Diz que é um orçamento, mas não parece

Um orçamento do Estado é a expressão financeira de opções económicas. Ou deveria ser. Do que se sabe da proposta para 2017, a economia vai ficar, outra vez, à porta do ministro das Finanças.

Alguém já percebeu o que vai sair da proposta de Orçamento do Estado para 2017? Já percebemos que o governo anda à procura do exercício contabilístico e financeiro possível para conjugar o acordo das Esquerdas e as exigências de Bruxelas, mas pouco mais. Diz que é um orçamento, mas, verdadeiramente, não parece.

É claro que todos os orçamentos são a expressão da política, e da ideologia, de quem governa, e por isso ninguém pode estar verdadeiramente surpreendido com as opções que estão em cima da mesa. Mas um orçamento deve ser mais do que receitas e despesas. O problema é que, mesmo salvaguardando o facto de a proposta ainda não ser conhecida em detalhe a esta hora, do que se sabe, já não há sequer coerência nos objetivos de política económica. Quais são os números do governo para o próximo ano: um défice de 1,7% e um crescimento de 1,5%. Mas convém ter em conta qual é o ponto de partida, isto é, as contas e o crescimento de 2016 para avaliar a consistência destas previsões. É que o papel aceita tudo.

Aliás, as contradições são mais evidentes nesta proposta de orçamento do que no orçamento de 2016. Recordemos: o governo tinha um modelo económico assente na devolução de rendimentos agressiva e que teria efeitos no consumo privado e, logo, no investimento, na criação de emprego e na economia. O primeiro choque negocial com Bruxelas, no início deste ano, pôs em causa este objetivo, simplesmente porque não era credível tanto bodo aos pobres sem consequências. Nesse momento, a estratégia do Governo e do BE e PCP incorporaram medidas de aumentos de impostos diretos que desfigurara orçamento. Como afirmou António Costa há dias, é preciso fazer escolhas. Costa fê-las. Com os resultados económicos conhecidos.

Agora, para 2017, aumentam vários impostos indiretos, alguns dos quais com taxas já elevadas, são criados novos impostos como o do património, que também afeta as empresas, e a ‘fat tax’ para permitir aumentos de pensões claramente acima da inflação. E a redução da sobretaxa de IRS será aplicada a prestações.

A proposta de orçamento – a prestações nas pensões e na redução da sobretaxa de IRS – dá de um lado e tira do outro, atira de forma avulsa a impostos onde ainda haverá margem de crescimento da receita e pouco mais. É curto. E sobretudo não é um orçamento económico. Não promove a poupança, pelo contrário, não incentiva o investimento. Nem sequer o investimento público. E até os setores que estão a criar emprego, sobretudo o turismo, vão também ser apanhados por esta política fiscal.

É melhor baixar as expetativas. Não será com este orçamento que vamos mudar de vida, não será com este orçamento que Portugal vai atrair investimento, que a economia vai crescer acima dos anémicos 1%. Se ao menos permitir que Portugal saia do procedimento de défices excessivos e se continuar a garantir o acesso da República aos mercados, dar-me-ei por satisfeito.

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