Queda de um ponto no desemprego dá folga de 340 milhões no Orçamento
Se a taxa de desemprego se mantiver um ponto percentual mais baixa do que o esperado até ao final do ano, Centeno ganha uma folga de 340 milhões de euros no Orçamento do Estado.
Por cada ponto percentual a menos na taxa de desemprego face ao que estava planeado no Orçamento do Estado, o Governo beneficia de uma folga de cerca de 340 milhões de euros no défice, o equivalente a uma ajuda de 0,2 pontos percentuais. Como? O ECO explica as contas.
O mercado de trabalho tem sido uma fonte de alegrias para o Governo de António Costa. Depois de ter surpreendido pela positiva em 2016, este ano a taxa de desemprego volta a cair acima do esperado. No Orçamento do Estado para 2017 o Executivo fez as contas assumindo 10,9%. Meses depois, quando apresentou o Programa de Estabilidade, em abril, reviu o número em baixa para 9,9%. Esta quarta-feira o Instituto Nacional de Estatística revelou que a taxa de desemprego ficou em 8,8% no segundo trimestre. Em média, nos primeiros seis meses do ano a taxa de desemprego foi de 9,5%.
Desemprego regressa a valores de 2009
Quebra de série em 2011. Fonte: INE
Que impacto tem isto no défice? O ECO foi fazer as contas. Para isso, pediu ajuda a quatro peritos: dois especialistas em contas públicas, um especialista em mercado de trabalho e um ex-secretário de Estado do Orçamento. Todos pediram para não ser identificados.
Primeiro, há que distinguir dois tipos de efeitos:
- Impacto na despesa: quando há menos desemprego, há menos prestações a ser pagas pela Segurança Social. Logo, as contas públicas sentem um alívio nos gastos — gera-se uma poupança;
- Impacto na receita: Como o desemprego tem sido acompanhado por um aumento do emprego (a população ativa até tem subido e os fluxos mostram que a maior parte dos desempregados têm passado a empregados) há mais contribuições a entrar na Segurança Social — gera-se receita adicional.
Segurança Social poupa 150 milhões de euros com subsídios
Para calcular o impacto do lado da despesa, é preciso primeiro saber quantos desempregados há a menos por cada ponto percentual que caia a taxa de desemprego. Assumindo a população ativa de 2016, verifica-se que cada ponto representa cerca de 48.800 pessoas.
Como referência da despesa pública com prestações de desemprego, o ECO foi buscar o valor de 2016: a Segurança Social gastou 1,5 mil milhões de euros, diz a Conta Geral do Estado. Este valor dá uma média de 3.130 euros por desempregado, por ano.
Gastos com o desemprego em queda
Fonte: DGO
É verdade que nem todos os desempregados recebem prestações de desemprego, mas esse efeito está compensado pelo facto de se estar a assumir uma despesa mais baixa por desempregado do que a que resultaria se fosse usado o valor médio da prestação.
Ora, multiplicando os 3.130 euros pelos 48.800 desempregados a menos que resultam da descida de um ponto da taxa percentual, verifica-se que por ano a poupança é de cerca de 150 milhões de euros.
Contribuições engordam 190 milhões de euros
Para estimar o impacto do lado da receita, o ECO está a assumir que os desempregados passam a empregados. E que vão descontar para a Segurança Social.
Como salário de referência, usou-se 805 euros brutos por mês: este é o valor que consta dos quadros de pessoal do Ministério do Trabalho para os novos trabalhadores por conta de outrem (inclui trabalhadores a full time e a part-time), referente a outubro de 2015, apurou o ECO. Ou seja, são os salários à entrada no mercado de trabalho, àquela data.
Contribuições em alta
Fonte: DGO
Multiplicando o valor bruto dos salários pelo total de contribuições a pagar à Segurança Social (34,75%, em que por norma 11% estão a cargo do trabalhador e 23,75% a cargo do empregador), e por 14 meses, atinge-se um ganho de receita na ordem dos 190 milhões de euros.
De lá para cá os salários poderão ter valorizado ligeiramente — o que subestima este número — mas também é verdade que a diminuição no número de desempregados poderá não corresponder, no final do ano, precisamente ao aumento do número de empregados — o que tem o efeito inverso.
Quanto valem 340 milhões de euros nos cofres públicos?
Tudo depende. Podem valer um défice 0,2 pontos percentuais mais baixo. Por exemplo, tudo o resto constante, o défice no final de 2017 seria de 1,3%, em vez dos 1,5% definidos como meta pelo Governo. Isto assumindo que a taxa de desemprego de 2017 será de 9,9% em vez de 10,9%, mas é provável que seja ainda mais baixa — o que a verificar-se implica uma folga ainda maior.
Também pode servir para colmatar desvios que se venham a verificar face ao que estava planeado. É certo que o Governo tem explicado que o défice orçamental do primeiro semestre em contas públicas não é representativo do movimento esperado para o conjunto do ano porque está a ser penalizado por um diferente perfil de reembolsos do IRS. Mas a UTAO já avisou que mesmo descontado este efeito, a receita fiscal está a crescer metade do ritmo previsto.
Mas a folga deste ano pode ainda servir para acomodar os desencontros das vontades das esquerdas quanto ao próximo Orçamento do Estado. O Bloco de Esquerda tem insistido que só com 600 milhões de euros se consegue baixar de forma significativa o IRS às famílias. Mas o Governo tem respondido que não tem mais de 200 milhões de euros para gastar. Se lhe somar estes 340 milhões de euros quase consegue fazer a vontade total à coordenadora do BE, Catarina Martins.
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