Sobretaxa inconstitucional? Conheça os argumentos
Tiago Duarte diz que pode estar em causa o princípio da confiança. Bacelar de Vasconcelos discorda.
Em 2017, e ao contrário do que chegou a estar previsto em lei, a sobretaxa de IRS continuará a ser aplicada. A retenção na fonte vai desaparecendo gradualmente ao longo do ano, consoante o nível de rendimentos, mas em 2018, os contribuintes poderão ter de acertar contas com o Fisco. A manutenção da sobretaxa levanta dúvidas de constitucionalidade? Há argumentos a favor e contra.
“Existe uma lei aprovada há menos de um ano que dizia que a sobretaxa não seria aplicada aos rendimentos que as pessoas auferissem em 2017. E agora a proposta de Orçamento vem dizer que afinal a sobretaxa vai ser aplicada aos rendimentos de 2017. Isto pode pôr em causa o princípio da confiança“, explica ao ECO o constitucionalista Tiago Duarte.
"Existe uma lei aprovada há menos de um ano que dizia que a sobretaxa não seria aplicada aos rendimentos que as pessoas auferissem em 2017. E agora a proposta de Orçamento vem dizer que afinal a sobretaxa vai ser aplicada aos rendimentos de 2017. Isto pode pôr em causa o princípio da confiança.”
Para o sócio da PLMJ, gerou-se o “equívoco” de que a sobretaxa vai desaparecer ao longo de 2017, “mas não é verdade”. “Vai aplicar-se a todos os rendimentos de 2017 — de janeiro a dezembro –, o que vai desaparecendo é a retenção na fonte, mas isso é apenas uma antecipação de um pagamento e depois faz-se o acerto final”, concretiza.
Já Pedro Bacelar de Vasconcelos tem uma leitura diferente. “O princípio da confiança, se não for bem compreendido e se fosse aplicado indiscriminadamente, impedia qualquer alteração do ordenamento jurídico. Não valia a pena fazermos mais leis porque qualquer lei que viesse alterar o que está previsto nas anteriores iria violar expectativas.” Por isso, o constitucionalista e deputado do PS não vê “onde nem como” esta alteração pode “alterar de forma substancial as expectativas das pessoas”.
"O princípio da confiança, se não for bem compreendido e se fosse aplicado indiscriminadamente, impedia qualquer alteração do ordenamento jurídico. Não valia a pena fazermos mais leis porque qualquer lei que viesse alterar o que está previsto nas anteriores iria violar expectativas.”
Mas para Tiago Duarte, há diferenças a ter em conta. “Uma coisa são governos alterarem leis”, outra coisa “é uma promessa do Governo de que não vai alterar uma lei e depois alterar a lei”. O especialista sublinha que o Governo não precisava de ter aprovado o diploma que define o fim da sobretaxa em 2017 — sem isto, era possível dizer que “as pessoas tinham uma esperança, mas não era expectativa”.
“Não é normal aprovarem-se leis a dizer que vão acabar leis no ano seguinte; as leis acabam quando têm de acabar”, indica Tiago Duarte, acrescentando que esta iniciativa “criou, sem necessidade, uma expectativa acrescida de que a sobretaxa ia acabar”. E agora “menos de um ano depois, e sem ter havido uma alteração de circunstâncias justificativa para isso, o Governo vem acabar com essa expectativa”, remata.
Na semana passada, o fiscalista Nuno Barnabé, também da PLMJ, defendeu que era preciso analisar ainda outra “eventual inconstitucionalidade”, referindo-se também à eliminação faseada da retenção na fonte. “Não me parece haver justificação suficiente ou razoável para tratarmos desigualmente os contribuintes quando as próprias taxas de retenção na fonte já são diferentes”, afirmou, citado pela Lusa, numa conferência organizada pela Faculdade de Direito da Universidade Católica e pela consultora PricewaterhouseCoopers (PwC).
No entanto, para Tiago Duarte esta é uma questão “lateral”, apontando para “técnicas” diferentes de “antecipar o pagamento”. Bacelar de Vasconcelos também não encontra aqui qualquer problema, indicando que está em causa uma “gradual aproximação” ao “horizonte temporal previamente fixado”.
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