Celebrar como se fosse 2009

  • Pedro Miguel Silva
  • 15 Dezembro 2017

Pela primeira vez nos 20 anos em que o estudo é realizado, Portugal é o país mais otimista de todos os analisados e aquele onde se observou a maior evolução face ao ano passado.

Possessing is not as important as it once was. Accessing is more important than ever”, Kevin Kelly (The Inevitable)

O principal destaque do Estudo de Natal da Deloitte deste ano é a evolução muito favorável das expectativas dos consumidores portugueses em relação à sua situação económica e ao poder de compra.

Pela primeira vez nos 20 anos em que o estudo é realizado, Portugal é o país mais otimista de todos os analisados e aquele onde se observou a maior evolução face ao ano passado. Este ano, 39% dos inquiridos percebe a situação atual como positiva, comparado com 15% no ano passado, enquanto apenas 20% percebe a situação atual como negativa, comparado com 49% o ano passado. O saldo entre respostas positivas e negativas à evolução do poder de compra evoluiu de -23% para +2%.

Embora a evolução das expectativas dos portugueses tenha sido extremamente favorável, o mesmo não se pode dizer relativamente às intenções de consumo.

Depois de uma queda abrupta entre 2009 e 2014 no orçamento declarado para a quadra natalícia, de 620 para 270 euros por agregado familiar, observámos, nos últimos dois anos, uma recuperação. Em 2016 o valor registado foi de 359 euros e este ano de 338 euros, o que representa uma ligeira redução face ao ano anterior.

Utilizando o ano de 2009 como base de comparação para estes dois indicadores – avaliação do estado atual da economia e consumo esperado na quadra natalícia – observamos que, depois de três anos a evoluir no mesmo sentido, parece ter deixado de haver correlação entre a forma como é avaliada a conjuntura económica e a disponibilidade para o consumo. Vemos duas possíveis causas para esta ocorrência.

Por um lado, o período prolongado de maior instabilidade e incerteza face ao futuro, vivido entre 2009 e 2014, poderá ter mudado estruturalmente os hábitos de consumo da população residente em Portugal. O consumidor ter-se-á tornado menos impulsivo, procurando fazer uma gestão mais ponderada do seu orçamento e dos seus atos de consumo.

Por outro lado, esta foi também a década em que a utilização de dispositivos digitais móveis se massificou, viabilizando modelos de transmissão de valor baseado na utilização em vez da posse. Artigos que eram popularmente transmitidos como bens, tais como filmes, música ou jogos, são hoje consumidos como serviços digitais. As respetivas indústrias sofreram também uma forte desmonetização, com as principais plataformas a disponibilizar ao consumidor versões gratuitas de serviços de streaming, que remuneram os criadores de conteúdos de forma alternativa, normalmente através da publicidade.

Independentemente da causa – económica, demográfica, social ou tecnológica – parece claro que a última década assistiu a uma mudança significativa, não só no perfil de consumo, como também no papel que este desempenha na vida das pessoas.

Hoje definimo-nos menos pelos bens que possuímos e mais pelas experiências que vivenciamos. À medida que a nossa presença digital ganha importância, diminui a relevância social da posse. Por exemplo, nas redes sociais, partilhamos mais fotografias de saídas com amigos do que de bens comprados.

Estima-se que a conjuntura económica em Portugal continue a evoluir favoravelmente no médio prazo. O consumidor também evoluirá, embora de forma mais incerta. A única certeza é que já não voltaremos a 2009.

*Pedro Miguel Silva é partner da Deloitte.

  • Pedro Miguel Silva

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