Catalunha: se Espanha abrandar mais, Portugal vai atrás? Depende
O Governo espanhol reviu em baixa a projeção de crescimento para 2018. Mas se este abrandamento se justificar pela incerteza na Catalunha, não é certo que Portugal saia mesmo a perder.
O Executivo de Mariano Rajoy reviu em baixa o crescimento previsto para a economia espanhola no próximo ano. Em vez de 2,6%, Espanha deverá afinal crescer 2,3%. O habitual é antecipar-se que um abrandamento do ritmo da atividade económica do lado de lá da fronteira trará um arrefecimento também do lado de cá. Mas, desta vez, não é líquido que assim seja, admitem os economistas.
Tudo depende da razão do abrandamento do PIB. Se, de facto, a economia espanhola crescer menos do que o inicialmente previsto por causa da instabilidade da Catalunha, isso até pode não ser prejudicial para Portugal. Ainda esta quinta-feira o Governo de Madrid, liderado por Mariano Rajoy, fez saber ao Executivo da Catalunha, encabeçado por Carles Puigdemont, que poderá avançar com os procedimentos previstos no artigo 155 da Constituição para restaurar os termos em que a autonomia é legal. Ou seja: a incerteza e instabilidade parece estar para durar, uma vez que não há um entendimento ou uma abertura clara para o diálogo à vista.
"Se for só o país a crescer menos, é evidente que o impacto em Portugal será negativo. Mas se o abrandamento resultar do problema da Catalunha, Portugal pode beneficiar de um redirecionamento do turismo e esse efeito compensar os outros.”
“Um abrandamento do crescimento de Espanha pode sempre afetar Portugal,” diz Luís Aguiar-Conraria, economista e professor na Universidade do Minho. “Se for só o país a crescer menos, é evidente que o impacto em Portugal será negativo,” frisa. “Mas se o abrandamento resultar do problema da Catalunha, Portugal pode beneficiar de um redirecionamento do turismo e esse efeito acabar por compensar os outros,” admite.
Ou seja, em circunstâncias normais, quando Espanha abranda é normal que Portugal também abrande. Isto porque Espanha é o principal parceiro comercial da economia portuguesa, respondendo por cerca de 25% de todas as exportações lusas — a título comparativo, veja-se que vale tanto como todos os mercados extracomunitários juntos. Se em Espanha se consome menos, é de esperar que as importações de produtos portugueses fiquem prejudicadas.
"Há ainda o efeito de incerteza nos mercados. Temos visto os spreads de Espanha face à Alemanha a alargar-se e isso teve já um impacto em Itália e em Portugal.”
Mas o caso atual pode mudar esta conclusão, caso o abrandamento resulte especificamente da situação catalã, conforme justificou o Governo espanhol. “A verificar-se esse efeito, talvez no turismo pudéssemos beneficiar de algum impacto positivo. Perante uma situação de instabilidade e de manifestações haver algum turismo redirecionado para Portugal,” admite também Rui Serra, economista-chefe do Montepio, lembrando o efeito provocado em Paris depois da ocorrência de atentados terroristas.
Em entrevista à Reuters, esta quarta-feira, o ministro das Finanças Mário Centeno reconheceu esta mesma possibilidade. Embora admita que a turbulência na Catalunha é “uma preocupação”, ressalva que a “estabilidade política faz Portugal distinto daquilo que é essa turbulência política e ajudará seguramente a atrair mais investimento, mais turismo, mais pessoas.”
Já a nível do redirecionamento do consumo de bens — há empresas catalãs que temem um boicote aos seus produtos — seria preciso saber se também aqui a oferta portuguesa poderá substituir a catalã.
Ainda assim, Rui Serra lembra outro impacto potencial de um arrastamento da instabilidade na Catalunha: “Há ainda o efeito de incerteza nos mercados. Temos visto os spreads de Espanha face à Alemanha a alargar-se e isso teve já um impacto em Itália e em Portugal. Esta também é uma via de impacto a considerar.” Esta quinta-feira, com a troca de ameaças entre o governo catalão e o Executivo central, os juros da dívida espanhola aceleraram, o euro perdeu terreno e as bolsas europeias entraram em queda.
(Artigo atualizado às 12h40)
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