O que é que Espanha tem e nós não? Saúde

A Saúde é um dos parâmetros para medir competitividade. Espanha lidera neste ranking. Em Portugal, o fraco investimento e as disparidades regionais não ajudam.

Capacidade produtiva, flexibilidade do mercado de trabalho ou eficiência na gestão são apenas alguns dos fatores em que se pensa quando o tema é competitividade. Mas as condições sociais são preponderantes para estabelecer um ponto de partida para as sociedades conseguirem aumentar condições de vida e gerarem recursos. É o caso da Saúde.

Portugal é o 23º país mais competitivo do mundo no que diz respeito à Saúde, de acordo com o “The Global Competitiveness Report 2018″, no qual o Fórum Económico Mundial comparou 137 economias mundiais. Neste parâmetro, o ranking é liderado por quatro regiões, incluindo Japão, Singapura ou a Região Administrativa de Hong Kong. Espanha também está no topo da lista.

A proximidade geográfica e cultural faz com que os vinte lugares de diferença no ranking pareça um fosso entre Portugal e Espanha. A questão é: afinal, o que é que a Saúde espanhola tem que a portuguesa não tem?

O indicador usado pelo Fórum Económico Mundial é medido através da esperança média de vida ajustada, ou seja, o número de anos de vida que se espera que um recém-nascido viva de boa saúde. “Indivíduos mais saudáveis têm mais capacidades, físicas e mentais, são mais produtivos e criativos e tendem a investir mais na educação à medida que a esperança média de vida aumenta. Crianças mais saudáveis desenvolvem-se em adultos com maiores capacidades cognitivas”, explica o Fórum Económico Mundial para justificar a inclusão da Saúde como um dos parâmetros para medir competitividade.

Em Portugal, a esperança média de vida situa-se nos 81,3 anos, tendo aumentado nos últimos quatro anos, ficando quase meio ano acima da média da União Europeia. No entanto, persiste uma diferença substancial entre homens (78,1 anos) e mulheres (84,3 anos), tal como acontece em outros países europeus. Em comparação com Espanha, a esperança média de vida de um recém-nascido português é dois anos menor.

Cicatrizes da crise na Saúde

Se na esperança média de vida, os países da Península Ibérica ficam acima da média do Velho Continente, em sentido contrário, no que diz respeito ao investimento na Saúde comparam negativamente. Em ambos os casos, as cicatrizes da crise persistem marcadas no setor da Saúde, de acordo com os relatórios “State of Health in the EU”, elaborados em conjunto pela Comissão Europeia (CE) e pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).

O gasto na Saúde por cada pessoa foi de 1.989 euros, em 2015, cerca de 30% menos que na média europeia ajustada ao poder de compra de 2.797 euros. “O aumento estável dos gastos com Saúde que aconteceram desde 1995 foram revertidos depois de 2010, quando a recessão económica e a consolidação orçamental cortaram o investimento em cerca de um ponto percentual, de 9,8% para 9% do PIB em 2015, em comparação com 9,9% na média da UE”, revela o relatório sobre Portugal.

“A necessidade de racionalizar os gastos do setor público teve efeitos profundos no setor da Saúde. A despesa do Governo com Saúde caiu mais que em outros setores públicos”, aponta, sublinhando que a parcela do Orçamento do Estado atribuída à Saúde desmoronou desde 2011, tendo chegado a 66% no ano passado, face a 79% na média europeia.

Já no caso de Espanha, os gastos per capita com Saúde foram 2.374 euros, ainda assim ligeiramente abaixo da média europeia. Cerca de 71% da despesa com a Saúde espanhola é financiada por dinheiros públicos, mas a Europa deu uma ajuda. No período entre 2014 e 2020, Espanha recebeu cerca de 500 milhões de euros em fundos comunitários e estruturais para investir no sistema de Saúde, incluindo investigação média e desenvolvimento, bem como eHealth.

“Uma série de medidas de emergência foram postas em prática após a crise económica para reduzir os gastos públicos em Saúde, mas a maioria dessas medidas não envolveu mudanças estruturais no sistema de Saúde“, revela o relatório sobre Espanha, que sublinha que o investimento público em Espanha já retomou o ritmo de crescimento.

Portugal segue descentralização espanhola

Um dos elogios que é feito a Espanha prende-se com o modelo descentralizado do Sistema Nacional de Saúde, com coordenação a nível nacional. O financiamento é garantido através de impostos e o funcionamento através de uma rede pública de prestadores de serviços.

Em 2002, as competências da Saúde foram desenvolvidas a nível regional, resultando em 17 ministérios regionais com jurisdição prioritária em relação à organização e atribuição de serviços no território. Por seu turno, o ministério da Saúde, Serviços Sociais e Igualdade é responsável pela definição estratégica e monitorização do desempenho do sistema de Saúde a nível nacional.

O órgão máximo de coordenação é o Conselho Interterritorial do SNS, que reúne os Ministros da Saúde nacionais e regionais. Os principais objetivos deste Conselho são: atuar como coordenador, mais do que uma agência reguladora, planear a resposta nacional aos surtos de doenças e discutir o impacto de novas leis no nível regional”, refere o relatório.

Em sentido contrário, as instituições criticam os limites ao acesso em Portugal. “Há lacunas na prestação de serviços devido aos desequilíbrios regionais, já que os hospitais localizados fora das grandes áreas metropolitanas de Lisboa, Porto e Coimbra não oferecem todas as especialidades médicas”, apontam as duas instituições.

“No entanto, os elevados níveis de investimento em infraestruturas regionais fora de Lisboa e Porto, nos últimos anos, tem procurado limitar estas disparidades geográficas”, acrescentam. O projeto de descentralização de poderes, atualmente em curso em Portugal, não exclui a Saúde e poderá levar o país a seguir o exemplo espanhol. A principal medida prende-se com a criação de um Conselho Municipal de Saúde em cada município, que irá interagir com o SNS e outros serviços. Haverá ainda outras soluções em cima da mesa, mas o estado inicial das negociações poderá levar a que Portugal continue, por mais alguns anos, atrasado em relação a Espanha.

O que eles têm e nós não?

Portugal podia ser um país mais competitivo? Podia. Como? Se imitasse os melhores. Seríamos os primeiros se tivéssemos a percentagem de utilizadores de Internet da Islândia, um serviço de saúde igual a Espanha, uma oferta de comboios idêntica à da Suíça, o sistema judicial da Finlândia ou uma tolerância ao risco das startups semelhante a Israel. E há mais, muito mais.

Para assinalar os dois anos do ECO, olhamos para Portugal no futuro. Estamos a publicar uma série de artigos, durante três semanas, em que procuramos saber o que o país pode fazer, nas mais diversas áreas, para igualar os melhores do mundo.

Segundo o World Economic Forum, Portugal está em 34.º no ranking da competitividade de 2018. Vamos “visitar” os mais competitivos do mundo, nas mais diversas áreas, e tentar perceber “O que eles têm e nós não?”. Clique aqui para ver todos os artigos da série.

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