Notícias e “aparente valia” da Metalgest serviram para conceder crédito
Entre as atenuantes para conceder um financiamento à Metalgest, o banco suportou-se na "aparente valia" da empresa e em notícias sobre os "resultados aceitáveis" de Berardo na bolsa.
A Caixa Geral de Depósitos (CGD) apresentou como atenuante à concessão de crédito à Metalgest a “aparente valia” da empresa e notícias sobre os “resultados aceitáveis” de Joe Berardo na bolsa, de acordo com a deputada do Bloco de Esquerda Mariana Mortágua.
De acordo com um documento lido por Mariana Mortágua na comissão parlamentar de inquérito à gestão e recapitalização do banco, que decorre na Assembleia da República, em Lisboa, a “ligação da Metalgest ao comendador Joe Berardo que, segundo informação recolhida na comunicação social, tem obtido resultados aceitáveis nos seus investimentos bolsistas” e “a aparente valia financeira da Metalgest” serviram como atenuante do parecer condicionado emitido pela direção-geral de risco (DGR) da Caixa.
Durante a audição ao ex-secretário geral da CGD João Dias Garcia, a deputada do BE revelou que nesse parecer condicionado, sobre o crédito de 50 milhões de euros concedido à Metalgest, está escrito que a informação obtida “da sociedade Metalgest e sobre o universo Joe Berardo afigura-se escassa, na medida em que se limitou a mapas de 2005 não auditados sem qualquer nexo explicativo“.
O parecer condicionado aponta como fatores desfavoráveis à concessão de crédito o “nenhum envolvimento do comendador Joe Berardo”, a ausência de um “mecanismo que permita aferir e assegurar a mais-valia da Metalgest”, o facto de ter como “finalidade as aquisições de ações do PSI-20” e o desconhecimento, em rigor, de “quais os títulos que quer adquirir”, a existência de “um rácio de cobertura de apenas 100% [os normativos da CGD recomendavam 120%]” e, ainda, o prazo “demasiado elevado”, de “cinco anos com reembolso ‘bullet’ [pago no final do empréstimo]”.
O documento refere ainda que os custos financeiros da Metalgest, “especialmente os juros, mantiveram-se superiores aos proveitos, ganhos em participadas, pelo que os resultados líquidos do exercício apenas figuraram positivos dados os avultados resultados extraordinários”.
“Ou seja, estamos a investir dinheiro numa empresa que depende de ganhar mais dividendos do que paga de juros e que no momento já não ganhava mais em dividendos do que pagava de juros”, disse Mariana Mortágua.
Como conclusão do parecer, a direção de risco da CGD afirmou que, “nas condições propostas, não existe um conforto adequado à concessão do presente financiamento”, leu a parlamentar do BE.
No entanto, nos considerandos do mesmo parecer, a DGR da Caixa admitiu conceder o crédito, “considerando uma ótica essencialmente financeira”, mediante a apresentação “do aval do comendador Joe Berardo”, da existência “de um rácio de cobertura mínimo de 1,2 [120%, tal como recomendado pela CGD]”, da “possibilidade de penhor das ações a adquirir” e da “obtenção, prévia à contratação, de informação da Metalgest e do universo Joe Berardo”.
Por sua vez, na proposta levada a conselho de crédito da CGD, pode ler-se, de acordo com Mariana Mortágua, que o montante do crédito era o mesmo (50 milhões de euros), estavam previstas a aquisição de ações de empresas do PSI-20 não especificadas, o mesmo prazo (cinco anos), sem um penhor pessoal de Joe Berardo e sem um rácio de 120%, contrários às indicações da direção de risco.
Como atenuantes, a proposta de crédito do banco apresenta, de acordo com a deputada do BE, “a idoneidade do acionista Joe Berardo, que tem um elevado património”, e “a garantia associada ao financiamento”, ou seja, o rácio de 100%, inferior às recomendações da CGD.
Na quarta-feira, numa audição na mesma comissão, o ex-presidente do conselho fiscal da CGD Eduardo Paz Ferreira disse achar “extremamente difícil” que o banco consiga recuperar as garantias dadas pelo empresário Joe Berardo.
Paz Ferreira mencionou “não só a garantia em ações”, mas também “uma outra garantia, de uma parte da coleção de quadros”, da qual está “muito longe de acreditar que ela seja executável”.
Paralelamente, o anterior responsável da Caixa referiu que um aval pessoal dado por Joe Berardo “tem sido difícil de encontrar”, especificando que se referia ao documento “em papel”.
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