Que Angola deixa José Eduardo dos Santos ao seu sucessor?
Um país com debilidades estruturais, muito dependente do petróleo, com perspetivas de crescimento fraco para os próximos anos.
A 23 de agosto, Angola vai a eleições. Depois de mais de três décadas sob o comando de José Eduardo dos Santos, que economia vai encontrar o seu sucessor? Um país com um crescimento fraco, níveis de inflação elevadíssimos, uma dependência excessiva do petróleo e onde ainda é muito difícil fazer negócio.
“A economia angolana gira em torno da exploração mineira e de hidrocarbonetos, o que a torna numa das mais concentradas do mundo. O petróleo representa 30% do PIB, 95% das exportações totais e 50% das receitas públicas,” lê-se no outlook de maio de 2017, da OCDE, sobre Angola.
Em 2016, Angola deverá ter crescido 1,1%, estima a OCDE. O número ainda não é definitivo e representa uma melhoria face às primeiras projeções que tinham sido avançadas por outras organizações internacionais, como é o caso do FMI, que esperava uma estagnação completa.
[Há] deficiências de infraestruturas, dificuldades no acesso a crédito, fracas competências de gestão e falta de estratégias integradas que promovam o empreendedorismo.
Ainda assim, este é o ritmo de crescimento mais baixo desde, pelo menos, 2008. A OCDE explica que nesse ano, o PIB per capita angolano recuou para 3.514 dólares — o menor valor da década. Em 2017, a expectativa é que o crescimento melhore ligeiramente para 2,3% mas, a verificar-se, continuará a ser um desempenho pior do que o dos últimos anos.
Quanto cresce Angola?
2016 estimativa; 2017 e 2018 projeções. Fonte: OCDE
Porquê? Porque o preço do petróleo afundou e a economia é demasiado dependente desta matéria-prima. O crescimento rápido registado no passado, quando o petróleo estava mais caro no mercado internacional, não ajudou propriamente a economia a desenvolver-se. Aliás, os economistas identificam um efeito perverso: as receitas do petróleo sustentam a apreciação da moeda e esta valorização prejudica os restantes setores transacionáveis, que perdem competitividade. Além disso, os setores do petróleo, gás e minerais geraram poucos empregos e os ganhos não são distribuídos pelo resto da economia.
Por isso, quando o próximo Governo chegar ao poder, continuará a encontrar uma Angola cheia de debilidades, estrangulamentos estruturais ao crescimento, desequilíbrios e ineficiências.
Por exemplo: o consumo privado em Angola, em 2015, representava 75,8% do PIB. Mas as as exportações não iam além dos 33,9% e o investimento privado pesava 1,7% do PIB.
Consumo privado pesa mais do dobro das exportações
Dados de 2015. Fonte: OCDE
Em 2016, as exportações deverão ter recuado 10,9%, enquanto o consumo (público e privado) deverá ter aumentado 6,2%. Para este ano a OCDE antecipa uma nova queda nas exportações (de 18,1%) acompanhada por um aumento de 14,3% do consumo. O investimento poderá crescer 7%.
Como serão os próximos anos?
2016 estimativa; 2017 e 2018 projeções. Fonte: OCDE
Quando o petróleo baixa de preço, a entrada de receitas em Angola cai e como consequência o consumo público e privado fica refreado. Com a queda do consumo, os restantes setores da economia — indústria, construção e serviços — diminuem a sua atividade para se ajustarem tanto a essa diminuição de procura, como à menor disponibilidade de dólares em circulação.
O efeito da queda do petróleo também se reflete na capacidade de pagar a dívida e, subsequentemente, no próprio nível de endividamento da economia. Do lado das contas públicas, a relação é direta: por exemplo, em 2013 as receitas do petróleo chegaram a valer 32,3% do PIB (que nesse ano cresceu 6,8%). A estimativa para 2016 é que o peso não vá além dos 14,3%, devendo cair para 12,1% este ano.
Para reagir a esta quebra de receita o Governo teve já de ajustar a política orçamental. Em 2016 cortou a dotação orçamental para bens, serviços e investimentos em 45% e os subsídios aos combustíveis foram reduzidos para cerca de 1% do PIB (pesavam 5,4% em 2014). Mesmo assim, a estimativa do défice para 2016 é de 5,5%. Este ano será de 4%.
Como estão as contas públicas angolanas?
Fonte: OCDE
Do lado do setor privado, uma taxa de inflação em torno dos 30% consome rendimento disponível. Além disso, com a depreciação do kuanza (perdeu 40% do seu valor contra o dólar entre setembro de 2014 e abril de 2016) quem tem dívidas em dólares tem cada vez mais dificuldades em pagá-las.
A somar a todas as dificuldades conjunturais, há debilidades estruturais difíceis de ultrapassar. Angola ocupava o 182º lugar do ranking Doing Business 2017, do Banco Mundial. O ranking é composto por 189 economias.
O valor acrescentado da indústria angolana permanece fraco, nos 8,6%. Há “deficiências de infraestruturas, dificuldades no acesso a crédito, fracas competências de gestão e falta de estratégias integradas que promovam o empreendedorismo,” lê-se no outlook da OCDE.
No índice de corrupção Transparência Internacional ocupava a 164.ª posição, num total de 167 países. Em 2008, o último ano para o qual há dados, 36,6% da população vivia abaixo da linha de pobreza, com quase 60% da população rural nesta condição. Quase 30% da população acima dos 15 anos ainda não sabia ler, nem escrever, segundo dados compilados pela OCDE, para o período entre 2010 e 2015.
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