Muito crédito à habitação? Banca financiou a compra de pouco mais de uma em cada três casas
O número e o valor das transações de casas voltaram a disparar em 2018, mas o peso do financiamento bancário nessas operações baixou. Passou a ser de 40,87%, a primeira quebra nos últimos quatro anos.
Apesar da existência de alguns sinais de travagem, o mercado imobiliário continua ao rubro. O número e o valor das transações de casas voltaram a disparar em 2018. Mas o peso do financiamento bancário nessas operações baixou. Pouco mais do que uma em cada três casas foi comprada com recurso ao crédito, sinalizando a primeira inversão de tendência após três anos marcados por aumentos de representatividade.
Dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística mostram que no ano passado as transações de casas totalizaram cerca de 24,1 mil milhões de euros. Este montante é o mais elevado do histórico do gabinete público de estatísticas cujo início remonta ao primeiro trimestre de 2009.
Uma tendência de subida que também foi observada no que respeita ao crédito à habitação, com perto de dez mil milhões de euros concedidos (9.835 milhões de euros) com esse fim em 2018, um máximo desde 2010.
Feitas as contas, esse montante foi suficiente para cobrir apenas 40,87% das transações de imóveis realizadas no ano passado. Ou seja, pouco mais do que uma em cada três casas foi adquirida através do crédito.
Esta realidade surge num contexto marcado por críticas quanto à evolução dos números da concessão de crédito, e que demonstra que a maioria das aquisições de casas acabam por ser financiadas com fundos próprios.
O peso menor do crédito no montante das transações reflete uma alteração importante no mercado imobiliário em Portugal – a importância do investimento em imóveis, em detrimento da aquisição apenas para usufruto.
Filipe Garcia explica essa realidade com o contexto de investimento no setor imobiliário. “O peso menor do crédito no montante das transações reflete uma alteração importante no mercado imobiliário em Portugal – a importância do investimento em imóveis, em detrimento da aquisição apenas para usufruto”, explica o economista.
Mas o CEO da IMF lembra que, “ainda assim, o peso do crédito está aumentar, ainda que longe dos valores pré-crise, reflexo da maior predisposição da banca para emprestar, mesmo para situações de investimento”.
Evolução do novo crédito face ao valor das vendas
Fonte: INE e Banco de Portugal
Ainda há poucos meses, o Banco de Portugal (BdP) chamava a atenção para essa situação. Dizia que o crédito continua a ter um peso diminuto nas transações — apesar do aumento registado nos últimos anos — chamando a atenção para o aumento das compras a pronto, movimento sustentado pelo turismo e que era mais expressivo em Lisboa e no Algarve.
“O mercado da habitação está a apresentar um elevado dinamismo e isso está associado não apenas aos fatores mais tradicionais — condições de financiamento mais favoráveis ou melhoria da situação financeira global das famílias e da economia em geral –, mas também ao aumento do turismo e à procura de imóveis por parte de não residentes“, afirmava a instituição liderada por Carlos Costa, no âmbito do Boletim Económico, publicado em outubro do ano passado.
Outra realidade que o cruzamento das vendas e do crédito dados demonstra é que, em 2018, ocorreu uma diminuição do peso do financiamento bancário no montante global das vendas: a primeira quebra após três anos a conquistar espaço.
Os 40,87% de peso do financiamento no total das vendas em 2018, compara com proporções de 42,72%, em 2017, 39,1%, em 2016, e 32,17%, em 2015. Valores que se seguem ao mínimo de 24,24% registado em 2014, período ainda marcado pelo fecho da torneira do crédito.
A proporção observada em 2018, compara ainda com valores que em 2009 (o último ano em que a comparação é possível) e 2010 chegaram aos 65,7% e 64,79%, respetivamente. Ou seja, naquela altura o cenário era o oposto do atual: duas em cada três casas eram compradas com recurso ao financiamento da banca. Isto numa altura em que a nova concessão de crédito à habitação estava em máximos, e imediatamente antes do início da crise.
A diminuição do peso do crédito nas transações totais de imóveis registado em 2018, coincide ainda com os alertas sobre a evolução da concessão de crédito à habitação. Esses alertas materializaram-se mesmo num conjunto de recomendações aos bancos por parte do BdP visando colocar um travão à concessão com vista a prevenir situações de sobreendividamento das famílias. Essas medidas entraram em vigor no início de julho do ano passado. Mas será que sustentam a quebra observada no peso do crédito face ao total das vendas de imóveis?
Em termos absolutos, os montantes de crédito concedido continuam a aumentar de forma notória, mesmo no contexto das recomendações do BdP. Aliás, as recomendações do BdP, por si só, não obrigariam a uma redução do crédito concedido.
Filipe Garcia não é dessa opinião. “Essa inversão é ligeira“, começa por alertar, preferindo atribuí-la à “atração que o imobiliário vem exercendo nos últimos anos como destino de investimento“. “Ou seja, tem havido capitais, muitas vezes estrangeiros, a financiar a aquisição de imobiliário”, diz.
O economista lembra ainda que “em termos absolutos, os montantes de crédito concedido continuam a aumentar de forma notória, mesmo no contexto das recomendações do BdP”, salientando, aliás, que “as recomendações do BdP, por si só, não obrigariam a uma redução do crédito concedido“.
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