Crédito fiscal à dona do Montepio é “criatividade contabilística para tapar os olhos”, diz Bagão Félix
O antigo ministro das Finanças defende que os partidos devem liderar a luta contra a opção de dar um crédito fiscal à mutualista Montepio e que o IRC não pode andar "ao sabor das circunstâncias".
“Parece-me uma criatividade contabilística para tapar os olhos”. É desta forma que António Bagão Félix classifica, ao ECO, a solução encontrada para permitir que as contas individuais de 2017 da Associação Mutualista Montepio apresentassem capitais próprios positivos de 500 milhões de euros. Em causa está um crédito fiscal de 800 milhões de euros que, na opinião do antigo candidato à associação mutualista, “não é uma ilegalidade”, mas “uma ficção que não tem a ver com a realidade”.
Para o antigo ministro das Finanças e da Segurança Social, a Associação Mutualista “é uma IPSS e não uma empresa”. “Agora vai sujeitar-se a IRC apenas porque pode criar um proveito diferido que transforma as contas estruturalmente negativas em contas conjunturalmente positivas”, sublinhas. Em causa está o pedido da instituição liderada por Tomás Correia para deixar de ficar isenta de IRC, tal como avançou o ECO em primeira mão. O objetivo último desta iniciativa era beneficiar do regime fiscal que empresas e bancos têm — dos créditos fiscais — e refletir esse efeito fiscal positivo nas suas contas de 2017, nomeadamente ao nível dos capitais próprios.
[A Associação Mutualista] é uma IPSS e não uma empresa. Agora vai sujeitar-se a IRC apenas porque pode criar um proveito diferido que transforma as contas estruturalmente negativas em contas conjunturalmente positivas.
“Não é a galinha dos ovos de ouro, mas sim dos ovos de chumbo“, frisou Bagão Félix, lembrando que não tem informação privilegiada sobre este tema e que apenas tem conhecimento do que lê na comunicação social. Para o conselheiro de Estado esta operação “é uma criatividade” que lhe “parece pouco legítima do ponto de vista da ética mutualista”. “Parece-me discutível”, acrescenta, frisando, contudo, que “não se trata de uma ilegalidade”. “Não é esse o ponto”, garante.
Lembrando que a Associação Mutualista está sob a alçada do ministro do Trabalho e da Segurança Social, Vieira da Silva, e não das Finanças, Bagão Félix acrescenta, contudo, que “é proprietária única de uma entidade sob a alçada do Banco de Portugal”. Ainda assim, o antigo ministro das Finanças considera que para emendar a mão — “dizer alto e para o baile” — é necessário que “os partidos políticos entrem em ação”. “Os partidos devem liderar esta luta”, acrescenta. Na sua opinião “não se trata de um problema de supervisão”, mas antes de o “Estado proteger os interesses dos mutualistas”.
A oposição de Bagão Félix à entrada da Santa Casa no Montepio é conhecida, mas usar o crédito fiscal para resolver os problemas da associação mutualista é “tapar o sol com a peneira”, usar uma “contabilidade absolutamente fantasiosa”. O responsável não percebe como se pode “pressupor que a instituição vai ter capacidade de gerar lucros futuros para abater o IRC de quase 600 milhões de euros”. “O IRC não pode ser uma questão ao sabor das circunstâncias”, concluiu.
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