Prova dos 9: Semana de 35 horas é “um luxo de país rico”, como diz o Fórum para a Competitividade?
Ter uma semana de 35 horas na Administração Pública é mesmo um "luxo de país rico", como diz o Fórum para a Competitividade? O ECO foi investigar.
A semana de 35 horas na Administração Pública em Portugal é uma “anormalidade”. Quem o disse foi o Fórum para a Competitividade, na sua Nota de Conjuntura, publicada na quinta-feira. A associação liderada por Pedro Ferraz da Costa defendeu mesmo que tal benefício é um “luxo de país rico” que está em “desacordo” com o fraco desenvolvimento económico lusitano.
Na nota, o Fórum para a Competitividade aproveitou também para salientar que mesmo nos países mais prósperos da Europa e do mundo as 35 horas não são regra. Será que é assim? O ECO foi investigar.
A afirmação
“A semana das 35 horas é uma raridade na UE e no mundo, sendo claramente um luxo de país rico, com atividades muito concentradas nos serviços. Como se pode ver no quadro abaixo, só países muito mais ricos do que Portugal o podem sustentar (…) Dos nove países mais desenvolvidos da OCDE, só na Noruega existe este benefício, o que indica que a prosperidade não torna as 35 horas inevitáveis”, concluiu o Fórum para a Competitividade.
Os factos
Na Nota de Conjuntura publicada na quinta-feira, o Fórum para a Competitividade começou por frisar que a semana de 35 horas é uma “raridade na União Europeia e no mundo”.
De acordo com os dados relativos a 2017 divulgados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e pelo Fundo Monetário Internacional (citados pela nota em causa), são apenas cinco os países em que o horário mais frequente fica entre as 35 e as 39 horas semanais: Noruega, Dinamarca, Bélgica, Finlândia e França. Isto a nível geral, ou seja, abarcando tanto o setor público como o privado.
O quadro do Fórum para a Competitividade não diferencia o setor público do privado. O ECO foi à procura do número de horas trabalhadas apenas no setor público e encontrou-os no Eurostat. É possível concluir que, em 2017, a semana de 35 horas na Administração Pública e na Defesa não era uma realidade em nenhum Estado-membro da União Europeia.
De acordo com o Gabinete de Estatísticas, nesse ano, foram os funcionários públicos italianos a tempo inteiro a gozar de uma carga horária semanal mais reduzida: 37,4 horas por semana.
Itália tem a menor carga horária semanal na Administração Pública na UE. Áustria a maior
O Fórum para a Competitividade salientou também que tal benefício é “claramente um luxo de país rico”, que só “países mais ricos do que Portugal podem sustentar”. Da comparação com os demais membros da OCDE e com os Estados da União Europeia, conclui-se que têm sido os países mais prósperos a adotar cargas horárias semanais mais leves, não sendo possível confirmar ou não a sustentabilidade da medida.
Segundo o Eurostat, Portugal é mesmo o país com menor PIB per capita expresso em Paridades de Poder de Compra (PPC) a aparecer entre os que praticam menores semanas de trabalho na Administração Pública, no espaço comunitário. Por ordem decrescente da carga horária semanal dos trabalhadores a tempo inteiro do setor público, Portugal ocupa a sétima posição, com 39,2 horas, tendo todos os Estados que ocupam as seis primeiras posições maiores PIB per capita em PPC do que o luso. Os dados do Eurostat, para o ano de 2017, são uma média e não consideram ainda as 35 horas em todas as categorias profissionais na Função Pública. Os enfermeiros com contrato individual de trabalho, por exemplo, só em 2018 é que passaram para as 35 horas.
De notar, que a combinação lusitana (reduzida carga horária e menor PIB per capita em PPC) não é caso único na União Europeia. Logo abaixo de Portugal, aparece a Eslováquia com uma semana de 39,3 horas e apenas 76% da média do PIB per capita em PPC da UE. Destaque também para a Croácia, que surge na décima posição com 39,4 horas semanais e 62% da média referida.
Apenas um dos mais países com maior PIB per capita em PPC tem uma semana abaixo das 38 horas semanais
Fonte: Eurostat
Por outro lado, o Fórum para a Competitividade reforça que nem todos os países que lideram em prosperidade adotaram a semana das 35 horas. “A prosperidade não torna as 35 horas inevitáveis”, salienta a nota publicada na quinta-feira.
Se se ordenar os dados relativos à semana de trabalho de acordo com o PIB per capita em PPC, confirma-se tal afirmação. Dos ocupantes do pódio do PIB per capita expresso em PPC comunitário (Luxemburgo, Irlanda, Dinamarca), apenas um aparece no top 3 dos países com menores semanas de trabalho (a tempo inteiro) na Administração Pública. O cenário é semelhante no quadro da OCDE.
Prova dos 9
Ainda que não seja o único país dito “menos próspero” a arriscar uma semana de trabalho na Função Pública mais reduzida, Portugal aparece muito próximo de países cujo PIB per capita em PPC é significativamente maior.
Portanto, o defendido pelo Fórum para a Competitividade está correto: a semana de 35 horas é mesmo uma raridade na União Europeia; e tendencialmente são os países mais prósperos a adotar cargas horárias semanais mais leves na Administração Pública, não sendo tal uma regra.
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