Prova dos 9: Nova lei não aumenta dinheiro dos partidos?
São duas frases de António Costa que vão ser testadas na Prova dos 9 do ECO, à luz do diploma de Belém que vetou as novas regras do financiamento partidário.
O tema voltou a entrar na agenda este fim de semana, depois de Ana Catarina Mendes, no programa Parlamento da RTP, ter garantido que o PS mantém “todas as posições” sobre a polémica lei do financiamento partidário, desde o fim do teto da angariação de fundos à devolução integral do IVA.
António Costa foi confrontado com esta posição da secretária-geral adjunta do seu partido, e procurou justificar o facto de os socialistas insistirem numa lei que já foi vetada por Marcelo Rebelo de Sousa. À entrada para a reunião da Comissão Nacional do partido, o secretário-geral do PS fez duas afirmações:
As afirmações
- “Não se trata de afrontar o Presidente da República, que foi aliás muito explícito na sua mensagem, não pondo nenhuma reserva de fundo quanto à lei” e “dizendo simplesmente que deveria ter sido objeto de um debate mais alargado”.
- “Esse debate permitirá perceber-se que [a nova lei] não terá qualquer interferência sobre processos de impugnação fiscal relativos ao IVA que estão em tribunal e que não aumenta o dinheiro público ou privado a favor dos partidos”.
Os factos
É verdade que no diploma em que vetou as novas regras o Presidente da República “simplesmente” pediu “um debate mais alargado”? E é verdade que as alterações propostas à lei não aumentam “o dinheiro público ou privado a favor dos partidos”?
O ECO foi testar estes duas afirmações do primeiro-ministro à luz do diploma publicado no dia 2 de janeiro no site da Presidência da República em que Belém devolveu, “sem promulgação, o decreto da Assembleia da República respeitante ao financiamento partidário”.
Nessa comunicação, Marcelo recorda que o decreto submetido à promulgação contém dois tipos de matérias: a primeira, que esteve na base da sua elaboração, respeita à fiscalização das finanças partidárias pela Entidade das Contas e Financiamentos Políticos e pelo Tribunal Constitucional. Esta parte não suscitou reservas a Belém.
A segunda parte do decreto, que Marcelo qualificou como “outras disposições avulsas”, e que dizem respeito ao modo de financiamento dos partidos, já não encontrou tanta simpatia por parte do Presidente da República.
No diploma, Marcelo recorda que sobre esta matéria há várias posições: desde aqueles que defendem a redução drástica das receitas e das despesas partidárias, aos que querem um “aumento sem limites”, passando por soluções intermédias de ajustamentos periódicos do limite. E ainda há correntes que defendem um financiamento público, outros privado e ainda uma terceira via que passa por soluções mistas.
Então por que é que Marcelo resolveu chumbar o diploma? A resposta a esta pergunta permite fazer a Prova dos 9 às duas frases de António Costa.
Prova dos 9
1. “Não se trata de afrontar o Presidente da República, que foi aliás muito explícito na sua mensagem, não pondo nenhuma reserva de fundo quanto à lei” e “dizendo simplesmente que deveria ter sido objeto de um debate mais alargado”.
É verdade que Marcelo, ao elencar as várias posições possíveis sobre esta matéria, não coloca “nenhuma reserva de fundo quanto à lei”. Mas não a chumbou “simplesmente” porque “deveria ter sido objeto de um debate mais alargado”.
É verdade que Belém pediu “publicidade e transparência” na discussão da lei, mas a razão objetiva aventada para o chumbo foi a ausência de “uma palavra justificativa na Exposição de Motivos”, ou seja, segundo Marcelo “o que não pode haver é decisão sem que seja apresentada qualquer justificação para a opção do legislador”.
Resumindo, é verdade que o Presidente pede um debate mais alargado, mas não é “simplesmente”. Pede mais: quer saber as razões e os motivos que justificam a proposta de alteração à lei.
2. “Esse debate permitirá perceber-se que [a nova lei] não terá qualquer interferência sobre processos de impugnação fiscal relativos ao IVA que estão em tribunal e que não aumenta o dinheiro público ou privado a favor dos partidos”.
Recorde-se que o PS tem várias ações no Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa contra a Autoridade Tributária por recusa de reembolso do IVA gasto em várias campanhas eleitorais. A dúvida se a nova lei se aplica de forma retroativa colocou-se já que na redação, os deputados escreveram que “a presente lei se aplica aos processos novos e aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor que se encontrem a aguardar julgamento”.
Sobre este ponto específico, a comunicação do Presidente da República é omissa. Mas a frase de António Costa em que o primeiro-ministro assume que a nova lei “não aumenta o dinheiro público ou privado a favor dos partidos” encontra resposta na nota da Presidência. E não é concordante com a visão de António Costa. Escreve o Presidente da República que as alterações propostas representam “uma mudança significativa no regime em vigor: o fim de qualquer limite global ao financiamento privado e, em simultâneo, a não redução do financiamento público, traduzida no regime de isenção do IVA. Tudo numa linha de abertura à subida das receitas, e, portanto, das despesas dos partidos.”
Resumindo, na leitura de Marcelo, as alterações à lei, se aprovadas, iriam resultar em mais dinheiro público ou privado em favor dos partidos. Aliás, os partidos nem sequer pediram um estudo para avaliar impacto financeiro da lei, tal como o ECO noticiou este sábado.
À luz do diploma de Belém que devolveu, sem promulgação, a lei ao Parlamento, as duas afirmações de António Costa — a de que Marcelo chumbou “simplesmente” porque “deveria ter sido objeto de um debate mais alargado” e a de que a nova lei não aumenta o dinheiro público ou privado a favor dos partidos — estão erradas.
A lei do financiamento partidário será reapreciada depois do congresso do PSD, agendado para dos dias 16 a 18 de fevereiro.
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