Fasquia está nos 66%. Abstenção ensombra eleições europeias
Desde as primeiras eleições europeias por sufrágio universal direto, em 79, que a abstenção tem vindo a aumentar. Este domingo haverá uma inversão de tendência? Fomos falar com quem estuda o fenómeno.
A dimensão da abstenção estará mais uma uma vez no centro das atenções na noite eleitoral deste domingo. É pouco provável que haja uma mobilização que inverta radicalmente a tendência que ensombra as eleições para o Parlamento Europeu nas últimas décadas, segundo opiniões ouvidas pelo ECO. Mas se houver uma primeira inversão em 40 anos, então será um dado histórico.
Desde as primeiras eleições europeias por sufrágio universal direto, em 1979, que a abstenção tem vindo a aumentar e que o desinteresse dos cidadãos aumenta. Naquele ano, a taxa de participação foi em média de 61,99% tendo caído sucessivamente em todas as eleições até atingir 42,61% há cinco anos.
É uma tendência geral nos diferentes países, mesmo nos dois Estados-membros onde o voto é obrigatório –Bélgica e Luxemburgo –, a participação desce ligeiramente. Portugal não é exceção. Nas primeiras eleições após a adesão, a taxa de participação dos portugueses atingiu 72,42%, mas foi caindo — exceto em 1999 — até chegar a 33,67% em 2014 (o que correspondeu a uma taxa de abstenção superior a 66%). Nesse ano, ficou abaixo da média da UE, registando a oitava maior taxa de abstenção. Ainda assim muito à frente dos países cujos eleitores menos participaram: Eslováquia (13,05%) e República Checa (18,2%).
Esta tendência nas europeias está em linha com o descida geral da participação eleitoral na maior parte dos países do G20, segundo uma nota do Serviço de Estudos do Parlamento Europeu. No entanto, as taxas de participação nas eleições nacionais são superiores, entre outras razões, porque os cidadãos decidem quem vai governar.
Mas não deixa de ser um dado curioso que o alheamento e desinteresse dos europeus aumente ao mesmo tempo que o Parlamento Europeu tem visto os seus poderes reforçados com as sucessivas alterações aos Tratados e ser hoje legislador numa série de áreas que afetam diretamente a vida dos cidadãos.
O facto de as eleições este ano se realizarem num contexto em que a UE está sob pressão — com o processo do Brexit — e enfrenta movimentos que pretendem acabar com o atual projeto europeu não deverá ser suficiente para suscitar uma maior mobilização dos cidadãos, segundo os especialistas ouvidos pelo ECO. Isto apesar de alguns políticos e líderes europeus tentarem transformar o ato eleitoral numa espécie de plebiscito à UE.
Spitzenkandidaten vai ajudar a mobilizar o eleitorado?
Éric Maurice, da Fundação Robert Schuman, diz que uma dos principais questões destas eleições consiste em saber se é possível estancar a abstenção e se o processo de Spitzenkandidaten mobilizou o eleitorado. Através deste processo os partidos políticos europeus apresentam os seus candidatos principais à presidência da Comissão Europeia, permitindo aos cidadãos ter uma palavra nesta escolha.
No entanto, Maurice admite existir um “forte desinteresse” pelas eleições para o Parlamento Europeu apesar do interesse dos cidadãos pelas questões europeias e pela UE. E diz que a abstenção funciona também como “voto de protesto” nestas ocasiões.
Face ao atual contexto na UE e aos populismos crescentes, haverá desta vez maior participação do eleitorado? “Não creio”, afirma Pascal Delwit, professor no Centro de Estudos de Vida Política da Universidade Livre de Bruxelas. “Não acredito que a lógica de mobilização de progressistas contra populistas seja uma ideia com eco no eleitorado”. Especialista em processos eleitorais na UE, Delwit considera que as eleições para o Parlamento Europeu são em geral “mal entendidas e mal apreendidas” pelo eleitorado e, por vezes, até pelos próprios protagonistas políticos, pelo que estas europeias voltam a enfrentar o desafio da abstenção.
No mesmo sentido, Éric Maurice considera que muitas vezes são os partidos e os responsáveis políticos nos Estados-membros que contribuem para a abstenção ao apresentarem os candidatos às europeias já muito em cima das eleições ou em função de critérios nacionais. Maurice diz que em muitos países é difícil ter uma relação de proximidade com os eleitos pelo que há um défice de visibilidade dos deputados.
O investigador na Fundação Schuman sublinha também que há confusão na forma como os políticos nacionais apresentam os temas europeus, misturados com política interna, o que não favorece uma leitura política clara do que está em causa. E reconhece que se a taxa de abstenção for muito elevada este domingo, isso será um fracasso para todos os agentes políticos na UE e nos Estados-membros.
“É muito pouco provável que os níveis de abstenção sejam muito diferentes dos que tivemos em outras eleições”, diz por seu turno o sociólogo Pedro Magalhães, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa – ressalvando que os valores oficiais em Portugal podem sobrestimar a abstenção real.
Pedro Magalhães afirma que há “um grande alheamento e desinteresse” em relação às eleições europeias e dá como exemplo a recente sondagem do ISCTE/ICS para o Expresso/SIC, segundo a qual 69% dos portugueses não são capazes de indicar o nome de um eurodeputado português.
Instado a comentar as razões mais específicas que podem explicar as elevadas taxas de abstenção nas europeias em Portugal, aponta dois fatores. Em geral, a abstenção está associada aos níveis de instrução e o baixo nível de instrução adulta em Portugal pode levar a um menor envolvimento cívico e baixa participação nas eleições. Por outro lado, a sindicalização e o associativismo também podem potenciar a mobilização eleitoral. Mas Portugal tem baixas taxas de sindicalização quando comparado com outros países europeus.
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