Morreu o empresário Pedro Queiroz Pereira

Pedro Queiroz Pereira era dono da Semapa e da Navigator, duas das maiores empresas portuguesas. Na última mensagem aos acionistas, PQP mostrou "algum desencanto" por causa do travão aos eucaliptos.

Pedro Queiroz Pereira era dono da Semapa e da Navigator, duas das maiores empresas portuguesas. A notícia da morte foi avançada em primeira mão pela edição online do jornal Expresso. Pedro Queiroz Pereira tinha 69 anos.

Pedro Queiroz Pereira era natural de Lisboa e tinha interesses no setor papeleiro e hoteleiro, contando com ativos como o grupo Semapa (Secil e Navigator) e Hotel Ritz.

Marcelo Rebelo de Sousa já veio lamentar a morte de Pedro Queiroz Pereira. “O Presidente Marcelo Rebelo de Sousa apresenta suas sentidas condolências à família de Pedro Queiroz Pereira, lamentando o prematuro desaparecimento desse grande industrial português“, lê-se numa nota publicada no site da Presidência.

No ranking publicado em julho pela revista Forbes, PQP, como era conhecido, aparecia como o quinto na lista das maiores fortunas em Portugal, avaliada em 1.129 milhões de euros. Segundo a revista Exame, era detentor de uma fortuna avaliada em 779 milhões de euros (em conjunto com a mãe), o que fazia dele o sétimo mais rico do país.

PQP tinha uma postura discreta e nos últimos anos afastou-se da presidência executiva das empresas da qual era acionista, ficando a desempenhar o cargo de chairman. É o caso da Semana, da Navigator e ainda da cimenteira Secil onde era presidente do conselho da administração. A Navigator era uma das joias do seu património, representando 3 % do total de bens exportados por Portugal, tendo um volume de negócios que representa 1% do PIB. Mais de 50 % do total da energia produzida em Portugal a partir de biomassa é gerada pela The Navigator Company e 5% da produção total de energia elétrica em Portugal é gerada pela empresa.

A guerra com Ricardo Salgado

Uma das últimas guerras que travou foi com Ricardo Salgado, envolvendo a irmã Maude Queiroz Pereira, e que culminou com uma separação de ativos dentro da família e o fim das participações cruzadas entre as famílias Queiroz Pereira e Espírito Santo. PQP suspeitava que o grupo GES estaria indiretamente, através de uma participada, a tentar uma tomada hostil da Sodim, a holding da família Queiroz Pereira que controlava a Semapa e a Portucel.

Na guerra quem perdeu foi o banqueiro. Foi nessa altura que PQP garantiu, dentro da família, o controlo dos ativos mais valiosos. Além disso, PQP conhecia por dentro o grupo Espírito Santo e reuniu um dossier com informação sobre empresas do universo Espírito Santo que entregou ao Banco de Portugal, em setembro de 2013. Foi talvez o primeiro a expor, nos bastidores e publicamente, as ligações perigosas existentes no universo GES e alegadas irregularidades, e ajudou a desmascarar e a derrubar um império com quase 150 anos.

Pedro Queiroz Pereira na Comissão Parlamentar de Inquérito à gestão do BES e do Grupo Espírito Santo, em dezembro de 2014.MÁRIO CRUZ/LUSA

E a batalha pelo controlo da Cimpor

Mas as fissuras entre as famílias Espírito Santo e Queiroz Pereira vêm de trás. Nesse ano, Pedro Queiroz Pereira junta-se à Holderbank para lançar uma OPA sobre a Cimpor, numa operação de 4,5 mil milhões de euros e que envolveu o Santander (o BES seria co-líder nos planos iniciais de PQP). Conta o jornalista Filipe Fernandes, no livro ‘As Vítimas do Furacão Espírito Santo‘, que “havia sinais de movimentações que partiam do ministro das Finanças Joaquim Pina Moura, para que Ricardo Salgado encabeçasse a resistência à OPA de Pedro Queiroz Pereira sobre a Cimpor. O BES surgiu, pouco depois, a apoiar a francesa Lafarge na compra de 17% da cimenteira nacional, o que contribuiu para a OPA ser travada, sinal de que estava ao lado de Pina Moura e contra Pedro Queiroz Pereira”.

Pedro Queiroz Pereira considerou que o GES se colocara “contra um sócio com quem tem uma ligação com 70 anos”, tendo na altura acusado Ricardo Salgado de traição. Sem papas na língua, em junho de 2001, PQP deu uma entrevista ao Expresso e anunciou que sairia da administração do BES e chamava “mentiroso” da Pina Moura, na altura ministro de António Guterres. A Cimpor acabaria por ser entregue ao bloco Teixeira Duarte, BCP e Lafarge.

Semapa, Portucel e os 500 milhões em Setúbal

A Cimpor seria para juntar ao portfólio dos cimentos do grupo, que na década de 90 comprou a Secil. Perdida a Cimpor, o grupo ganharia músculo e dimensão, em 2004, ao comprar 30% da Portucel, uma gigante do setor do papel.

A compra de um bloco de 30% de capital da Portucel, em junho de 2004, anteriormente detido pelo Estado Português, e a subsequente OPA realizada em setembro, permitiram ao Grupo Semapa assegurar uma participação maioritária, correspondente a 67,1 % do capital social. A Semapa teve de alienar alguns ativos, como a Enersis e 49% da Secil para financiar a compra.

Na privatização, prometeu e cumpriu. Quatro anos mais tarde, o grupo Portucel Soporcel lançou a primeira pedra da sua nova fábrica de papel em Setúbal, na qual investiu mais de 500 milhões de euros, para acelerar o ritmo de crescimento da empresa. Em 2009, na inauguração da nova fábrica, Pedro Queiroz Pereira disse que “o grupo passará a representar cerca de 4% do total das exportações nacionais”, quando a nova fábrica atingisse a plena capacidade, em 2011. “Este investimento possibilitará ao Grupo reforçar a sua presença na Europa e EUA, aumentando igualmente a sua penetração noutros mercados internacionais”, referiu. Assim aconteceu.

 

A última mensagem aos acionistas

O empresário, em 2016, numa entrevista ao jornal Expresso, chegou a ameaçar cancelar os investimentos que a Portucel (antiga denominação da Navigator) tinha previsto para Portugal, na sequência da decisão do Governo de travar a expansão da área de eucalipto no país, no âmbito do acordo alcançado com o Partido Ecologista os Verdes. Um tema polémico que regressou à agenda política depois dos incêndios de Pedrógrão Grande e de outubro de 2017.

No último relatório e contas da empresa, relativo a 2017, PQP mantinha uma visão muita crítica sobre a política para o eucalipto, a matéria-prima para a produção do papel. Este é um excerto da última mensagem de Queiroz Pereira aos acionistas da Navigator, em que o empresário mostrava “algum desencanto”.

“Esta colaboração [com fornecedores], realizada de forma direta e em cooperação com outras entidades, tem permitido que a fileira florestal do eucalipto tenha em Portugal uma vitalidade que outros setores ganhariam em replicar, introduzindo uma dinâmica concorrencial que fomentaria a modernização de todo o setor florestal.

É o que eu esperaria que se verificasse, e o que seria vantajoso que acontecesse. Em vez de medidas positivas, porém, anunciam­-se barreiras e obstáculos à plantação e replantação de eucalipto, que é discriminado em relação a outras fileiras florestais, sem qualquer justificação económica ou ambiental e com a consequência, imediata e a prazo, de um ainda maior abandono de propriedades rurais em Portugal.

Haverá, como é óbvio, o agravamento do já muito oneroso peso das importações de matéria­-prima para a indústria de pasta de eucalipto. Perdem as empresas deste setor, que veem agravada a sua competitividade externa, e perde o País, sob a forma de escoamento de divisas e de destruição de postos de trabalho.

Devo reconhecer que esta perspetiva me provoca algum desencanto, por me obrigar a concluir que, em vez de se melhorar os nossos fatores endógenos de competitividade, se torna cada vez mais difícil a vida das empresas produtivas e mais arriscados os investimentos. Quando, um pouco por todo o lado, renascem, sob formas mais ou menos encapotadas, barreiras protecionistas, bem se dispensava este levantar artificial de obstáculos internos. Decididamente, não parece ser este o caminho para evitar a desindustrialização.”

PQP, o piloto de automóveis

Pedro Queiroz Pereira viveu no Brasil entre 1975 e 1987, país para onde se mudou a família depois das nacionalizações.

Antes de ser um empresário reconhecido, Pedro Queiroz Pereira era famoso pelo nome de guerra nas corridas de automóveis, PQP, como recorda o Dinheiro Vivo neste perfil sobre o empresário: “Como muitos herdeiros dos grandes industriais cujas empresas foram nacionalizadas, Queiroz Pereira ruma ao Brasil depois da revolução. Vive uma vida descontraída, entre a gestão de alguns negócios da família e a paixão pela competição automóvel, tornando-se amigo do piloto brasileiro Ayrton Senna”.

(Notícia atualizada às 10h30)

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