao ECO/Advocatus pelo presidente do CRP, o advogado Jorge Barros Mendes. “No decurso das averiguações logo se verá que atos foram praticados e por quem”, disse.
A criação da empresa familiar do primeiro-ministro – a Spinumviva – ganhou contornos políticos este mês, levantando questões sobre o papel que o primeiro-ministro ainda terá nesta sociedade e levando o líder do Executivo a desafiar a oposição a apresentar uma moção de censura, o que acabou por acontecer, por iniciativa do PCP. E que foi chumbada.
Colocando de lado as dúvidas de potencial conflito de interesses entre o primeiro-ministro e a Solverde, em causa dúvidas relativamente aos atos praticados pela própria empresa. Se configuram, ou não, atos jurídicos que – até abril de 2024 – eram exclusivos de advogados e só poderiam ser exercidos em contexto de uma sociedade de advogados e não de uma sociedade comercial.
Desde abril de 2004 que o “Regime Jurídico dos Atos de Advogados e Solicitadores” foi alterado, definindo o alcance dos atos próprios dos advogados e dos solicitadores e tipificando ainda o crime de procuradoria ilícita. Uma alteração que surge na sequência de obrigações europeias, com a alteração da Lei das Associações Públicas Profissionais.
Os mais relevantes atos reservados aos advogados e solicitadores são no exercício de um mandato que é, no fundo, a representação legal de uma pessoa em tribunal. Mas não só.
São também os atos de consulta jurídica como a elaboração de contratos e a prática dos atos preparatórios à constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, designadamente os praticados junto de conservatórias e cartórios notariais, a negociação para cobrança de créditos ou o exercício do mandato no para reclamação ou impugnação de atos do Estado ou do Fisco.
E que são exclusivos de advogados e solicitadores e não podem ser realizados por consultoras ou empresas comerciais, como é o caso da de Montenegro. Caso aconteça, estamos perante o caso de procuradoria ilícita, punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias.
Em 2021, Luís Montenegro – ainda só um quadro social-democrata e que já levava consigo uma derrota na corrida à liderança do partido, que ficou nas mãos de Rui Rio – cria a Spinumviva e, em julho do mesmo ano, o grupo Solverde começa a pagar uma avença à empresa, que subiu para 4.500 euros mensais em maio de 2022. Nesse mesmo mês, Montenegro passa a líder do PSD mas só um ano depois decide vender a quota que detinha na sociedade comercial à mulher. Contrato esse que, perante o Código Civil, é nulo e não tem efeitos práticos, visto que o casal está casado em comunhão de adquiridos.
A empresa em questão enviou há uma semana uma explicação de três páginas em que começa por expor “as empresas que mantêm um vínculo permanente com a consultora Spinumviva na área da implementação e desenvolvimento de planos de ação no âmbito da aplicação do Regulamento Geral de Proteção de Dados”. Mas, lendo o comunicado na íntegra, depressa se percebe que os atos praticados pela empresa familiar não se limitam a assessorar empresas para aplicação do RGPD e que há indícios de prática de atos de consultoria jurídica.
E é aqui que surgem uma questão que continua sem explicação. Em que termos foram prestados serviços jurídicos de consultoria que, pela lei dos atos próprios dos advogados vigente à data, só podiam ser prestados por sociedade de advogados? Coisa que a Spinumviva não é mas cujos colaboradores são uma advogada e um jurista. Tendo sido tornado público que a empresa da família do primeiro-ministro prestou serviços jurídicos a entidades terceiras e tendo Luís Montenegro exercido os mesmos a título individual e não através de uma sociedade de advogados, podemos equacionar essa hipótese.
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