Via aberta para uma nova comissão de inquérito a Tancos
A generalidade dos partidos garante não se opor a uma nova comissão de inquérito ao caso de Tancos. Mas esquerda e direita não concordam na distinção entre o que é da política e o que é da justiça.
O caminho está aberto para a abertura de uma segunda comissão parlamentar de inquérito (CPI) ao “Caso Tancos”. A hipótese já tinha sido admitida durante a campanha eleitoral, mas ganhou um apoio mais alargado na reunião plenária da Comissão Permanente da Assembleia da República (AR), realizada esta quarta-feira.
O plenário tornou evidente que o PSD é favorável à abertura de uma nova CPI, em conjunto com o CDS, BE e PS, enquanto o PCP prefere esperar pelo fim do processo criminal. O principal desacordo, porém, assentou na distinção entre o que deve ser matéria política e o que é do domínio judicial.
No debate da Comissão Permanente, os sociais-democratas não pouparam nas críticas ao Governo e aos partidos da esquerda — sobretudo o PS –, por não terem permitido a realização da sessão antes das eleições, alegando a judicialização da política.
“É da política querer saber se um primeiro-ministro que quer voltar a ser primeiro-ministro merece a confiança dos portugueses, sobretudo quando há dúvidas e suspeitas que nunca foram cabalmente esclarecidas”, disse Fernando Negrão, referindo-se à incerteza sobre se António Costa foi informado da encenação montada pela Polícia Judiciária Militar (PJM) em torno da recuperação das armas roubadas às Forças Armadas.
Após a intervenção inicial, os partidos foram abordando as suas posições. O deputado Telmo Correia disse que, “se for necessário”, o CDS apoiará uma nova CPI. Já Pedro Filipe Alves, do BE, disse mesmo que o partido está aberto a mudar “a conclusão” da comissão de inquérito anterior: “Se novos factos forem levantados, e a acusação do Ministério Público [MP] assim o parece indicar, essa conclusão da CPI deve ser alterada. Da nossa parte, há toda a abertura para isso. Sempre com factos e não com suposições”, disse.
Do lado do PS, o deputado Filipe Neto Brandão apontou baterias aos partidos da direita, criticando o PSD por ter querido abordar no Parlamento “uma matéria confiada ao poder judicial”. “Só a antevisão de um resultado eleitoral desastroso — que se viria a confirmar — pode justificar converter um processo criminal em arma de arremesso político”, rematou. Ainda assim, num discurso em que apelou várias vezes à presunção da inocência do ex-ministro Azeredo Lopes, o socialista garantiu que o partido “quer que todos os factos relativos a Tancos possam ser apurados”: “Se uma nova CPI vier a ser requerida, viabilizá-la-emos”, confirmou.
Críticas à direita com as quais o PCP alinhou. António Filipe disse que “o PSD quis tornar o Caso Tancos no tema central da campanha eleitoral”, lembrando que o tema já foi “amplamente discutido” na AR. Ainda assim, indicou que esta é uma questão que vai ter ser “acompanhada na próxima legislatura”, nomeadamente do ponto de vista da prevenção, com reforço das medidas de segurança em torno do armamento à guarda do Exército, preferindo uma nova CPI apenas depois do desfecho do processo-crime.
“[No passado] considerámos que, estando a decorrer um processo-crime, era prematura uma CPI. Teria limitações por causa do segredo de justiça”, disse António Filipe. No entanto, o partido admite que vai estar a “acompanhar” este tema durante a próxima legislatura.
José Luís Ferreira, d’Os Verdes, disse igualmente que é preciso “apurar” se o ex-ministro da Defesa “prestou ou não falsas declarações” na anterior CPI. Mas também lembrou que Azeredo Lopes “continua a gozar da presunção de inocência”.
É da política querer saber se um primeiro-ministro que quer voltar a ser primeiro-ministro merece a confiança dos portugueses, sobretudo quando há dúvidas e suspeitas que nunca foram cabalmente esclarecidas.
Este ponto da reunião da Comissão Permanente foi encerrado com um discurso de Duarte Marques, do PSD. Apontando o dedo ao PS, o deputado considerou que “a justiça não pode ser um biombo para esconder a responsabilidade política de um Governo em funções“, garantindo que o encobrimento da recuperação das armas “contou com a preciosa colaboração do PCP e BE”.
“O então ministro da Defesa mentiu no Parlamento. Apesar de adiado para hoje [quarta-feira] um debate que deveria ter ocorrido antes das eleições, não restam dúvidas de que o Governo sabia de tudo desde a primeira hora. Alguém acredita que um assunto tão importante não tenha sido do conhecimento do primeiro-ministro?”, interrogou Duarte Marques, pondo fim ao principal assunto que motivou o plenário.
A 26 de setembro, o ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes foi acusado pelo MP de abuso de poder, denegação de justiça e prevaricação no Caso Tancos e proibido do exercício de funções. O MP acusou 23 arguidos no total.
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